terça-feira, 4 de agosto de 2020

Espanha | Juan Carlos, o monarca da triste figura

Por seus serviços como jovem rei, Juan Carlos teria direito a um lugar de honra na história. Mas, depois de uma série de escândalos, sua ida ao exílio deve ser vista como uma fuga da Justiça, opina Gabriel González.

Eu admito: Juan Carlos era meu herói. Mas isso foi há muito tempo. Eu tinha 17 anos na época, morava na Alemanha e começava a me interessar por política quando o então jovem rei apareceu nas telas de televisão. Foi em 23 de fevereiro de 1981, quando parte das Forças Armadas espanholas e da polícia tentaram um golpe contra a ainda jovem democracia. Tanques percorriam as ruas, o Parlamento foi ocupado por golpistas, o governo não conseguiu reagir.

Então, aquele jovem rei, que até então todos haviam subestimado, entrava na frente de uma câmera dentro do uniforme de comandante em chefe das Forças Armadas espanholas e ordenava que os soldados retornassem imediatamente a seus quartéis. A tentativa de golpe entrava em colapso já durante a madrugada. Naquela época, ele salvara a democracia espanhola.

Com o fim da Guerra Fria e a queda da Cortina de Ferro, a questão de como mudar pacificamente e ordenadamente de um sistema autoritário para uma democracia também se colocou em muitos países do leste e do sudeste da Europa. Naquela época, muitos olhos estavam voltados para Madri: a Espanha era vista como um modelo de mudança bem-sucedida, e Juan Carlos era a figura central dessa mudança.

Por que estou listando todos os antigos atos heróicos de Juan Carlos? Porque eles tendem a desaparecer em segundo plano, tendo em vista os eventos atuais e as más condutas reais. E porque é precisamente a partir da discrepância entre o passado glorioso e a queda por culpa própria que se torna reconhecível a extensão do lado trágico dessa ida ao exílio. 

Como alguém que começou sua carreira de monarca de maneira tão brilhante, como jovem e corajoso chefe de Estado, formador e defensor da democracia espanhola, pôde sofrer uma queda tão profunda ao longo dos anos? "Humano, demasiado humano", talvez dissesse Nietzsche. "Bom material para a minha próxima tragédia real", Shakespeare provavelmente teria murmurado.

Com a partida inglória de Juan Carlos, que pode e deve ser vista como uma fuga da Justiça espanhola, os críticos da monarquia naturalmente ganham novo impulso. Isso é normal e é até bom que assim seja: nenhum rei pode estar acima da lei! Aliás, os presidentes dos EUA também não – mas isso é outra história. Juan Carlos deveria, portanto, responder e se explicar diante de um tribunal na Espanha. Isso deveria ser tido como óbvio em uma monarquia constitucional moderna.

Em algum momento, Juan Carlos começou a agir como se ninguém pudesse atingi-lo e tudo lhe fosse permitido: dar bronca em presidentes da América Latina (Hugo Chávez, 2007), fazer safáris na África, incluindo fotos ao lado de elefantes abatidos por sua majestade (2012), uma série de escapadas sexuais, que sua mulher, rainha Sofia, suportou estoicamente. E agora o atual caso de corrupção em que ele supostamente está envolvido.

Juan Carlos foi se tornando uma figura cada vez mais triste. Exatamente como o personagem principal da obra de Miguel Cervantes, alguém cuja melhor época ficou no passado distante e que só chama a atenção por vexames. Já ultrapassado por um mundo que ele não entendia mais e cujas demandas em transformação numa monarquia (caso alguém ainda queira alguma) ele não conseguia ou queria cumprir.

Em uma de suas últimas fotos tiradas na Espanha, Juan Carlos está triste e abandonado no banco do carona de seu carro. Seus olhos fixos no vazio. Será que ele reconhece que perdeu seu lugar de honra nos livros de história? E que ele mesmo é o culpado? Sim, admito que sinto pena dele de alguma forma. Mas sua queda foi devida a seus próprios erros. Para mim, pessoalmente, permanece a impressão triste: heróis idosos quase nunca fazem uma boa figura.

Gabriel González | Deutsche Welle | opinião

O cerne da questão no Mar do Sul da China

Pepe Escobar [*]

Quando os grupos de ataque dos porta-aviões Ronald Reagan e Nimitz se envolveram recentemente em "operações" no Mar do Sul da China, não escapou a muitos cínicos que a Frota do Pacífico dos EUA estava a fazer todo o possível para transformar a teoria infantil da Armadilha de Tucídides numa profecia auto-cumprida.

A versão pro forma oficial, vinda do contra-almirante Jim Kirk, comandante do Nimitz, é que as operações eram conduzidas para "reforçar o nosso compromisso com uma ordem internacional livre e aberta no Índico-Pacífico, baseada em regras, para os nossos aliados e parceiros".

Ninguém presta atenção a estes clichês, porque a mensagem real foi apresentada por um operacional da CIA que posa como diplomata, o secretário de Estado Mike "Nós Mentimos, Nós Trapaceamos, Nós Roubamos" Pompeo. "A República Popular da China não tem bases legais para impor unilateralmente a sua vontade sobre a região", numa referência à Linha dos nove traços ( Nine-Dash Line ). Para o Departamento de Estado, Pequim utiliza nada menos que "tácticas de gangster" no Mar do Sul da China.

Mais uma vez, ninguém prestou atenção, porque os factos reais sobre o mar são muito claros. Qualquer coisa que se mova no Mar do Sul da China – a crucial artéria do comércio marítimo da China – está à mercê da Exército Popular de Libertação, o qual decide se e quando lançar os seus mortíferos mísseis "matadores de porta-aviões" DF-21D e DF-26. É absolutamente impossível que a frota do Pacífico dos EUA possa vencer uma guerra de tiros no Mar do Sul da China.

Portugal | No país sem racismo

No país onde racismo não existe profanam-se estátuas? 

Rui Rio arrumou definitivamente o assunto afirmando que não existe racismo em Portugal. Aliás, nem se percebe a razão que terá levado tanta gente, apesar da pandemia, a ousar sair para a rua. Se não há racismo, como o líder do maior partido da oposição afirma, o que estava toda aquela gente a fazer nas ruas?

A estátua do Padre Vieira foi profanada. A tal, erigida em 2017, e que mostra o Padre Vieira, enorme, com pequenos índios a seus pés. Caiu o Carmo e a Trindade precisamente no país onde não há racismo.

Não creio que a profanação de estátuas seja o caminho para o que quer que seja. Defendo que em democracia o diálogo é tudo. Prefiro a troca de ideias a estátuas profanadas. E ainda assim compreendo o que está subjacente a algumas atitudes rapidamente apelidadas de "vandalismo". 

O que sei é precisamente aquilo que Rui Rio não sabe, ou não quer saber: existe racismo em Portugal; não discutimos de forma aberta o nosso passado e quando o fazemos preferimos as cores mais bonitas para o ilustrar, deixando de lado temas que objectivamente poucos querem discutir; nada se fará de construtivo enquanto se negar esse passado e um presente onde o racismo indiscutivelmente deixa as suas indeléveis marcas.

Triunfo da Razão

Obsessão patológica

Mariana Mortágua | Jornal de Notícias | opinião

Nos últimos 21 anos, o Bloco de Esquerda desenvolveu aquilo a que Ricardo Salgado chamou uma "obsessão patológica" pelos negócios dos "donos de Portugal". Nestes anos, questionámos o poder de banqueiros, denunciámos o rentismo nas empresas privatizadas e fizemos as contas à porta giratória que unia (e une) PS e PSD aos interesses económicos. É essa intransigência na defesa do que é público que hoje dirigimos ao Novo Banco.

Todas as semanas, o tema regressa pelas piores razões. E, sim, "nós avisámos" sobre um desastre que só não anteviu quem não quis, e apresentámos proposta: nacionalizar o banco teria custos, mas garantia o controlo público ao serviço da economia.

No dia 27 de janeiro de 2017, propusemos a "manutenção da propriedade do Novo Banco na esfera pública", que foi rejeitada por PS/PSD/CDS. No dia 13 de abril, propusemos a condenação do Governo pela decisão de venda sem consulta ao Parlamento, rejeitada por PS/PSD. Nesse dia, deu entrada um projeto para a "Nacionalização do capital social do Novo Banco, SA", também rejeitada por PS/PSD/CDS. No dia 5 de maio, marcámos um debate para denunciar as condições de venda, a que se seguiram dezenas de artigos, propostas de orçamento, audições ao Banco de Portugal, ao Fundo de Resolução e à Administração do Novo Banco, pedidos de documentação e outros tantos debates e requerimentos.

A cada novo pedido de injeção de capital, o Novo Banco deu-nos razão. Com a determinação de uma auditoria à gestão privada do Novo Banco, o Governo (empurrado pelo Parlamento) escolheu o caminho mais longo. Mas foi um passo importante para dotar o Estado dos instrumentos que lhe permitam fazer frente ao fundo Lone Star. É por isso que defendemos que fosse impedida uma nova injeção sem conhecer os resultados dessa auditoria. Ao fazer a transferência de 850 milhões contra a palavra do primeiro-ministro, o Governo foi fraco perante os interesses do fundo financeiro internacional. E voltou a sê-lo ao aceitar o atraso da Deloitte, contratada por três milhões de euros para auditar o Novo Banco. O mesmo Governo que não quis esperar para pagar ao Lone Star aceitou o atraso imposto pela consultora financeira.

Seja o que for que a auditoria da Deloitte esconde, o país não tem que aceitar a espera. A consultora e o Governo devem informar o Parlamento de todas as conclusões preliminares, e o Governo, para dar-se ao respeito, deve cancelar o contrato. Depois, o Estado tem uma de duas opções para terminar uma auditoria que defenda o interesse público: ou a IGF ou Mário Centeno mostra o que vale no Banco de Portugal.

PS. Solidarizo-me com os milhares de pessoas que se juntaram para pedir justiça por Bruno Candé. O seu homicídio não será menorizado pelas distrações criadas por André Ventura para disfarçar as suas ligações às offshores e aos vistos gold da corrupção e o financiamento obscuro do seu partido. No Bloco, levamos o combate à corrupção tão a sério como o combate ao racismo.

*Deputada do BE

Espanha e Portugal estão habituados aos grandes tubarões. E no Algarve?

Juan, o rei corrupto, afinal agora já ex-rei, tem sido uma nódoa aviltante e soberbamente sabuja que sempre tingiu de vergonha a monarquia espanhola. De escândalo em escândalo lá chegou ao momento de entregar a coroa ao filho. Era e foi o melhor que fez, conspurcado que estava e continua a estar. Afinal,  o ex-rei continua a chafurdar na fossa que ele próprio criou e tem vindo a manter. 

Imprensa espanhola avança que Juan Carlos se exilou na República Dominicana, via Porto. Pode ler no Expresso. Passou pelo Porto mas que rondou arredores de Lisboa? Dizem. Não sabemos se pelo norte de Portugal alguém deu pelo pivete largado pelo ex-rei corrupto. Em Lisboa já nem existem queixosos. O ar está empestado de corruptos e corruptores. Se aconteceu detetarem tais maus odores foram por certo cheiros de pouca dura. Felizmente. Até porque em Portugal estamos bem habituados a tais pivetes. Corruptos e corruptores é o que neste país luso não falta. E aí andam eles impunes apesar das corrupções descaradas e/ou submarinas. É um fartote. O rei da Figueira e dos Algarves que o diga.

Ricardo Marques abre o Curto de hoje dedicando poucas palavras acerca dos tubarões que rondam praias de Portugal. Refere que no Algarve, Tavira, deu o alarme no passado domingo… Mas que não, não era tubarão desse de boca grande. Nem era tubarão. Ou era? Claro que tudo está a mudar e os tubarões também estão cada vez mais nessa fase. Virá o tempo em que eles irão mesmo incomodar e dar umas trincas nos banhistas… e depois, perante o facto, dirão que afinal não é falso alarme. Pronto, acabam as dúvidas de que eles, os tubarões marinhos, andam por aí.

Depois não digam que não avisámos.

Quanto aos “tubarões” da corrupção, estilo Carlos de Borbón y Borbón, assim como os dos submarinos e ‘tutti gli altri’, esses já deram à costa há milénios e mordem, decepam corpos e arrasam as vidas dos povos perante tantas vezes a complacência dos tribunais, dos senhores dos ministérios públicos, dos senhores advogados. Dos povos que borregam e já nem balem perante os roubos e a constante exploração que lhes enruga a pele, lhes tolhe o estômago e lhes encurta a vida.

Fiquem bem, se conseguirem lidar prazenteiros por entre toda a trampa que sobra para chafurdar e nos é proporcionada pelos ladrões e corruptos de todo o mundo e também deste país à beira mar da corrupção plantado. Cuidado: mergulhem se tiver de ser… mas não engulam “pirolitos”.

Bom dia e um maço de notas (limpas). O Curto assoma-se. Vá ler.

MM | PG

A CIA explora ilegalmente petróleo no nordeste da Síria

#Escrito e publcado em português do Brasil

O senador Lindsay Graham interrogou o Secretário de Estado, Mike Pompeo, em uma audiência da Comissão Senatorial de Relações Exteriores, em 30 de Julho de 2020, a propósito de uma empresa dos EUA que acaba de assinar um contrato com a «Administração Autônoma» do Nordeste sírio (YPG - curdos) para a exploração de campos de petróleo e o fornecimento de refinarias.

O Secretário de Estado confirmou que a negociação deste acordo havia tomado mais tempo que o previsto e que ele o apoiava. Deveria começar com 60.000 barris/dia e poderá se elevar rapidamente a 380.000 barris/dia.

A «Administração Autônoma» é uma ficção posta em prática pelo Pentágono no Nordeste sírio, da qual ele entregou a gerência a uma facção Curda. Nem Damasco, nem Ancara, fizeram comentários.

A Crescent Energy Services, que assinou o contrato, é uma empresa de fachada da CIA. Ela está registrada (registada-pt) no paraíso fiscal do Delaware, mas sediada na Luisiana.

Segundo nossas informações, os lucros da Administração autônoma (autónoma-pt) serão divididos em dois: uma metade para ela, e a outra metade para a CIA, que os utilizará para financiar operações secretas em todo o mundo, sem ter que solicitar um orçamento ao Congresso.

Voltairenet.org | Tradução Alva

Reino Unido recusa-se a divulgar informação básica acerca da juíza de Assange

– A juíza Baraitser tem uma taxa de aprovação de 96% dos casos de extradição

– O braço longo do Deep State

Mark Curtis e Matt Kennard [*]

Declassified UK descobriu que a juíza de Julian Assange, Vanessa Baraitser, ordenou a extradição em 96 por cento dos casos por ela presididos sobre os quais há informação publicamente disponível.

Baraitser foi nomeada como juíza distrital em Outubro de 2011 com base no Chief Magistrate's Office em Londres, depois de ser admitida como candidata (solicitor) em 1994. Nenhuma outra informação no domínio público está disponível acerca dela depois disso.

Baraitser tem sido criticada por um certo número das suas audiências de julgamento referentes até então a Assange, o qual foi encarcerado numa prisão de máxima segurança, HMP Belmarsh, em Londres, desde Abril de 2019. Estas decisões incluem recusa ao pedido de Assange de fiança (bail) de emergência durante a pandemia Covid-19 e fazê-lo sentar-se por trás de uma cortina de vidro durante a audiência, ao invés de sentar-se com os seus advogados.

Declassified revelou recentemente que Assange é um dos dois dos 797 presos em Belmarsh que está a ser retido por violar condições de fiança. Mais de 20 por cento dos presos estão retidos por assassínio.

Declassified também tem evidência de que o UK Home Office está a bloquear a divulgação de informação acerca do papel do secretário do Interior Priti Patel no caso da extradição de Assange.

Requerimento recusado

Um requerimento nos termos do Freedom of Information Act (FOIA) foi apresentado por Declassified ao Ministério da Justiça (MOJ) em 28/Fevereiro/2020 solicitando uma lista de todos os processos presididos por Baraitser desde que ela foi nomeada em 2011. Na resposta o MOJ observou que era obrigado a responder dentro de 20 dias úteis.

Dois meses depois, em 29/Abril/2020, um responsável de informação nos HM Courts and Tribunals Service respondeu que podia "confirmar" que possuía "alguma da informação requerida por si".

Mas o requerimento foi rejeitado pois o responsável afirmou que ele não estava em consonância com o Constitucional Reform Act. "O judiciário não é um organismo público para as finalidades do FOIA... e requerimentos a pedir para revelar todos os casos presididos por um determinado juiz estão portanto fora do âmbito do FOIA", declarou o responsável.

O responsável acrescentou que a "informação requerida seriam de qualquer forma isentas de divulgação... porque contêm dados pessoais sobre os casos decididos por um juiz individual" e que "dados pessoais só podem ser divulgados se isso não violar nenhum dos princípios de protecção de dados" da Lei de Protecção de Dados.

Um advogado britânico, que quis permanecer anónimo, mas que não está envolvido com o processo de Assange, disse a Declassified: "Neste caso a resistência à divulgação é curiosa. Um tribunal é uma autoridade pública para as finalidades da Lei de Direitos Humanos e um juiz é um funcionário do tribunal. Portanto é mais do que surpreendente que a primeira recusa argumentasse que, para as finalidades do FOIA, não há aqui qualquer organismo público sujeito à divulgação".

O advogado acrescentou: "O argumento alternativo sobre os dados não procede. Um tribunal actua em público. Não há anonimato por defeito dos nomes dos processos, a menos que estejam envolvidas crianças ou outras circunstâncias limitadas, nem os juízes que decidam sobre eles. A justiça tem de ser vista a ser feita".

Apesar de o HM Courts and Tribunals Service invocar uma cláusula de protecção de dados, Declassified conseguiu ver uma série de casos com nomes completos e detalhes no Westlaw, uma base de dados jurídica paga. A imprensa também relatou vários casos de extradição envolvendo o Baraitser.

Uma análise interna da rejeição do requerimento de Declassified nos termos da Lei de liberdade de informação confirmou a rejeição.

Pandemia: a estratégia da ultradireita é esconder

*Escrito e publicado em português do Brasil

Além da negligência, ocultamento No Brasil, EUA e Reino Unido, multiplicam-se sinais de que os governos omitem dados sobre mortes, falta de medicamentos e até vacinas. E mais: acirra-se a disputa pelas vacinas contra a covid-19

Maíra Mathias | Outras Palavras

CAIXA-PRETA

Há 15 dias a sociedade não tem informações sobre como andam os estoques de medicamentos necessários ao tratamento de pacientes internados em UTIs. Os últimos dados foram divulgados no dia 20 de julho pelo Conass, o conselho que reúne os secretários estaduais de saúde, e fazem referência ao período entre os dias 12 e 18 daquele mês. 

Olhando para cerca de 1,5 mil estabelecimentos de saúde, o Conass diagnosticou que havia desabastecimento generalizado de certos medicamentos, como o relaxante muscular rocurónio, em falta em 96% das unidades. E apontou os estados em pior situação, caso de Acre, Amapá e Roraima – onde estoques de vários medicamentos estavam a poucos dias de acabar. Foi graças à divulgação do levantamento que o Ministério da Saúde admitiu publicamente o problema, que já vinha sendo apontado por gestores estaduais desde maio. 

Uma reportagem do El País Brasil alerta que o levantamento tinha previsão de ser atualizado na última segunda-feira.  Mas isso não aconteceu – e, agora, o Conass  afirma que a divulgação dos números cabe ao Ministério. “A pasta, por sua vez, responde com silêncio”, relata o repórter Felipe Betim. 

Mas, ao que parece, o problema está longe de uma solução. Na quinta-feira (30), o presidente do Conass sugeriu ao general Eduardo Pazuello que o Ministério acelerasse o processo de compras por meio da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). Segundo Carlos Lula, que é secretário estadual de saúde do Maranhão, o pregão voltado para o mercado nacional – anunciado em junho – não só não aconteceu, como pode atrasar. Em resposta, o ministro interino da Saúde se limitou a dizer que há “alternativas” em discussão.

A falta de transparência do Ministério da Saúde não é exceção à regra do governo federal, que ficou em penúltimo lugar no ranking que avalia a divulgação dos contratos emergenciais feitos durante a pandemia. Em comparação com as 27 unidades da federação e com todas as capitais, coube ao Executivo federal o penúltimo lugar no levantamento feito pela Transparência Internacional. Em uma escala de cem pontos, o governo cravou 49,3.

E quando o assunto é negar de forma genérica os pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação, o governo de Jair Bolsonaro é simplesmente o pior. Também de acordo com a Transparência Brasil – mas em levantamento feito para a coluna Painel, da Folha –, o governo tem recusado sem explicações concretas cerca de 20% dos pedidos

Em paralelo, tem crescido as denúncias de assédio moral no governo. E o Ministério da Saúde ocupa o terceiro lugar na lista dessas reclamações, atrás de pastas comandadas há muito tempo por ministros da ala extremista, como os ministérios da Mulher, Família e Direitos Humanos e da Educação. Em 2020, já são 680 denúncias – número bem maior do que o registrado em 2019 (426). Para efeito de comparação, no último ano do governo Michel Temer, houve 356 denúncias – ou 20% a menos do que no primeiro ano de Bolsonaro no poder.

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