terça-feira, 16 de novembro de 2021

A EUROPA POR UM FIO…

# Publicado em português do Brasil

Os líderes europeus têm os olhos bem abertos mas são demasiado covardes para ver e actuar

Strategic Culture Foundation | editorial

A condescendência da Europa sobre uma questão vital para a sua própria segurança é deplorável. A situação da Ucrânia está a tornar-se cada vez mais incandescente. No entanto a União Europeia não está a fazer nada para prevenir o perigo. De facto, pode dizer-se que o bloco está a agravar o perigo da confrontação e da guerra.

As tensões geopolíticas no continente estão a ser agravadas por uma crise fronteiriça com a Bielorrússia e a Polónia, que a União Europeia tem exacerbado por cínicas razões políticas. Estas tensões estão a somar-se à instabilidade na Ucrânia e na região do Mar Negro.

Os ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa da Rússia reuniram-se com os seus homólogos franceses em Paris na sexta-feira 12 para conversações "2 mais 2" sob os auspícios do Conselho de Cooperação Russo-Francês. No topo da agenda estavam os desafios à segurança regional decorrentes do conflito na Ucrânia.

Antes da reunião, o ministro dos Negócios Estrangeiros Sergei Lavrov reprovou tanto a França como a Alemanha por "minarem" as perspectivas de paz na Ucrânia.

A Rússia, França e Alemanha são garantes dos Acordos de Minsk de 2015, os quais estabelecem um roteiro para uma resolução pacífica da guerra civil na Ucrânia. Essa guerra irrompeu em 2014 quando os Estados Unidos e a UE apoiaram um golpe de Estado em Kiev no mesmo ano. O então recém-instalado regime de Kiev lançou uma guerra contra a região de Donbas no sudeste da Ucrânia porque a população de etnia russa dali não reconheceu o novo governo.

Sob os acordos de Minsk, o regime de Kiev está mandatado para observar um cessar-fogo e aceder à autonomia política para as províncias do Donbas de Donetsk e Lugansk. Isto não foi implementado apesar da eleição de Vladimir Zelensky como presidente ucraniano em 2019 e da sua promessa de dar prioridade à busca de um acordo pacífico e político. As promessas eleitorais do antigo comediante de TV revelaram-se uma piada cruel.

Não só o mandato de Minsk foi ignorado, como também o regime de Zelensky fez tudo para menosprezar o acordo. As Forças Armadas Ucranianas sob o seu comando têm violado continuamente supostos compromissos de cessar-fogo na linha de contacto com a região de Donbas. Segundo os monitores da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), os militares do regime de Kiev violaram diariamente o suposto cessar-fogo com milhares de incidentes nas últimas semanas. Além disso, as forças de Kiev reintroduziram alegadamente armas de calibre pesado perto da linha de contacto, em violação flagrante dos termos do cessar-fogo.

A verdade flagrante é que a França e a Alemanha fecharam os olhos a estas múltiplas e sistemáticas violações dos acordos de Minsk por parte do regime de Kiev. Além disso, esta complacência e abdicação de compromissos como garantes do acordo de paz serviram para incentivar o regime de Kiev a arvorar ambições de buscar uma solução militar para a guerra civil de oito anos. Em suma, as potências europeias estão a alimentar mais conflitos no seu próprio continente.

Sejamos claros, a perspectiva de uma guerra mais vasta é amedrontadora. O regime de Kiev está a ser pesadamente armado com armamento letal pelos Estados Unidos. Os EUA e os seus aliados da NATO estão também a acumular forças militares no Mar Negro com navios de guerra, caças de combate e aviões de reconhecimento. Esta semana, aviões de reconhecimento americanos e britânicos do tipo utilizado na coordenação de operações ofensivas estavam a zumbir nas fronteiras russas a um nível sem precedentes. Moscovo adverte que a sua segurança nacional está a ser cada vez mais ameaçada e que para qualquer erro de cálculo basta um deslize.

O absurdo do governo americano também faz parte da ofensiva. Esta semana, o secretário de Estado norte-americano Antony Blinken emitiu uma advertência na qual afirmava que as forças militares russas estavam a concentrar-se (no seu próprio território, note-se!) e que planeavam "invadir a Ucrânia". Blinken disse: "Não temos clareza sobre as intenções de Moscovo, mas conhecemos o seu livro de jogo". A contradição confusa é risível, se não mesmo uma provocação imprudente.

O presidente Vladimir Putin disse à chanceler alemã Angela Merkel, num telefonema esta semana, que os Estados Unidos e a NATO estão a alimentar a instabilidade e tensões perigosas sobre a Ucrânia e o Mar Negro adjacente. É gritantemente óbvio quem está a escalar o risco de guerra. Mas onde estão as vozes europeias a apelar à sanidade e a uma urgente desescalada?

A dinâmica incendiária prevalecente da acumulação desordenada de forças dos EUA e da NATO às portas da Rússia está apenas a incentivar o regime de Kiev a continuar a ignorar o caminho para a paz na Ucrânia. Existe um perigo muito real de que o conflito no país explodirá numa guerra total. Nesse caso, os Estados Unidos e a Rússia serão arrastados para o pântano. E, mais uma vez, a Europa será um campo de batalha com consequências desastrosas.

No século passado duas guerras mundiais irromperam na Europa. Um factor importante naquelas conflagrações foi a condescendência criminosa entre os líderes europeus para impedir a catástrofe.

Hoje, há um reflexo perturbador de condescendência semelhante entre as autoridades alemãs e francesas no que diz respeito às suas obrigações de manutenção da paz na Ucrânia. Ao invés disso, elas estão a ceder a um regime reaccionário em Kiev e a provocações absurdas por parte dos Estados Unidos.

Os líderes europeus não são meramente sonâmbulos a caminharem em direcção ao abismo. Eles têm os olhos bem abertos mas simplesmente são demasiado covardes para ver e actuar. Deviam ter vergonha!

12/Novembro/2021

Ver também:

  Por que considero uma guerra no Donbass como (quase) inevitável, 2/Nov

  Atividade militar dos EUA e da OTAN no mar Negro ameaça segurança regional, afirma Defesa russa, 13/Nov

O original encontra-se em https://www.strategic-culture.org/news/2021/11/12/europe-on-brink-germany-france-must-uphold-peace-in-ukraine/

Este editorial encontra-se em resistir.info

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