Vítor Matos, jornalista | Expresso (curto)
Bom dia!
Começo por lhe fazer um convite: hoje às 14h00 "Junte-se à Conversa"
com João Silvestre, Isabel Vicente e David Dinis sobre se "O BCE foi longe
demais? E o Governo faz a menos?". Inscreva-se aqui.
Cavaco Silva, que nem teve tempo de fazer oposição porque implodiu o Bloco
Central quando chegou à liderança do PSD, nunca esteve nessa terrível posição
política, mas aconselhou Luís Montenegro, num discurso em maio, sobre a arte de bem se opor: “As
moções de censura servem os interesses do PS, servem os erros da sua
governação”, disse o ex-Presidente num discurso em que sugeriu a António Costa
para se demitir.
O líder do PSD, bom aluno do professor, assimilou a lição e absteve-se na moção
que o Chega apresentou ontem contra o Governo. É verdade, Cavaco tinha
razão. Se a moção de André Ventura serviu a alguém foi ao primeiro-ministro,
que assistiu de bancada à competição da direita sobre quem bate mais depressa
na parede. O exercício parlamentar serviu para Ventura ter tempo de antena
e ganhar ainda mais lastro nas redes sociais, a capitalizar a imagem de
verdadeira oposição contra o PSD, enquanto Luís Montenegro se passeava em
trabalho político por Santarém para desvalorizar a tarde da gritaria venturista
“Na
Claro que, se estiverem folgados, os governos ganham sempre este tipo de
confrontos. Na tarde de ontem, como se fosse um debate quinzenal - a propósito,
por causa da moção, o regresso dos quinzenais ficou adiado para dezembro
- o primeiro-ministro deu duas notícias importantes: no Conselho de
Ministros da próxima semana, o Governo (João Galamba?), anunciará o enquadramento legal para a privatização total do
capital da TAP e revelou que afinal o salário mínimo não será
taxado em sede de IRS, como as Finanças tinham admitido. Um recuo, que serve de
boia num tema onde o Governo parecia acometido de um ataque insensibilidade
social.
Mais um momento disruptivo causado pelo Chega, que leva a direita a refletir
sobre os caminhos do seu futuro. A este propósito, recomendo a leitura da newsletter do
David Dinis, Observatório da Maioria, onde ele faz uma pergunta e
apresenta argumentos sobre o tema. Leitura obrigatória: “A direita moderada pode ignorar o Chega? Pode e deve (cinco
estudos para convencer os céticos)”. O texto serve para céticos e não
céticos.
No podcast Expresso da Manhã de hoje, o Paulo Baldaia fala exatamente
com o David Dinis sobre o que diz o debate da moção de censura sobre a direita que
temos hoje em Portugal.
OUTRAS NOTÍCIAS
Noutra assembleia, na Assembleia Geral das Nações Unidas, Marcelo
Rebelo de Sousa falou aos grandes, mas nem todos os grandes estavam, porque os líderes do Reino Unido,
França, Rússia, China e Índia não foram reunião magna da ONU. O presidente português fez um discurso crítico sobre a
sempre adiada reforma do Conselho de Segurança, “que corresponde a um mundo que
já não existe”, disse Marcelo a esse mundo. “Ano após ano nós prometemos. É
tempo de cumprir.”
Entre os outros líderes mundiais, destaque para a intervenção de Volodymyr
Zelensky, que apontou como “clara” a “tentativa da Rússia de transformar a
escassez de alimentos em arma no mercado global”. Veja aqui todo o direto do Expresso sobre o que se passou em
Nova Iorque. O Presidente ucraniano disse que “temos de agir unidos para
derrotar o agressor”.
Enquanto António Guterres, secretário-geral da ONU, criticou a Rússia pela
invasão da Ucrânia e descreveu o aquecimento global como a “ameaça mais
imediata ao nosso futuro”, o presidente norte-americano Joe Biden acusou a Rússia
de comprometer a paz no mundo. Lula da Silva, colocou o foco nas desigualdades,
no ambiente e na insegurança alimentar.
Victor Ângelo, antigo representante português do secretário-geral da ONU adverte
para “a necessidade de reforçar as Nações Unidas em vez de as fragmentar” e
elogia Guterres.
Na Líbia, uma semana e meia depois da tragédia se ter abatido sobre a região
oriental daquele país, milhares de pessoas continuam desaparecidas. A
comitiva das Nações Unidas em Derna alertou, entretanto, que um surto de
doenças poderá criar “uma segunda crise devastadora”. O povo acusa as
autoridades de corrupção. Veja aqui o trabalho em vídeo do Rúben Tiago Pereira.
O primeiro-ministro canadiano Justin Trudeau denunciou ontem o Governo
indiano de Narendra Modi por um suposto assassínio político ordenado por Nova
Deli: conheça a história da morte que pôs o Canadá e a Índia em pé de
guerra.
Na frente nacional, “Chega nunca, nunca, nunca”, repete várias vezes Alberto
João Jardim, nesta entrevista ao Expresso conduzida pelo João Diogo Correia,
que está a cobrir as eleições regionais do próximo domingo na Madeira. O
ex-quase-eterno presidente do Governo Regional considera o acordo de coligação
do PSD com o CDS a única saída possível, “sem dramas”, embora admita “tristeza”. Sobre
um eventual regresso de Passos Coelho, responde: "Diga-me qual é o país
onde tenho de me exilar." E deixa avisos a Luís Montenegro.
A última sondagem conhecida afasta os receios de Jardim. Miguel
Albuquerque pode mesmo nunca precisar do Chega: a coligação Somos Madeira (que
junta PSD e CDS) reúne entre 47% e 53% dos votos dos inquiridos, de acordo com os dados recolhidos pela Universidade Católica
Portuguesa para a RTP. Logo a seguir surge o PS, que poderá ter entre 20% e
26% dos votos, e o Chega e o Juntos Pelo Povo (JPP), ambos com uma variação
entre os entre 5% e 9%.
O Expresso foi a Gaula, a freguesia onde o Juntos pelo Povo nasceu, à
boleia de dois irmãos, hoje em barricadas opostas, e um pai taxista. Nas
sondagens, o partido é dado como possível terceira força política madeirense,
mas alguns militantes desertaram depois de uma polémica com a
composição das listas ter levado à demissão do presidente.
No âmbito da Operação “Tempestade Perfeita”, o ex-ministro da Defesa João Gomes
Cravinho, atualmente nos Negócios Estrangeiros, respondeu por escrito a 25
perguntas do Ministério Público e empurrou as responsabilidades pelo acompanhamento da derrapagem
nas obras do Hospital Militar de Belém para o seu secretário de Estado
Jorge Seguro Sanches. O “Público” de hoje noticia que “Cravinho sabia de
outro processo contra ex-diretor quando o nomeou para a Empordef”.
Portugal está disponível para acolher migrantes de Lampedusa. O Governo português comunicou a Itália disponibilidade para
acolher alguns dos migrantes que desembarcaram nos últimos dias
A propósito, não perca esta reportagem multimédia da Marta Gonçalves,
sobre o cemitério da Europa no Mediterrâneo: “Nada disto que estamos aqui
a fazer é normal” é o título de um trabalho que explica como há pelo menos duas pessoas que
morrem diariamente nas travessias. A União Europeia deixou de ter missões
de resgate, sobram apenas voluntários. Esta é a história da AK
Sobre o medo e o riso, sim, mas Ricardo Araújo Pereira também
discorre chatamente sobre alguns mitos gregos e conversa com a professora
brasileira Verena Alberti sobre o que distingue animais, humanos e deuses.
“Perante uma coisa horrível, rir é o melhor remédio. Não é possível rir e ter
medo ao mesmo tempo”. Ouça aqui o segundo episódio do podcast 'Coisa que não edifica
nem destrói'.
Uma boa notícia: a inflação europeia foi revista em baixa e fixou-se
nos 5,2%. Ao contrário do inicialmente estimado, a taxa de inflação na zona euro abrandou em agosto (a
primeira estimativa apontava para uma estagnação nos 5,3%, valor registado em
julho), indicam os dados do Eurostat, divulgados esta terça-feira.
O PRR português não será dos que preocupa mais Bruxelas. A Comissão Europeia alerta para risco de alguns atrasos,
mas há nove países com riscos crescentes, atrasos significativos ou
significativamente atrasados. Portugal é dos seis países mais avançados no
recebimento dos cheques da ‘bazuca’ europeia.
“Galeno voou”, escreveu o Hugo Tavares da Silva na crónica do jogo, “um
Galeno imparável como o vento e um FC Porto que já se reconhece diante do
espelho”. A equipa portuguesa estreou-se na Liga dos Campeões com uma
vitória, por 3-1, na casa emprestada aos ucranianos do Shakhtar Donetsk em
Hamburgo, na Alemanha. Galeno fez dois golos e uma assistência para Taremi, que
vai recuperando a sua melhor versão. Para Sérgio Conceição, “é importante
realçar que nem estava tudo mal e que agora nem tudo está bem”.
FRASES
“O Presidente da República chamou gorda a uma senhora que estava a sentar-se e
foi atraído pelo generoso decote de outra e em ambos os casos usou a ironia que
– com enorme sucesso, aliás – sempre usou Marcelo. (...) Mas, como tantas vezes
já disse, o Presidente da República comete erros graves por não meter na ordem
Marcelo Rebelo de Sousa. Este é mais um exemplo.”
José Miguel Júdice, no comentário “As Causas”, na SIC-N
“O Chega sabe bem que não há – nem haverá – qualquer bloco à direita em que
possa participar. A alternativa ao PS existe e é o PSD. Sozinho, de
preferência.”
José Matos Correia, advogado, ex-vice-presidente do PSD, no Expresso
“No mundo mágico que nos oferecem, o BCE não aumentava as taxas de juro, os
governos continuavam a meter-nos dinheiro no bolso e, magicamente, a inflação
diminuía e a economia e o emprego cresciam. Melhor do que isto só mesmo aquela
criança que, quando os pais dizem que não têm dinheiro, lhes responde ‘vai ali
à parede tirar’. É lamentável que alguns protagonistas políticos tenham a
irresponsabilidade, sem peso na consciência, de alimentar esse pensamento
mágico, em vez de aproveitarem a oportunidade para explicar os efeitos da
inflação e de como é muito mais nefasta do que a subida dos juros.”
Helena Garrido, jornalista, no Observador
“A Rússia acredita que o mundo se vai cansar e permitir que brutalize a Ucrânia
sem consequências. Poderá algum Estado-membro sentir que está protegido?”
Joe Biden, Presidente dos Estados Unidos, na Assembleia-Geral das Nações Unidas
O QUE ANDO A LER
A edição original tem mais de 20 anos, mas o livro merece ser lido com olhos de
hoje. “Estalinegrado” (Bertrand), do historiador britânico Anthony Beevor - que nos descreve os horrores da
“Ostfront” alemã ou da Grande Guerra Patriótica soviética contra a invasão nazi
-, é um ponto interessante de observação no passado, para olharmos hoje a
guerra da Rússia contra a Ucrânia. A batalha por Estalinegrado, hoje
Volgogrado, foi de uma crueldade sem nome, mesmo para os parâmetros criminosos
difíceis de igualar por nazis e estalinistas. Beevor dá-nos não só a perspetiva
estratégica da batalha, como as questões políticas do lado de Hitler e de
Estaline, mas também a visão dos generais, dos oficiais, dos soldados e do
povo. E vai pontuando a narrativa com detalhes quotidianos e
desabafos de militares nas suas cartas para casa ao um nível micro, que ajuda à
empatia que os números massivos de mortos e feridos não dão.
A galeria de sofrimentos humanos de ambos os lados, como as mortes aos milhares
de soldados por congelamento (sobretudo do lado alemão), por fome, tifo,
desinteria, somados aos horrores da guerra - é repetitivo, mas que palavra é
que uma pessoa usa para descrever “aquilo” que aconteceu “daquela” maneira? -
atingiu níveis de desumanidade apocalípticos, para além do confronto entre
exércitos. Dois regimes abomináveis, dois líderes abomináveis e criminosos,
tornaram abomináveis tantos dos homens que mandaram matar e morrer na
frente: os milhares de soldados fuzilados de ambos os lados às mãos dos
próprios compatriotas por razões políticas ou apenas banais conseguem ser mais
chocantes do que as torturas por que passaram os prisioneiros às mãos do
inimigo.
De forma simplista, o que podemos trazer para os dias de hoje, onde muitas
daquelas terras continuam a escorrer sangue, é que o papel se inverteu. A
Rússia agora é que invadiu, e os soldados russos sofrem como os alemães há
80 anos, numa terra estrangeira, mal equipados, mal preparados, e com
comandantes que desprezam a vida humana e olham para as suas tropas como
carne para canhão.
De facto, há uma constante: a Rússia deu um contributo de sangue decisivo
aos aliados (26 milhões de mortos) para ganhar a guerra contra os nazis, porque
tinha uma fonte inesgotável de jovens para mandar morrer. Hoje, os relatos de
soldados russos enviados como carne para canhão contra as forças ucranianas
encaixam na mesma filosofia, mas terá Putin, nos dias que correm, os mesmos
instrumentos de Estaline para manter o povo dominado? O terror não funciona da
mesma maneira em dois tempos diferentes. É uma das coisas
PODCASTS A NÃO PERDER
As alterações climáticas não vão transformar a nossa vida nas próximas décadas. Já estão a fazê-lo. Para falar sobre os seus efeitos e sobre o que ainda é possível fazermos em relação a eles, Daniel Oliveira recebe Vera Ferreira, no podcast Perguntar Não Ofende
A arte de governar para totós:
quem assombra o fantasma de Cavaco? E o do BCE? Nesta Comissão Política relemos a aula, o silêncio dos
alunos e pauta dos políticos para responder ao novo aumento de juros do BCE
Karina Xavier, cientista: Com uma amostra de fezes “temos informação completa
da saúde de uma pessoa” Em entrevista ao podcast O futuro do futuro, a investigadora fala da importância do
intestino, mas também da alimentação da era industrial, que está a levar à
extinção de várias espécies de micróbios.
Hoje fico por aqui, tenha um bom resto de semana e continue a seguir a
atualidade por aqui, através do Expresso e da Tribuna.
Sem comentários:
Enviar um comentário