Nádia Issufo | Deutsche Welle
Filipe Nyusi enfrenta "período de menor popularidade de um Presidente", diz ativista. Para Quitéria Guirengane, vaias mostram que Nyusi perdeu a legitimidade política aos olhos dos cidadãos indignados com a imagem dele.
O Presidente de Moçambique foi vaiado esta quarta-feira (08.11) pela população de Nacala num comício, no contexto da inauguração de uma subestação de energia elétrica. Depois disso, os populares abandonaram o evento, mesmo antes do seu término, mas Filipe Nyusi escolheu interpretar o recado a seu favor.
E recentemente, o Presidente também foi completamente ignorado pela população de Machaze, na província de Manica, que o olhava com indiferença aquando da sua passagem por uma via.
Tudo isso acontece justamente numa altura em que o país vive uma crise pós-eleitoral, causada pela denúncia da oposição e da sociedade civil de uma "megafraude" supostamente orquestrada pelo seu partido, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
À DW África, a ativista e presidente da Rede de Mulheres Jovens Líderes de Moçambique, Quitéria Guirengane afirmou que o chefe de Estado moçambicano está em maus-lençóis.
DW África: O facto de o Presidente ser vaiado, significa que a população está a enviar uma mensagem muito forte?
Quitéria Guirengane (QG): Sem dúvidas, nós poderíamos dizer que o Presidente enfrenta o período de menor popularidade de um Presidente e, se calhar, nem seria caso de discutirmos a questão da popularidade, mas de uma imagem negativa e nociva. Os cidadãos encontraram uma forma de expressar a sua mensagem de indignação, de repúdio, mas acima de tudo de perda de legitimidade política perante os cidadãos.
Aquilo que o Presidente da República disse que é significado de que as pessoas estão muito felizes com a chegada da corrente elétrica, a pergunta que se colocaria é: nas outras ocasiões que o Presidente foi a outros distritos e não foi vaiado, significa que a população estava sempre muito triste com ele? Ou o Presidente da República está a admitir que nunca houve ninguém feliz com ele em toda a nação moçambicana e por isso é que não conseguiu discursar? Ou está numa situação de elevada vergonha porque o seu nível de popularidade mostra uma imagem negativa?
DW África: Este discurso de Filipe Nyusi de querer tapar o sol com a peneira e até enganar a população, foi uma estratégia que lhe saiu mal, ou seja, custou-lhe uma vergonha maior?
QG: Custou-lhe uma vergonha maior porque o Presidente da República tentou de alguma forma testar a sua popularidade e indo diretamente na ideia de que se for eu a aproximar-se da população, vão mudar de ideia e vão se silenciar, mas passou vergonha porque não há episódio na história que relate algo semelhante. Então, tapar o sol com a peneira num episódio que foi tão bem testemunhado pelos cidadãos, caiu bastante mal e eu creio que o Presidente da República nestes dias não apanha sono e está a tentar estudar alguma ciência que lhe possa permitir reconciliar com os moçambicanos. A única forma de se reconciliar com os moçambicanos é justamente repondo a verdade, fazendo o que está correto e, acima de tudo, começamos a se distanciar daqueles que estão a afundar a imagem.
O Presidente da República está a confiar naqueles que o bajulam, que dizem que está bem assim, bater, matar, perseguir e ignorar os anseios dos cidadãos, que por seu lado, encontram as suas formas de expressar.
DW África: Joaquim Chissano, quando era Presidente da República, foi vaiado pelos "Madgermanes", mas não há relato na história de Moçambique independente de um Presidente ter sido vaiado pela população de uma maneira geral e, neste caso, em particular, uma população rural.
QG: É preciso reconhecer que mesmo quando o Presidente Chissano foi vaiado, levantavam-se os tempos mais difíceis da sua impopularidade, quer dizer quando o seu poder já estava a ser questionado, mas mesmo assim, como bem referiu, havia segmentos da sociedade que começavam a ter algum descontentamento, quer relação à forma como o dossiê "Madgermanes" foi gerido, quer em relação aos assassinatos que se seguiram, como é o caso de Carlos Cardoso e não só. Mas agora, uma população ganhar coragem para não temer militares e conseguiu se levantar. Há um nível em que a população já não se simpatiza com o Presidente, mas tem respeito ou medo [o que já não está a acontecer].
DW África: Celso Correia foi o cabeça da FRELIMO em Nampula nestas eleições, lugar considerado um dos epicentros da "megafraude", e justamente aí a FRELIMO e o seu Presidente receberam a resposta amarga da população. O que se pode dizer em relação a isso?
QG: Esta é sem dúvida a morte política de Celso Correia. Todos os sonhos que ele poderia ter traçado neste momento podem começar a enterrar-se. O seu excesso de ambição criou todos estes problemas que estamos a viver no país. E o seu problema grave de matemática fez com que o enchimento de urnas fosse não só vergonhoso, como também problemático, que demonstrava até déficit de inteligência para lidar com um processo desta natureza. E quando se começa a anunciar que Celso Correia iria encabeçar a delegação de Nampula, de alguma forma, houve vozes populares que diziam que Nampula seria um local em que a FRELIMO iria recuperar alguma simpatia política por causa da imagem de marketing que vendia, no entanto, foi se percebendo no processo que nem todo o mundo tem um preço.
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