António Sango Denunciou os que
Pagam para Matar
Artur Queiroz*, Luanda MEMÓRIAS 2
Antigo Vice-Ministro da FLEC
conta como o dinheiro fez correr sangue inocente
António Luís Sango tinha como
nome de guerra “Lembrança”. Nasceu na aldeia de Cochiloango, município de
Cacongo. Entrou para a FLEC em 8 de Fevereiro de 1977. É enfermeiro de
profissão. Foi vice-ministro da Saúde da FLEC e viveu grande parte da sua vida
junto dos guerrilheiros. Em Agosto de 2011 trocou a guerra pela paz. Como
membro da direcção da FLEC participou em reuniões importantes com os
“intelectuais” da cidade (MPLABANDA). Esta organização foi extinta pelo
Tribunal de Cabinda por se dedicar a actividades ilegais. O seu porta-voz era
Raul Danda, empregado dos franceses da ELF/TOTAL e deputado da UNITA. Os padres
Raul Tati e Jorge Congo eram mentores e dinamizadores dessas actividades. Em
entrevista ao Jornal de Angola, no mês de JUkho de 2012, contou com pormenores
uma reunião onde os “mpalabandistas” encomendaram a morte de inocentes. Um
relato arrepiante!
Jornal de Angola - A paz em
Cabinda é para durar?
António Luís Sango - Se os
intelectuais que vivem na cidade de Cabinda quiserem, vamos ter paz para
sempre. O problema é que muitos deles, só pensam no mal e querem a guerra,
custe o que custar. Estão tão cegos que ainda não perceberam que os homens
armados da FLEC são poucos e quase todos velhos. Há muito que a juventude
rejeita a guerra. A Paz do Luena, em 2002, provou a todos que o diálogo tem
mais força que as armas. Os jovens perceberam isso melhor que ninguém.
JA - O que tem contra aqueles a
que chama intelectuais da cidade de Cabinda?
ALS – Eu não tenho nada contra
ninguém. Mas eles têm contra mim e todos os que andavam nas matas. Quando
chegou a hora de assinar o cessar-fogo eles opuseram-se e usaram argumentos
ofensivos. Diziam que nós somos analfabetos, não sabemos falar e muito menos
negociar. Eles é que têm de decidir. Foi assim que provocaram as grandes cisões
na FLEC. Todos os que querem negociar com o Executivo na base da autonomia,
eles põem-lhes logo o rótulo de traidores. Nós a sofrer nas matas e eles à boa
vida na cidade e nós é que somos os traidores. Alguns são funcionários do
Estado.
JA - Viveu muitos anos nas matas,
como conheceu os intelectuais?
ALS - Em Agosto de 2009 saí das
matas do Maiombe e fui para Ponta Negra. Como era vice-ministro e da direcção
da FLEC participei em muitas reuniões com eles. Nunca me caiu bem a sua
arrogância. E muito menos a facilidade com que eles falavam em matar civis. Em
13 de Agosto de 2009 participei numa reunião, no Hotel Makoka, em Ponta Negra, com Ivo
Macaia e o senhor Capita, que trabalhava na clínica da Chevron em Cabinda. Eles
insistiam que era preciso fazer operações militares porque havia muito silêncio
à volta da FLEC. Eu sabia que nas matas as coisas estavam muito mal e ninguém
queria combater. Mas Gabriel Augusto Nhemba “Pirilampo” acabou por se
comprometer com operações militares.
JA - Qual foi a sua posição sobre
o recomeço das operações militares?
ALS - Informei-os sobre a péssima
situação dos combatentes nas matas. Eles no fim da reunião distribuíram cinco
mil kwanzas, cerca de 20.000 francos CFA, por mim, pelo Rafael Mabiala
“Pacífico”, e pelo Félix Ngonda Puati, comandante da região militar de Cacongo.
Voltamos a encontrar-nos em casa do “Pirilampo” no bairro Songololo. Voltámos a
reunir com o senhor Capita e o Ivo Macaia, no Hotel Makoka. Conhecemo-nos muito
bem. Em 2010 aconteceu aquela loucura do ataque à delegação desportiva do Togo
e aos jornalistas que a acompanhavam. Os intelectuais queriam sangue. Quando se
aperceberam das negociações do presidente Alexandre Tati com o governo, foram
imediatamente a Ponta Negra sabotar a paz.
JA - Eles explicam porque
defendem a guerra na província de Cabinda?
ALS - Dizem que a autonomia é uma
traição e é preciso fazer a guerra pela independência. Consideram-se muito
inteligentes mas não evoluíram nada. Nem sequer percebem que já não existem
condições para fazer a guerra. Faltam armas e faltam combatentes. Já ninguém
adere à FLEC para combater de armas na mão. Só se forem eles para o combate, o
que eu duvido. Não vão deixar os seus bons empregos e negócios em Cabinda para
se meterem na Mata Grande.
JA - Houve discordâncias quanto
ao ataque à caravana desportiva do Togo?
ALS - Houve muitas discordâncias
e para mim foi a maior derrota que a FLEC sofreu. Internacionalmente todos
repudiaram aquela loucura. E internamente houve um grande repúdio, mesmo dos
combatentes mais antigos. Mas em 2010 aconteceram mais erros e que são da
responsabilidade dos mplabandistas. Por exemplo, o assassinato do senhor
Olímpio Pongo.
JA - Pode explicar o que
aconteceu?
ALS - No mês de Outubro de 2010 o
senhor Capita foi a Ponta Negra e entregou dinheiro ao “Pirilampo” para ele atacar
os trabalhadores civis da empresa PGP, que fazia prospecções para a Sonangol.
Em 8 de Novembro o grupo do “Pirilampo” atacou uma viatura da empresa, na área
de Tando Colombo. Morreu o tenente Valentim e o motorista, senhor Olímpio
Pongo. Foi uma tremenda tragédia, porque Olímpio Pongo era primo do senhor
Capita, o homem que deu o dinheiro para a operação. Na guerra, matar o inimigo,
é relativamente indiferente. Mas atacar uma viatura civil, ao serviço de uma
empresa civil e matar um primo, não é assim tão indiferente. O primo do senhor
Capita era um civil. Não tinha que morrer naquela estúpida operação.
JA - Foi um caso isolado?
ALS - Infelizmente, não. Os
mpalabandistas só querem a guerra. Em Dezembro de 2010, o professor Belchior
Lanzo Tarti, mal saiu da cadeia, foi ter connosco a Ponta Negra. Marcámos uma
reunião para o Hotel Makoka e estiveram presentes mais de 50 membros da FLEC.
Queríamos saber o que lhe aconteceu. O Belchior disse ao “Pirilampo” que era
necessário quebrar o silêncio que pesava sobre a FLEC e realizar acções contra
pessoas isoladas, de raça branca, de preferência portugueses. Os itinerários
escolhidos foram Dinge-Inhuca-Buco Zau e Bitchequete-Massabi.
JA - Foi feita alguma acção?
ALS - Foram feitas acções, mas
nenhuma contra civis. O dinheiro entregue pelo professor Belchior serviu para
uma grande operação contra as FAA, na aldeia de Vito Novo, na qual morreram
cinco militares, entre os quais um coronel e um major.
JA - O comandante “Pirilampo”
obedecia às ordens dos intelectuais?
ALS - Infelizmente para ele, sim.
O professor Belchior dava instruções para tirar os combatentes de umas bases
para outras e o “Pirilampo” aceitava. O comandante Batalha foi transferido com
a sua gente, numa carrinha de caixa aberta, alugada em Cabinda pelo professor e
enviada durante a noite para a sua base. Penso que foram para a Mata Grande,
guiados pelo João Massanga “Homem de Guerra” que conhecia a palmo toda a
região. Mas o “Pirilampo” teve um fim triste. O seu quartel-general foi tomado
de assalto pelas FAA no dia 1 de Abril de 2011 e ele acabou por morrer em
combate um mês depois. Os intelectuais dizem que os analfabetos das matas não
têm nada que negociar com o governo porque eles é que sabem. Mas se a FLEC hoje
não tem um único homem a combater em Cabinda é muito por culpa deles, que não
sabem nada da arte militar.
JA - Alexandre Tati é a favor da
guerra?
ALS - O presidente decretou o
cessar-fogo unilateral e penso que não volta para a guerra. Os que querem a
guerra são os que ficaram com Nzita Tiago. O Stephane Barros está em Lisboa,
penso que tem documentos portugueses e é protegido pelo Governo Português. É um
radical que só pensa em
guerra. Vejam bem. O professor Belchior quer nas estradas de
Cabinda acções contra civis brancos, de preferência portugueses. O Stephane
Barros defende a mesma linha. E vive em Lisboa sob a protecção do Governo
Português, que anda a mandar trabalhadores portugueses para Angola onde a ala
dos intelectuais da FLEC os quer matar. Angola com amigos destes, não precisa de
inimigos. A FLEC do Nzita Tiago em Lisboa tem todo o apoio do mundo.
JA - Essas facilidades não são
mais em Paris?
ALS - Paris e Lisboa são a mesma
coisa. O Mingas é cidadão francês e trabalha para uma empresa pública francesa.
Foi preso por estar implicado naquela loucura do ataque à equipa de futebol do
Togo. Um dia destes foi libertado porque diz que nada teve a ver com a
operação, nem sequer participou na preparação da acção. Se o tribunal francês
quiser, arranjo-lhe várias testemunhas que provam o contrário. Ele esteve
pessoalmente no terreno a preparar o ataque. As autoridades francesas sabem que
é assim, mas não querem assumir que um seu cidadão nacional cometeu um acto
terrorista contra desportistas e jornalistas em território angolano.
JA - Qual é a sua actividade
actual?
ALS - Com a graça de Deus vivo em
paz e estou a fazer um estágio profissional. Depois vou trabalhar num hospital
público. A reconstrução nacional espera por mim e eu tenho a obrigação de dar o
máximo. Perdi muito tempo com pessoas que só querem matar e destruir.
*Jornalista