domingo, 25 de junho de 2023

Portugal | CONTRADIÇÕES INSANÁVEIS

Carvalho da Silva* | Jornal de Notícias | opinião

As agendas políticas surgem-nos, cada vez mais, carregadas de propostas incongruentes e sustentadas em argumentos que o tempo evidencia como falácias.

Esta semana, tivemos mais um exemplo, em torno das condições da atribuição de subsídio ao pagamento de rendas das casas. Como diz o povo, quem se lixa é o mexilhão, sempre convocado para pagar os custos das “asneiras” da gestão, seja ela pública ou privada.

No passado dia 21, o Banco de Portugal divulgou o seu “Boletim Económico jun. 2023”. No capítulo “Políticas em Análise” é tratado o tema “Diferencial salarial entre os setores público e privado em Portugal” a partir de fontes estatísticas sólidas e comparando dados relativos a 2008/2009 com os de 2018/2019 (autores: Cláudia Braz, Manuel Pereira, Shamin Sazedj). Esse estudo alerta para a necessidade de “ter em conta as caraterísticas dos recursos humanos de cada setor” e assume que a situação no setor público tem sofrido “alterações profundas nas últimas duas décadas”.

Na Administração Pública, a percentagem de trabalhadores com licenciatura ou mais é incomparavelmente maior que no privado, dado o papel do Estado na garantia de direitos e serviços fundamentais. Os autores expressam que a diferença salarial entre os salários praticados nos dois setores (nos seus globais) é hoje “menor que no passado”, mesmo para o conjunto dos que possuem licenciatura ou mais. E apresentam uma complementaridade preocupante: no caso dos “licenciados no início de carreira, no período recente” verifica-se erosão total da diferença, significando isso que “O setor público perdeu assim toda a capacidade de atração de jovens licenciados relativamente ao setor privado”.

Dizem-nos os autores que parte da vantagem (em queda) que o geral dos licenciados ainda tem “advém da maior proporção de licenciados a ocupar profissões menos qualificadas no setor privado do que no setor público”. Existem dados que provam um crescimento acelerado do número de trabalhadores, com licenciatura ou mais, em trabalhos não qualificados no setor privado e recebendo o salário mínimo. E, uma grande parte dos muitos milhares que emigram fazem-no para fugir a essa triste realidade. O setor privado fica, assim, mal na fotografia: anda muito pouco à procura de “talento”.

No setor público, os salários de todos os trabalhadores estiveram praticamente congelados durante muito tempo, e agora estão a crescer menos que no privado. Isso contribuiu, por exemplo, para que na área da saúde, no ano de 2021, tenham saído mais trabalhadores que nos nove anos anteriores. Estas fugas são outra das explicações de mudanças atrás descritas.

Ora, como todos os salários (do público e do privado) têm perdido valor real, mas de forma mais acentuada no setor público, temos uma harmonização de salários entre os dois setores feita em retrocesso e inserida numa política de desvalorização salarial e das profissões, nomeadamente de muitas altamente qualificadas. Neste processo, o Governo assume, tristemente, o papel de vanguarda.

Contradição suprema: estudos de instituições que defenderam políticas regressivas e de desvalorização salarial, que aplaudiram maior injustiça na distribuição da riqueza, que promoveram, muitas vezes com mentiras, os fundamentalismos da contração da despesa pública vêm agora confirmar o erro dessas posições.

Não basta constatar os erros através de estudos. Fazer ouvidos de mercador e prosseguir neles é caminhar para o descalabro.

*Investigador e professor universitário

Portugal | O CONFESSIONÁRIO

Henrique Monteiro | Henricartoon

Angola | AS LIÇÕES DE MIHAELA E RAFAEL E RAFAEL – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O Festival Ngeya, no Luena, mostra mosaicos culturais preciosos, únicos, marcas distintivas do Povo Angolano. A TPA cobriu o acontecimento. O repórter despediu-se dizendo que o seu canal é o único que apresenta a cultura como ela é. A menina no estúdio sublinhou a publicidade comparativa que é tão proibida como a informação subliminar. Ninguém pode publicitar um produto comprando-o com outros. Dizer que o meu canal é o melhor de todos atropela as mais básicas regras da ética. Sabem porquê?  

Com uma décima parte do dinheiro que o Estado despeja na estação pública de televisão, eu fazia um canal a sério e a partir daí só mesmo o pessoal da TPA consumia aquela porcaria. Mudava todo o mundo para o meu canal. Nem o Ernesto Bartolomeu engolia a produção do seu centro.

O Presidente Lula da Silva foi a Paris partir tudo. Deixem-se desses truques das alterações climáticas. Em primeiro lugar falemos de igualdade. De que serve termos um bom clima se milhões de seres humanos morrem diariamente de fome? O FMI é lixo! O Banco Mundial e lixo! A ONU é lixo! Não podemos aceitar o império do dólar. A Argentina compra produtos ao Brasil e tem de pagar em dólares. O Brasil compra produtos à Argentina e é obrigado a pagar em dólares. Acabou a mama. Vamos usar as nossas moedas nas transacções comerciais.

Já estão a perceber por que razão os esbirros do Pita Grós lá do sítio fizeram acusações falsas contra Lula da Silva e o meteram na cadeia. Quando sair da Presidência do Brasil vai levar prisão perpétua. Se o estado terrorista mais perigoso do mundo não o matar antes. Vamos ver o que vai dar a revolta mundial dos pobres contra o ocidente alargado. 

Um amigo de longa data mandou uma mensagem que me deixou muito triste e desiludido. Diz ele que sou um fanático na defesa do MPLA. Sendo ele um homem inteligente e lúcido, só posso concluir que tenho falhado em toda a linha. Faço críticas justas à direcção do MPLA e depois um camarada que me conhece bem diz que sou fanaticamente do MPLA. A opinião é sagradamente livre. Eu dou a vida pela liberdade de expressão, mesmo dos que optaram pelo banditismo político e mediático.

Angola | CERCO DO CUITO E A LISTA DE ANTÓNIO GUTERRES -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A cidade do Cuito estava cercada pelos criminosos de guerra da UNITA em Junho de 1994. A população sofreu bombardeamentos de artilharia pesada durante 27 dias. Mais de 7.000 civis morreram e entre eles, centenas de crianças. O 28 de Junho é Dia dos Mártires da Resistência da Batalha do Cuito. Mais de 500.000 habitantes ficaram sem comida, sem medicamentos, sem energia, sem água. Apenas tinham os seus mortos que enterravam nos quintais. Este hediondo crime de guerra praticado pelos matadores de Jonas Savimbi não mereceu um segundo nos noticiários dos Media mundiais. Nem uma notícia “solta” de jornais.

Enquanto milhares de civis eram bombardeados e ficavam com os corpos destroçados, morriam de fome ou por falta de cuidados de saúde, os esbirros da UNITA passeavam-se em Portugal. Um deles, Adalberto da Costa Júnior era o “chefe do escritório internacional da UNITA em Portugal”. Outro era Rui Oliveira, o porta-voz dos assassinos. Ambos foram incluídos na lista de altos dirigentes do Galo Negro sancionados pelas Nações Unidas por crimes de guerra e kamanga (tráfico de diamantes de sangue). Assassinos de crianças na cidade do Cuito e em 70 por cento de Angola ocupada pelos matadores de Savimbi.

O Rui Oliveira clamava vitórias. O Adalberto dizia aos jornalistas portugueses que o “éme-pê-élhiá” estava derrotado. O primeiro-ministro português Cavaco Silva assobiava para o lado. António Guterres, alto dirigente socialista, nem uma palavra. Hoje é secretário-geral da ONU e acaba de anunciar que a Federação Russa está na “Lista da Vergonha” alegadamente porque matou crianças na Ucrânia. Os seus sócios da UNITA nunca entraram na lista da ratazana. E mataram milhares de crianças angolanas que tiveram a desdita de não nascerem num país da OTAN (ou NATO) e não serem brancas, loiras e de olhinhos azuis. 

António Guterres (manguço com ninho no altar) em 1995 era primeiro-ministro de Portugal. A rebelião armada de Savimbi estava no auge. Matava civis nas cidades vilas e aldeias. Destruía importantes equipamentos sociais tornando a vida impossível às populações. Milhares de angolanos eram mortos, feridos ou raptados. Sujeitos a terríveis torturas só porque não eram do Galo Negro. No Portugal de Guterres os sicários da UNITA passaram a ter estatuto de “embaixadores”. Guterres era sócio do Savimbi. E ao mesmo tempo secretário-geral do Partido Socialista que se dizia irmão do MPLA. O rato de sacristia está na minha lista dos leprosos morais mais repugnantes. Não vale nada mas sabe-me bem.

SÓ ALGUMAS TRAGÉDIAS IMPORTAM


UMA GUERRA COMO NENHUMA OUTRA

PeterVan Buren *

Este artigo provém de uma publicação dos EUA que se assume como conservadora. Isso não impede o autor de condenar o “esforço cínico dos EUA para lucrar com o sangue de outra nação”. Chama-lhe “doutrina Biden”. Mas talvez mereça a pena recordar que o imperialismo EUA nunca desencadeou ou alimentou nenhuma guerra senão com esse objectivo. Ao colossal negócio do armamento junta-se a perspectiva da “corrida ao ouro” da reconstrução de um país devastado “até ao último ucraniano”. Que o mundo inteiro sofra o impacto desta insanidade não entra nas contas de tal “doutrina”.

Joe Biden criou para os EUA uma guerra como nenhuma outra, uma guerra em que outros morrem e os EUA simplesmente ficam sentados e pagam as contas numa escala gigantesca. Não há tentativas de diplomacia por parte dos norte-americanos, e os esforços diplomáticos de outros, como os chineses, são descartados como perversas tentativas de ganhar influência na área (semelhante à rejeição do trabalho diplomático chinês na guerra do Iémen). Biden está a aproximar-se do 1984: uma situação final de guerra perpétua, enquanto apenas coloca um punhado de vidas norte-americanas em risco. Ele aprendeu as lições da Guerra Fria e já as está a pôr em prática. Poderemos chamar-lhe já Doutrina Biden?

A estratégia de Biden é suficientemente clara agora, após mais de um ano de conflito; o que ele tem enviado para a Ucrânia saltou de capacetes e uniformes para F-16s em apenas quinze meses e não mostra sinais de parar. O problema é que as armas norte-americanas nunca são suficientes para a vitória e são sempre “apenas o suficiente” para permitir que a batalha continue até à próxima ronda. Se os ucranianos pensam que estão a jogar com os EUA em troca de armas, é melhor verificarem quem está realmente a pagar tudo em sangue.

Putin está, de certa forma, a jogar este jogo, com o cuidado para não introduzir nada demasiado poderoso, como bombardeiros estratégicos, e perturbar o equilíbrio e oferecer a Biden a oportunidade de intervir directamente na guerra: pode ouvir-se o velho Joe Biden na televisão, explicando que os ataques aéreos americanos são necessários para evitar um genocídio, a desculpa habitual que aprendeu com Obama. A Ucrânia vai descobrir que, mesmo com a promessa do F-16, não consegue adquirir aviões e treinar pilotos com a rapidez necessária (o tempo mínimo de treino é de 18 a 24 meses) e, a seguir, vai implorar aos EUA para servirem como sua força aérea. É isso que a actual escalada pressagia: poder aéreo.

De momento, é provável que os aviões fiquem baseados na Polónia e na Roménia, o que sugere que a OTAN se encarregará das tarefas altamente qualificadas (e dos custos) da sua manutenção e reparação. Não é claro o papel da NATO no reabastecimento aéreo necessário para manter os aviões no campo de batalha. F-16s à parte, um bónus de todas estas ofertas de armamento é que a grande maioria das transferências até agora têm sido “descargas presidenciais”. Isto significa que os EUA enviam armas usadas ou mais antigas para a Ucrânia, após o que o Pentágono pode usar os fundos autorizados pelo Congresso para reabastecer os seus stocks através da compra de novas armas. Não pode passar despercebida ironia de que as máquinas de guerra, outrora no Iraque sob o comando do Presidente Obama, sejam agora recicladas no terreno na Ucrânia sob o comando do seu antigo vice-presidente.

DETALHES DO ACORDO COM WAGNER QUE PÔS FIM À TENTATIVA DE REBELIÃO

Na noite de 24 de junho, Dmitry Peskov, porta-voz do presidente russo, revelou detalhes sobre o acordo que pôs fim à tentativa de rebelião de Evgeny Prigozhin e da parte das unidades da Wagner que o apoiavam.

South Front | # Traduzido em português do Brasil

De acordo com Peskov, o processo criminal aberto pelo FSB contra Prigozhin será interrompido e ele deixará a Rússia.

O porta-voz revelou que Prigozhin "irá para a Bielorrússia". Ele não detalhou o que os efetivos de Wagner farão por lá.

Os combatentes de Wagner que apoiaram Prigozhin não serão perseguidos, tendo em conta as suas ações durante a operação especial em curso na Ucrânia.

Os mercenários que se recusaram a participar da tentativa de rebelião (comentário SF: uma parte maior das unidades da Wagner) poderão assinar contratos com o Ministério da Defesa russo, afirmou Peskov.

Atualmente, as unidades de Wagner estão sendo devolvidas aos seus campos de campo, de acordo com o anúncio de Prigozhin e vídeos, fotos que aparecem online.

Em 24 de junho, as unidades Wagner que apoiavam Prigozhin capturaram o QG do Distrito Militar do Sul da Rússia na cidade de Rostov-on-Don e começaram a se mover em direção a Moscou. Confrontos esporádicos entre as forças de segurança russas e unidades da Wagner ocorreram durante o dia.

A tentativa de rebelião foi interrompida na tarde do dia 24 de junho. O referido acordo foi alcançado na sequência de conversações entre Prigozhin e o Presidente bielorrusso, Alexander Lukashenko. As conversas foram acordadas com Vladimir Putin. Relatos dizem que a participação nessas negociações foi iniciativa de Lukashenko.

Desde a primeira quinzena de 25 de junho, a agência rodoviária federal russa, Rosavtodor, disse à agência de notícias TASS que a maioria das restrições às viagens em estradas e rodovias foi suspensa. Algumas restrições permanecem na rodovia M4, que liga Moscou e cidades no sul da Rússia.

A situação em Rostov-on-Dom permanece calma. Wagner deixou a cidade.

Yevgeny Prigozhin | ASCENÇÃO E QUEDA DE UM OLIGARCA RUSSO

M. K. Bhadrakumar [*]

Os dirigentes do Kremlin actuaram de forma decisiva para fazer face à ameaça de uma insurreição armada por parte do oligarca russo e auto-denominado "fundador" do Grupo Wagner de empreiteiros militares, Yevgeny Prigozhin.

Numa série de vídeos divulgados na sexta-feira, Prigozhin alegou que as justificações do governo russo para a intervenção militar na Ucrânia se baseavam em mentiras. Acusou o ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, de "tentar enganar a sociedade e o Presidente e de nos dizer que houve uma agressão louca por parte da Ucrânia e que eles estavam a planear atacar-nos com toda a NATO". O ministro afirmou que as forças armadas russas regulares lançaram ataques com mísseis contra as forças de Wagner, matando um número "enorme" de pessoas.

Prigozhin declarou: "O conselho de comandantes do PMC Wagner tomou uma decisão – o mal que a liderança militar do país traz deve ser travado". Prometeu marchar sobre Moscovo e pedir contas aos responsáveis.

O Serviço Federal de Segurança ou FSB (antigo KGB) classificou o ato como "uma rebelião armada"; o quartel-general de Wagner em São Petersburgo foi selado; a Procuradoria-Geral da República declarou que "este crime é punível com pena de prisão de 12 a 20 anos".

Num discurso à nação às 10h00 de sábado, hora de Moscovo, o Presidente Vladimir Putin condenou veementemente os acontecimentos, descrevendo-os como "um motim armado" e apelando à "consolidação de todas as forças". Putin estabeleceu um paralelo com a insurreição de Petrogrado (São Petersburgo), em fevereiro de 1917, que conduziu à Revolução Bolchevique e a uma guerra civil prolongada, com uma intervenção militar ocidental em grande escala, incluindo a dos Estados Unidos, "enquanto todo o tipo de aventureiros políticos e forças estrangeiras tiravam partido da situação, dilacerando o país para o dividir".

Putin prometeu: "Serão também tomadas medidas decisivas para estabilizar a situação em Rostov-on-Don (700 km a sul de Moscovo, onde se encontra Prigozhin com os combatentes Wagner).

Putin prometeu que aqueles "que organizaram e prepararam um motim militar, que pegaram em armas contra os seus camaradas – traíram a Rússia", serão punidos. É significativo o facto de Putin nunca ter mencionado o nome de Prigozhin.

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