Paul Krugman* – The New York Times - UOL Notícias
Os últimos três anos foram um desastre para a maioria das economias ocidentais. Os Estados Unidos têm um desemprego em massa de longo prazo pela primeira vez desde os anos 30. Enquanto isso, a moeda única da Europa está se desfazendo. Como tudo deu tão errado?
Bem, eu estou ouvindo com crescente frequência de membros da elite autora de políticas – sábios autonomeados, autoridades e acadêmicos em boa posição – a alegação de que a culpa é do público. A ideia é de que entramos nessa confusão porque os eleitores queriam algo em troco de nada, e políticos de mentalidade fraca atenderam à tolice do eleitorado.
Então me parece um bom momento para apontar que esta visão de atribuir a culpa à população não apenas atende a interesses próprios como é completamente errada.
O fato é que o que nós estamos experimentando no momento é um desastre de cima para baixo. As políticas que nos botaram nessa confusão não foram respostas a uma exigência popular. Elas foram, com poucas exceções, políticas defendidas por pequenos grupos de pessoas influentes – em muitos casos, as mesmas pessoas que agora estão nos dando lição sobre a necessidade de sermos sérios. E ao tentarem transferir a culpa para a população em geral, as elites estão se esquivando de uma reflexão muito necessária sobre seus próprios erros catastróficos.
Permita-me que me concentre principalmente no que aconteceu nos Estados Unidos e depois dizer algumas poucas palavras sobre a Europa.
Atualmente é pregado constantemente aos americanos a necessidade de redução do déficit orçamentário. Esse foco em si representa prioridades distorcidas, já que nossa preocupação imediata deveria ser a criação de empregos. Mas suponha que nos limitássemos a falar sobre o déficit e perguntássemos: o que aconteceu com o superávit orçamentário que o governo federal tinha em 2000?
A resposta envolve três coisas principais. Primeiro, ocorreram as reduções de impostos de Bush, que adicionaram aproximadamente US$ 2 trilhões à dívida nacional ao longo da última década. Segundo, ocorreram as guerras no Iraque e no Afeganistão, que adicionaram aproximadamente US$ 1,1 trilhão. E terceiro ocorreu a grande recessão, que levou tanto a um colapso na receita quanto a um forte aumento de gastos em seguro-desemprego e outros programas sociais.
E quem foi responsável por esses arrebentadores de orçamento? Não foram as pessoas nas ruas. O presidente George W. Bush reduziu os impostos a serviço da ideologia de seu partido, não em resposta a um clamor popular – e grande parte das reduções foi destinada a uma minoria rica.
De modo semelhante, Bush decidiu invadir o Iraque porque era algo que ele e seus assessores queriam fazer, não porque os americanos estavam clamando por uma guerra contra um regime que não teve nada a ver com o 11 de Setembro. De fato, foi necessária uma campanha de venda altamente enganadora para fazer com que os americanos apoiassem a invasão, e mesmo assim, os eleitores nunca apoiaram solidamente a guerra quanto a elite política e acadêmica americana.
Finalmente, a grande recessão foi causada por um setor financeiro descontrolado, suportado por uma desregulamentação imprudente. E quem foi responsável pela desregulamentação? Pessoas poderosas em Washington, com laços estreitos com o setor financeiro. Permita-me dar um crédito em particular para Alan Greenspan, que exerceu um papel crucial tanto na desregulamentação financeira quanto na aprovação das reduções de impostos de Bush – e que agora, é claro, está entre aqueles que estão nos intimidando a respeito do déficit.
Então foi o juízo ruim da elite, não a ganância do homem comum, que causou o déficit americano. E muito disso também vale para a crise europeia.
Não é preciso dizer, não é isso o que você ouve dos autores de políticas europeus. A história oficial na Europa atualmente é que os governos de países problemáticos cederam demais às massas, prometendo muito aos eleitores ao mesmo tempo em que coletavam muito poucoem impostos. E esta é, para ser justo, a história razoavelmente precisa da Grécia. Mas não é o que aconteceu na Irlanda e na Espanha, países que tinham baixa dívida e superávits orçamentários às vésperas da crise.
A verdadeira história da crise da Europa é que os líderes criaram uma moeda única, o euro, sem criar as instituições que eram necessárias para lidar com os booms e colapsos dentro da zona do euro. E o impulso para a moeda única foi o projeto de cima para baixo supremo, uma visão da elite imposta sobre eleitores altamente relutantes.
E isso importa? Por que deveríamos nos preocupar com o esforço de transferir a culpa por políticas ruins para o público em geral?
Uma resposta é a simples responsabilidade. As pessoas que defenderam as políticas que arrebentaram o orçamento durante os anos Bush não deveriam ser autorizadas a se passarem por fiscais do déficit; pessoas que elogiaram a Irlanda como um exemplo não deveriam dar aulas sobre governança responsável.
Mas a resposta maior, eu diria, é que ao inventarem histórias sobre nosso apuro atual para absolver as pessoas que nos colocaram nele, nós perdemos qualquer chance de aprender algo com a crise. Nós precisamos atribuir a culpa a quem ela pertence, punir as elites autoras de políticas. Caso contrário, elas causarão danos ainda maiores no futuro.
Bem, eu estou ouvindo com crescente frequência de membros da elite autora de políticas – sábios autonomeados, autoridades e acadêmicos em boa posição – a alegação de que a culpa é do público. A ideia é de que entramos nessa confusão porque os eleitores queriam algo em troco de nada, e políticos de mentalidade fraca atenderam à tolice do eleitorado.
Então me parece um bom momento para apontar que esta visão de atribuir a culpa à população não apenas atende a interesses próprios como é completamente errada.
O fato é que o que nós estamos experimentando no momento é um desastre de cima para baixo. As políticas que nos botaram nessa confusão não foram respostas a uma exigência popular. Elas foram, com poucas exceções, políticas defendidas por pequenos grupos de pessoas influentes – em muitos casos, as mesmas pessoas que agora estão nos dando lição sobre a necessidade de sermos sérios. E ao tentarem transferir a culpa para a população em geral, as elites estão se esquivando de uma reflexão muito necessária sobre seus próprios erros catastróficos.
Permita-me que me concentre principalmente no que aconteceu nos Estados Unidos e depois dizer algumas poucas palavras sobre a Europa.
Atualmente é pregado constantemente aos americanos a necessidade de redução do déficit orçamentário. Esse foco em si representa prioridades distorcidas, já que nossa preocupação imediata deveria ser a criação de empregos. Mas suponha que nos limitássemos a falar sobre o déficit e perguntássemos: o que aconteceu com o superávit orçamentário que o governo federal tinha em 2000?
A resposta envolve três coisas principais. Primeiro, ocorreram as reduções de impostos de Bush, que adicionaram aproximadamente US$ 2 trilhões à dívida nacional ao longo da última década. Segundo, ocorreram as guerras no Iraque e no Afeganistão, que adicionaram aproximadamente US$ 1,1 trilhão. E terceiro ocorreu a grande recessão, que levou tanto a um colapso na receita quanto a um forte aumento de gastos em seguro-desemprego e outros programas sociais.
E quem foi responsável por esses arrebentadores de orçamento? Não foram as pessoas nas ruas. O presidente George W. Bush reduziu os impostos a serviço da ideologia de seu partido, não em resposta a um clamor popular – e grande parte das reduções foi destinada a uma minoria rica.
De modo semelhante, Bush decidiu invadir o Iraque porque era algo que ele e seus assessores queriam fazer, não porque os americanos estavam clamando por uma guerra contra um regime que não teve nada a ver com o 11 de Setembro. De fato, foi necessária uma campanha de venda altamente enganadora para fazer com que os americanos apoiassem a invasão, e mesmo assim, os eleitores nunca apoiaram solidamente a guerra quanto a elite política e acadêmica americana.
Finalmente, a grande recessão foi causada por um setor financeiro descontrolado, suportado por uma desregulamentação imprudente. E quem foi responsável pela desregulamentação? Pessoas poderosas em Washington, com laços estreitos com o setor financeiro. Permita-me dar um crédito em particular para Alan Greenspan, que exerceu um papel crucial tanto na desregulamentação financeira quanto na aprovação das reduções de impostos de Bush – e que agora, é claro, está entre aqueles que estão nos intimidando a respeito do déficit.
Então foi o juízo ruim da elite, não a ganância do homem comum, que causou o déficit americano. E muito disso também vale para a crise europeia.
Não é preciso dizer, não é isso o que você ouve dos autores de políticas europeus. A história oficial na Europa atualmente é que os governos de países problemáticos cederam demais às massas, prometendo muito aos eleitores ao mesmo tempo em que coletavam muito pouco
A verdadeira história da crise da Europa é que os líderes criaram uma moeda única, o euro, sem criar as instituições que eram necessárias para lidar com os booms e colapsos dentro da zona do euro. E o impulso para a moeda única foi o projeto de cima para baixo supremo, uma visão da elite imposta sobre eleitores altamente relutantes.
E isso importa? Por que deveríamos nos preocupar com o esforço de transferir a culpa por políticas ruins para o público em geral?
Uma resposta é a simples responsabilidade. As pessoas que defenderam as políticas que arrebentaram o orçamento durante os anos Bush não deveriam ser autorizadas a se passarem por fiscais do déficit; pessoas que elogiaram a Irlanda como um exemplo não deveriam dar aulas sobre governança responsável.
Mas a resposta maior, eu diria, é que ao inventarem histórias sobre nosso apuro atual para absolver as pessoas que nos colocaram nele, nós perdemos qualquer chance de aprender algo com a crise. Nós precisamos atribuir a culpa a quem ela pertence, punir as elites autoras de políticas. Caso contrário, elas causarão danos ainda maiores no futuro.
Tradução: George El Khouri Andolfato
*Paul Krugman - Professor de Princeton e colunista do New York Times desde 1999, Krugman venceu o prêmio Nobel de economia em 2008
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