quarta-feira, 27 de julho de 2011

QUANDO O LIXO É UMA BÊNÇÃO…




ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA

Para não enfrentar os problemas, Portugal varre-os para debaixo do tapete. E é tanta a porcaria que lá está que quando alguém coloca o país ao nível do lixo… até parece uma bênção.

O primeiro-secretário da embaixada de Portugal em Angola, Paulo Lourenço, diz que a visita dos embaixadores dos países membros da União Europeia acreditados em Angola a Cabinda é importante para a comunidade europeia porque vai permitir uma avaliação mais rigorosa e objectiva das circunstâncias no terreno.

Em entrevista a um dos muitos meios de propaganda do regime, no caso à Angop, o diplomata ajudou mais uma vez, e certamente cumprindo as ordens do governo de Lisboa, a branquear a negra situação, sobretudo mas não só em matéria de liberdades e direitos humanos, que se vive na colónia de Cabinda.

Mas se do regime angolano (MPLA) é de esperar tudo, de Portugal esperar-se-ia algo de diferente, algum decoro e equidistância, mesmo sabendo-se que a corda no pescoço raramente permite actos decentes e nobres.

Mas a verdade é que Portugal, mesmo antes de estar no patamar do lixo, nunca se lembrou (para isso é preciso ter dignidade, honra e memória) dos compromissos que assinou, a não ser com a “troika”  e mesmo assim não se tem a certeza de que amanhã se vão lembrar.

Mas, queiram ou não, do ponto de vista de um Estado de Direito (que Portugal é cada vez menos) é importante dizer-se que este reino lusitano não só não honrou a palavra dada ao Povo de Cabinda (também, eu sei, não honra a dada aos próprios portugueses) como aviltou a assinatura dos seus antepassados que, esses sim, com sangue, suor e lágrimas deram luz ao mundo.

Portugal não só violou o Tratado de Simulambuco de 1 de Fevereiro 1885 como, pelos Acordos de Alvor, ultrajou o povo de Cabinda, sendo por isso responsável, pelo menos moral (se é que isso tem algum significado), por tudo quanto se passa no território, seu protectorado, ocupado por Angola.

Quando o presidente da República de Portugal, Aníbal Cavaco Silva, diz que Angola vai de Cabinda ao Cunene está, também ele, a dar cobertura e a ser conivente com as violações que o regime angolano leva a efeito contra um povo que apenas quer ter o direito de escolher o seu futuro.

É verdade que entre o petróleo, grande parte dele produzido em Cabinda, e os direitos humanos dos angolanos e dos cabindas, Portugal (quase) sempre escolheu o lado do ouro negro.

Também é verdade que entre dois tipos de terrorismo, Portugal tem como bitola que um deles deve ser considerado de boa qualidade. E qual é ele? É sempre o que estiver no poder.

De má qualidade é, claro está, praticado por todos aqueles que apenas querem que se respeite os seus mais sublimes direitos.

Portugal, honrando a alta qualidade dos seus médicos, optou por ter uma coluna vertebral amovível. Tem coluna quando é para espezinhar os fracos, não a tem quando os outros são, ou parecem ser, mais fortes. No caso de Cabinda é isso que se passa. Mas, apesar de tudo, o problema de Cabinda existe e não é por pouco se falar dele que ele deixa de existir.

Cabinda é um território ocupado por Angola e nem a potência ocupante como a que o administrou pensaram, ou pensam, em fazer um referendo para saber o que os cabindas querem. Seja como for, o direito de escolha do povo não prescreve, não pode prescrever, mesmo quando o importante é apenas o petróleo.

Cabinda (se é que Paulo Portas e os restantes membros do governo sabem alguma coisa sobre o assunto) é um problema político e não jurídico, embora tenha uma dimensão jurídica.

Para que Cabinda deixasse se ser um problema, os sucessivos governos portugueses varreram o assunto para debaixo do tapete. E debaixo do tapete é tanta a porcaria que quando alguém coloca o país ao nível do lixo… até parece uma bênção.

*Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado

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