LUÍS GONÇALVES - SOL
Os efeitos da recessão económica mundial de 2009 e do início da crise da dívida soberana na Zona Euro, no ano seguinte, travaram uma 'época dourada' nas relações financeiras entre Portugal e os países lusófonos, segundo dados de um relatório do Banco de Portugal divulgado esta semana em Lisboa.
A combinação do abrandamento de economias como a angolana ou moçambicana, desde 2008, com a deterioração da economia portuguesa neste período, foi ‘letal’ e levou os fluxos de investimento entre os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e Portugal para quedas históricas acima de 50%, arrastando o endividamento para níveis nunca vistos.
Segundo o documento do banco central português, o Investimento Directo Estrangeiro (IDE) de Portugal nos PALOP e Timor Leste caiu 64% no ano passado face a 2009, tendo recuado para níveis de 2005. A queda de 90% nos fluxos destinados às actividades financeiras e de 80% da construção em 2010, dois dos três maiores sectores a par do comércio, foram as componentes que mais penalizaram a evolução do investimento.
Angola, mercado que canaliza 72% do capital português para os PALOP e Timor Leste, foi o principal responsável por esta travagem, com o investimento para o país a cair cerca de um terço, de 693,8 para 226,7 milhões de euros. A crise económica que atingiu Angola, em 2009 e 2010, foi especialmente negativa para a construção e actividades financeiras, que viram o investimento português diminuir 70% e 90%, respectivamente.
Moçambique (que capta 15% do investimento português na região) não escapou à tendência e assistiu à fuga dos empresários portugueses que investiram no ano passado cerca de metade do que em 2009 (de 162,4 para 45,9 milhões de euros).
As excepções a esta tendência foram Cabo Verde e Guiné-Bissau. Os sectores da construção e turismo conseguiram triplicar o investimento luso para o governo da Praia (que é o terceiro maior destino neste ranking de investimento a seguir a Moçambique) até 30,9 milhões de euros. Já a Guiné-Bissau passou de um investimento quase nulo, em 2009, para 7,4 milhões de euros, no ano passado, assente no sector da consultoria.
Mas não foi só o investimento oriundo de Portugal que afundou. Os PALOP, no ano passado, também cortaram o fluxo financeiro destinado ao mercado português para cerca de metade (descida de 51,5%), face a 2009, até 57,8 milhões de euros, adianta o Banco de Portugal. No entanto, o investimento dos PALOP e Timor Leste é residual, representando apenas 0,2% do IDE total canalizado para Portugal. Angola é o maior investidor com uma fatia de 78% do total.
Mas a crise e as dificuldades financeiras vividas por muitos dos países lusófonos nos últimos dois anos tiveram outro efeito negativo, que foi o crescente endividamento face a Portugal. O documento do Banco de Portugal salienta que a dívida total dos PALOP (incluindo a dívida directa e a garantida pelo Estado), somou no ano passado 2,4 mil milhões de dólares (1,75 mil milhões de euros), uma descida de 12% face a 2009 e o equivalente a 1% do PIB português. Só Angola é responsável por 60% da dívida total dos PALOP (mil milhões de euros), seguido de Moçambique (21,7%) e Cabo Verde (11%). Nos últimos cinco anos, a dívida dos PALOP a Portugal quase duplicou. Em 2005, estes encargos ascendiam a apenas 1,5 mil milhões de dólares (cerca de mil milhões de euros).
Mas a travagem no investimento português em Angola é um sinal contrário face às oportunidades que o país oferece. Segundo o mais recente relatório sobre o investimento mundial publicado pelas Nações Unidas, Angola é o país com maior potencial em África e aquele que mais investimento directo estrangeiro recebeu na região em 2010 – cerca de 9,9 mil milhões de dólares, muito acima da África do Sul ( 1,5 mil milhões de dólares) e Congo ( 2,9 mil milhões de euros).
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