Manifestações pedem saída das tropas da Minustah, chefiadas pelo Exército brasileiro. Conselho de Segurança decide até próximo dia 15 futuro da missão de estabilização no Haiti. Protestos marcados para esta quinta-feira.
À medida que o dia 15 de outubro se aproxima, aumenta a tensão no Haiti. Nesta data, o Conselho de Segurança das Nações Unidas vai decidir sobre a permanência da missão de estabilização no país caribenho, liderada pelo Exército brasileiro.
Nas ruas, protestos pedem a saída imediata da Minustah, abreviatura do nome oficial da missão. Para esta quinta-feira (29/09), movimentos sociais anunciaram uma nova manifestação conta os chamados capacetes azuis. "Somos radicalmente contra a Minustah. Não queremos os soldados aqui. Queremos que se rompa essa cadeia de dependência que já dura oito anos", disse à Deutsche Welle Joseph Jacques Hebreux, um dos organizadores dos protestos.
Hebreux é um dos fundadores do Bri Kouri Nouvèl Gaye, grupo criado por haitianos após o forte terremoto em janeiro do ano passado, que reúne movimentos de base, como o estudantil e o camponês. Com ajuda de doadores, a iniciativa publica mensalmente um jornal popular crítico ao governo. Foi exatamente em 15 de outubro de 2010 que o movimento convocou a primeira manifestação contra a Minustah. De lá para cá, a oposição ganhou corpo e ficou mais organizada.
Comando brasileiro
O comando da missão ressalta que os movimentos são organizados por estudantes da faculdade de Etimologia, em Porto Príncipe, embora o ano letivo no Haiti comece apenas em 3 de outubro. "Percebemos que a população em geral é a favor da Minustah aqui, não só por causa da questão da segurança, como também por causa do bom relacionamento que as tropas mantêm com a população", afirmou o coronel Maurício Cruz, porta-voz da divisão militar da missão.
A operação liderada pelo Brasil teve início em 1º de junho de 2004. A missão foi autorizada pelo Conselho de Segurança em fevereiro daquele ano, depois que o então presidente, Bertrand Aristide, deixou o Haiti durante um conflito armado organizado por insurgentes.
Os brasileiros compõem a maior parte do contingente: dos 8.700 militares e 3.300 policiais, aproximadamente 2.400 são do Exército do Brasil. "Até o momento, não tivemos nenhum incidente diretamente contra as nossas tropas que fazem rondas normalmente nas ruas", comentou Cruz.
"O presidente declarou que ele deseja, lógico, que a Minustah faça uma redução gradual, planejada, mas não no momento, porque ele não acha que a polícia nacional haitiana seja capaz de manter a situação estável em termos de segurança."
A voz do presidente
Em discurso na Assembleia Geral da ONU no último dia 23, Michel Martelly, presidente do Haiti desde maio, defendeu a permanência das tropas no país. "A missão não pode ser reduzida a uma simples força de intervenção ou a uma que tenha um papel de observadora mais ou menos neutra", disse.
"Certamente, estou consciente da existência de erros inaceitáveis que mancharam o prestígio da missão, mas a árvores não podem esconder a floresta. E eu penso que a estabilização política passa por vários estágios", discursou Martelly.
Quanto aos "erros inaceitáveis", o presidente cita o vídeo que vazou na internet em que dois soldados uruguaios são vistos violentando um jovem haitiano. As imagens, divulgadas no início do mês, foram um estopim para o aumento dos protestos em Porto Príncipe.
"Nem todas as pessoas tinham em mente que o trabalho que os soldados estão fazendo não era uma coisa boa, que país está perdendo toda a soberania que antes tinha. Mas depois do caso com os soldados uruguaios, a consciência aumentou. A cada semana, temos na capital uma manifestação popular pacífica contra a ONU", contou Joseph Jacques Hebreux.
Segurança para o Haiti
"Entre a população em geral, há uma sensação de que a Minustah não acrescentou tanto assim para o país, se comparado ao montante de recursos que está usando. Recentemente, foram solicitados 150 milhões de dólares para a extensão do mandato, enquanto as forças de segurança nacional do Haiti e a polícia não foram beneficiadas com esse dinheiro", aponta Meena Jagannath, do Instituto para Justiça e Democracia no Haiti.
Segundo a advogada, os policiais haitianos estão praticamente sem receber, e afinal seriam eles os responsáveis pela segurança da população. "A Minustah não tem um mandato que permita que os soldados investiguem um crime e prendam o criminoso, por exemplo, a menos que o crime aconteça diante dos olhos deles", acrescenta Jagannath.
O líder do Bri Kouri Nouvèl Gaye prevê que a tensão se agrave no Haiti. "Os movimentos sociais são contra a presença das tropas estrangeiras, e o presidente está contra nós", justificou Hebreux. "Gostaríamos de participar da discussão, mas quando o governo vai debater a permanência da missão, nunca há participação popular. As conversas acontecem com representantes do governo do Haiti e de outros países", reclama.
Autora: Nádia Pontes - Revisão: Roselaine Wandscheer
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