quarta-feira, 28 de setembro de 2011

UMA MÃO CHEIA DE NADA




FERNANDO SANTOS – JORNAL DE NOTÍCIAS, opinião

A Europa dispõe de muitos defeitos e, pelo menos, de uma virtude, infelizmente em desmantelamento: o Estado Social. E a actual prática política, coxa até mais não, dá uma garantia: é mais fácil o sucesso da aposta na falência do actual modelo do que acertar na chave de qualquer concurso do Euromilhões.

Vivendo a Europa a várias velocidades, de desenvolvimento mas também de (des)inteligência, são naturalmente gradativos os efeitos de desajustamento dos apoios sociais. A formatação nórdica, por exemplo, está nos antípodas da mediterrânica...

O caso português é, por agora, um paradigma de preocupação, tantas e tão gigantescas são as dificuldades para financiar o sistema nas suas várias vertentes - do subsídio de desemprego à universalidade da assistência na saúde; dos abonos de família às... reformas!

O facto de mais de 31 mil empresas estarem a incorrer por esta altura no crime de abuso de confiança fiscal por não entregarem à Segurança Social as verbas cativadas aos trabalhadores (a 662 milhões de euros poder-se-á somar a da inexistência dos próprios descontos a que estão obrigadas enquanto empregadoras) é, tão-só, um "pormaior" exemplificativo de como o sistema está a sofrer abalos. Junte-se-lhe o cada vez maior número de beneficiários, por via da descompensação originada por uma população cada vez mais envelhecida, e é fácil a conclusão: ou há recomposição, por baixo, de cálculos e de direitos ou no espaço de pouquíssimas décadas dá-se a rotura total.

Estamos, então, conversados: é mesmo necessário reformatar todo o sistema.

O acordo sobre esta conclusão não evita, porém, a necessidade de se avançarem sistemas alternativos, sob pena de a cada passo ser espetado mais um prego nos até há poucos anos chamados e respeitáveis direitos adquiridos.

Não faz sentido questionar o princípio solidário, transversal a toda a sociedade. Mas é tempo de a sociedade poder dispor de livre iniciativa, saindo do jugo tentacular do Estado.

No caso específico dos esquemas de descontos e de cálculos para atribuição de reformas, urge dar corpo a um modelo de plafonamento na obrigatoriedade de contribuição de cada cidadão para a Segurança Social - e que sem nenhumas dúvidas continue a contribuir (e a garantir) níveis aceitáveis de apoio social dignificante aos mais carentes.

No pé em que as coisas estão hoje por hoje há uma perspectiva a tornar-se intolerável: todos os descontos realizados para a Segurança Social tendem a transformar-se em garantia de coisa nenhuma. Isto é: tendo no horizonte uma promessa estatal de velhice minimamente descansada, quem paga, em muitos casos forte e feio, vê o falhanço das políticas caminharem para cortes sistemáticos até à falência e, como tal, à retribuição realizada por uma mão-cheia de nada!

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