Foi com “incontrolável emoção” que Xanana Gusmão recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade de Coimbra. Depois da surpresa da notícias, chegada por SMS – e recebida com um singelo “não, não pode ser – , o símbolo maior da resistência timorense regressou a Coimbra e voltou a sentir “a consciência vagante do aluno ‘ad eternum’ da Faculdade de Direito”.
O discurso de Xanana na cerimónia centrou-se nas críticas à globalização e aos líderes mundiais. “Um dos elementos que avivaram a chama da resistência, no país que me fez indivíduo, foi o slogan de uma nova ordem mundial. Quatro décadas depois, a nova ordem mundial ficou subordinada à globalização de ideias, políticas, regras e critérios formuladas por um pequeno grupo de indivíduos… numa globalização real da… atrofia das mentes”, começou por dizer.
“Hoje, o mundo perdeu o rumo (…) a liberdade ficou subjugada pelos interesses dos poderosos, a democracia violentada para a defesa dos mais fortes, os direitos humanos espezinhados pelos interesses económicos e a justiça restrita aos segmentos mais frágeis de coletivos”, acrescentou.
“O mundo necessita de coragem para romper as barreiras dos interesses que, pretensamente globais, conduzem a atos de injustiça”, concluiu.
Xanana lamentou ainda que os indivíduos – como o coletivo de hoje – continuem “subdesenvolvidos, porque ou lhe pagam para não produzir ou não tem emprego e lhe negam oportunidades”. O resultado está à vista: “milhões de seres humanos estão sob a ameaça de morrerem de fome”.
No final, ficou uma mensagem de otimismo: “os jovens de hoje são a promessa do futuro. Um futuro necessariamente diferente, um futuro de maior humanismo e de maior justiça social, um futuro de maior respeito mútuo e de verdadeira paz… em todo o globo e para todos os seres humanos. E esse futuro já deveria ter dado início… como reparação do presente!”
Xanana Gusmão foi recebido na Universidade de Coimbra de forma calorosa por alguns alunos timorenses. Na cerimónia marcaram presença algumas figuras importantes de Coimbra, de Portugal e de Timor, como D. Ximenes Belo, Nuno Crato (ministro da Educação), Almeida Santos (antigo presidente da Assembleia da República) ou Barbosa de Melo (presidente da Câmara de Coimbra).
A atribuição do grau de doutor honoris causa a Xanana Gusmão, pela Faculdade de Letras, foi proposta por Eduardo Lourenço. O elogio ao apresentante esteve a cargo de Sousa Ribeiro e a apresentação de Xanana foi feito por José Augusto Cardoso Bernardes.
José Augusto Cardoso Bernardes lembrou que a “parcimónia” com que a Faculdade de Letras atribui esta distinção, tendo apenas aberto, até agora, duas exceções para distinguir Vergílio Ferreira e José Saramago. Voltou a fazê-lo com Xanana. “E tem boas razões para tanto”, considera: “trata-se, em primeiro lugar, de uma personalidade portadora de um crédito político da maior relevância: impediu a absorção do seu país por uma potência vizinha”.
Mas, além de lutador, foi também escritor e pintor, recordou o docente da Faculdade de Letras. “Pelos seus méritos carismáticos e também pelas metamorfoses que atravessou, Xanana Gusmão pode ser considerado um verdadeiro herói do século XX”, declarou.
José Augusto Cardoso Bernardes frisou também o papel de Xanana na escolha do Português como língua oficial de Timor e comparou o líder timorense a Eduardo Lourenço: “celebremos a feliz circunstância de ver hoje lado a lado o incansável lutador do espírito que é Eduardo Lourenço e o lutador cívico que é Kay Rala Xanana Gusmão”.
Já Sousa Ribeiro, além de elogiar o apresentante, falou dos tempos “mais do que nunca difíceis” que a universidade enfrenta. No entanto, apesar das dificuldades, considera deve ambicionar “muito mais do que uma sobrevivência mesquinha e sem horizontes”.
“Momentos como o que estamos a viver nesta sala recordam-nos que essa universidade é possível e que não estamos, na verdade, inapelavelmente condenados ao destino de uma universidade em ruínas”, afirmou.
*Foto em A Bola
1 comentário:
Realmente este homem se julga democrático? Cabeça vaga e ditatorial, sim. Você é um sem vergonha e um dedo duro. Isso é.
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