MARTINHO JÚNIOR, Luanda
1 – Para além da Base Aérea nº 9, os portugueses tinham só na zona norte de Angola o Aeródromo Base nº 3, no Negage e os Aeródromos de Manobra nºs 31 (Maquela do Zombo), 32 (Toto) e 33 (Malange), bem como o Aeródromo de Recurso de Santa Eulália, quer dizer, para além das unidades de quadrícula, os portugueses bombardeavam a partir duma malha apertada de pistas e faziam todo o tipo de intervenções com forças especiais, inclusive por via de helicópteros fornecidos pela NATO.
Eis um fragmento de algumas operações realizadas no norte, já em 1973, pela 2042ª Companhia de Comandos (http://2042comandos.com/operacoes.html):
“No controlo militar de Sassa a norte da povoação do Caxito, um grupo de combate separou-se da companhia e dirigiu-se para o Zala, pela estrada (picada) de Nanbuangongo.
A companhia, continuou a sua viagem até ao Toto, onde chegou no dia dois de Junho.
Nesta unidade militar já se encontravam a 33ª e a 37ª C.C.
Depois do breafing realizado na berliet de operações, entre o comandante da operação, o comandante da companhia e os comandantes de grupo, iniciou-se a preparação e saída dos grupos de combate, para a pequena base da força aérea situada a cerca de cinco quilómetros da sede do batalhão de infantaria do Toto.
Permaneceram no acampamento, em apoio aos grupos em actividade operacional, o grupo de alerta e as duas equipas de defesa imediata.
Desta base aérea, transportados em helicópteros Puma e Allouette III, quatro dos cinco grupos que viajaram para o Toto, foram largados na área e nas posições destinadas aos grupos da 2042ª C.C. no âmbito da operação Bolada I/H.
As acções realizadas nesta operação, constituíram as primeiras em zonas declaradas de guerrilha.
As posições de largada dos grupos, salvo as que correspondiam a golpes de mão sobre objectivos bem localizados, situavam-se normalmente muito longe do objectivo da operação.
Na sua progressão e para evitar confrontos em desvantagem, a direcção do grupo de comandos era várias vezes alterada e a marcha várias vezes interrompida para acções de despiste, reconhecimento e emboscada. Sabia-se que muito dificilmente e por muito pouco tempo, os nossos inimigos perderiam a nossa posição, mesmo que o grupo se encontrasse completamente parado e escondido no matagal.
Na mesma zona, outros grupos da 2042ª C.C. ou de outras companhias, desenvolviam as suas acções o que constituía uma vantagem em caso de necessidade mas também um risco em caso de aproximação involuntária.
Depois de concluídas as operações com a duração de três noites, os grupos lançados do Toto e do Zala, foram recolhidos por helicópteros para o aquartelamento do Toto.
Concluída a operação Bolada I/H, com duas ou três acções por grupo, a companhia regressou a Luanda, em meios auto, no dia dezanove de Junho de mil novecentos e setenta e três, sem baixas e com algum material capturado ao inimigo: uma pistola-metralhadora STEN MKII e uma espingarda Mauser.
(…)
Com a operação Lufada I/H terminou o tempo de intervenções da 2042ª C.C. na ZMN.
Cada uma das operações realizadas no norte de Angola teve a duração de vinte dias, doze dos quais foram passados em zonas de combate, em acções de anti-guerrilha cujo objectivo principal era a eliminação física do inimigo e o enfraquecimento ou eliminação das suas estruturas de apoio.
A responsabilidade e coordenação das várias acções realizadas nestas três operações pertenceram ao centro ou sala de operações, instalada numa viatura berliet, equipada para funcionar como tal.
Nesta sala de operações, onde trabalhavam elementos das companhias envolvidas, todos os pormenores dos objectivos a atingir estavam registados, em mapas geográficos e de acordo com dados conhecidos.
A actualização dos registos era imediata face às informações recebidas dos grupos, via rádio, desde a indicação das suas posições, dos contactos registados, dos objectivos cumpridos, das movimentações do inimigo, dos resultados obtidos, etc.
Os oficiais de operações decidiam, face às informações recebidas dos vários organismos militares e da situação no terreno transmitida pelos grupos em acções, pela manutenção ou alteração dos objectivos traçados”…
Depois do norte, essa Companhia de Comandos foi colocada no leste, tendo realizado a maior parte das acções contra a guerrilha do MPLA.
Dessas acções, recolhemos algumas fracções dos registos:
(…)
… “A partir de Nhengo, povoação a poucos quilómetros a sul de Gago Coutinho no caminho para Ninda, um grupo foi lançado de helicóptero, para uma acção de apoio a forças da 2041ª C.C. cuja missão era atacar um acampamento militar, onde estaria um grupo de guerrilheiros equipados com armas ligeiras e um canhão sem recuo de 75mm.
A companhia continuou a viagem, agora por picada até Ninda, onde chegou ao princípio da noite.
Ao longo da pequena pista de aviação onde se encontravam estacionados os meios aéreos de transporte e apoio, dois apoio, dois aviões de combate T6 e sete Allouetts III da FAP, foram montadas as tendas de campanha para abrigar os militares operacionais e da formação”.
Os grupos da 2041ª e da 2042ª C.C. iniciaram as acções da operação Coimbra 300 E/H, a partir de Ninda, no dia trinta de Setembro de mil novecentos e setenta e três, desenvolvendo acções junto à fronteira com a Zâmbia e a sul de Ninda.
Permaneceram no acampamento, em apoio aos grupos em actividade operacional, o grupo de alerta e as duas equipas de defesa imediata.
Nem os grupos da 2041ª nem os da 2042ª C.C. envolvidos nesta operação, tiveram contactos de relevo com o inimigo.
No entanto e num golpe de mão bem sucedido, um dos grupos da companhia lançado sobre local de actividade inimiga, detectado pela esquadrilha de helicópteros da Força Aérea Sul Africana, no regresso de uma viagem de largada, capturou sem resistência uma série de armamento entre os quais o já referido canhão sem recuo de 75mm”…
(…)
“O conhecimento da existência de um grupo numeroso de guerrilheiros do MPLA, que se movimentavam nas zonas do Luvuei, Lutembo e Gago Coutinho, desencadeou a operação Barbado E/H, sob o comando do capitão Ovídio Rodrigues, do CIC, que se deslocou por via aérea e se juntou à 2042ª C.C. em Gago Coutinho.
Os primeiros quatro grupos a serem lançados no terreno, saíram do Luso na manhã do dia catorze de Novembro em viaturas auto para Gago Coutinho onde chegaram de tarde.
No dia quinze de Novembro foram lançados de acordo com o plano da operação, três grupos nas zonas previstas, tendo ficado no quartel de Gago Coutinho o grupo de alerta e as equipas de defesa imediata.
Os outros dois grupos, o 1º e o 3º, saíram do Luso na manhã do dia quinze rumo a Gago Coutinho.
Na estrada de asfalto que ligava o Luso a Gago Coutinho, próximo da povoação do Luvuei, um numeroso grupo de guerrilheiros do MPLA realizou uma das mais bem sucedidas emboscadas contra as nossas tropas, não só pelo número elevado de mortos e feridos que nos infligiu, mas também pelos estragos causados sobre o material.
A posição mais que passiva do comandante da esquadrilha de helicópteros bem como a reacção estranha de um dos dois pilotos de T6 que levantaram do Luso, fez dos operacionais destes dois grupos combatentes heróicos.
Contra um inimigo em muito maior número e detentor da surpresa, bem posicionado, com um potencial de fogo elevadíssimo e que dispôs sempre do controlo da situação, foram capazes de empreender a reacção à emboscada de modo a alterar os seus propósitos, repelindo-o ao fim de quase uma hora de combate.
Quando o grupo de alerta e os operacionais pára-quedistas chegaram ao local em viaturas auto, já o inimigo tinha retirado com um morto confirmado e um elevado número de feridos.
Os nossos cinco mortos e quinze feridos graves foram evacuados para Gago Coutinho e daqui para o Luso.
Apesar da heróica reacção, teremos vivido o dia mais amargo de toda a história dos Comandos Portugueses.
Esta emboscada, fez abortar a operação Barbado E/H, tendo os grupos que se encontravam no mato sido recuperados de imediato para Gago Coutinho.
A companhia saiu nessa noite de Gago Coutinho, pernoitou na unidade militar do Luvuei e seguiu para o Luso no dia dezasseis de Outubro, com pesadas baixas e poucos resultados.
Considerando as baixas sofridas nesta emboscada e a falta de comandante de companhia, alguns responsáveis militares colocaram a hipótese da sua dissolução e distribuição por outras companhias.
A nomeação para comandante da companhia, do tenente comando Isaías Pires, no dia sete de Dezembro de mil novecentos e setenta e três, fez cair a ideia de dissolução”…
2 – No 50º aniversário do início da Guerra Colonial, não basta recordar os episódios das Forças Armadas Portuguesas ao longo de treze anos de guerra, lembrando com isso o emprego do material da NATO, em especial os meios aéreos e as forças especiais.
Agora que a NATO declarou ter finalizado as “acções de exclusão aérea” que “por milagre” se transformaram em bombardeamentos sistemáticos na Líbia, interessa também averiguar qual o ponto de vista militar dos portugueses, que continuam a ser membros activos da NATO em áreas distantes como por exemplo o Afeganistão, ou a costa da Somália.
O argumento militar português nos relacionamentos ditos “bilaterais” com os PALOP reaproveita e mascara os conceitos da NATO, assim como os conceitos de que se serve a NATO, nas suas mais amplas geo estratégias e nos enquadramentos políticos!
É evidente que é agora tudo isso que “inocentemente”, em nome do reforço das soberanias nacionais dos PALOP, está a ser digerido e aplicado!...
PAZ SIM, NATO NÃO!
Fotografia: Os Comandos portugueses utilizavam os Allouette III adquiridos à França, um meio aéreo que influenciou na organização de base para as equipas operacionais: 5 homens.
Hoje a NATO utiliza helicópteros de maior capacidade, pelo que as equipas de Comandos são constituídas por mais elementos.
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