MARTINHO JÚNIOR, Luanda
1 – A doutrina da NATO está presente nos relacionamentos bilaterais entre Portugal e os países africanos, quantas e quantas vezes a coberto do “mercado” e do modelo que a hegemonia gerou para a globalização que é interesse e conveniência dos ricos para com os outros, com toda a influência nos relacionamentos norte-sul.
Portugal tem servido a NATO, tirando partido da amplitude sócio-cultural e o facto de continuar a ser um veículo de transmissão desses interesses e conveniências, é determinante para o seu papel em relação aos PALOP e CPLP.
Portugal é de facto uma “potência intermediária”, utilizada para ser veículo das mensagens apropriadas ao sistema a que se encontra preso, que começa na conceptualização com as referências ao “mercado” e acaba depois em questões de especialidade, quer dos serviços de inteligência, quer das questões militares.
Vários exemplos podem ser recolhidos da Revista Militar; deles extraímos um dos últimos, um artigo do Coronel de Infantaria Nuno Miguel Pascoal Dias Pereira da Silva, A relevância do papel de Portugal em Organizações Internacionais – A relevância de Portugal na NATO e na EU” (http://www.revistamilitar.pt/modules/articles/article.php?id=607).
Note-se como as estratégias são colocadas, por vezes da forma mais capciosa:
(…)
“O Conceito Estratégico de Defesa Nacional, em vigor, assume pela primeira vez explicitamente que Portugal não tem capacidades para se defender sozinho, necessitando de alianças para poder defender‑se contra uma eventual agressão exterior.
Baseado no que acabámos de referir podemos afirmar que, actualmente, Portugal conta com a NATO para a sua eventual defesa, organização a que pertence desde a sua fundação acerca de sessenta anos, e que concomitantemente está a trabalhar no aprofundamento da Política Comum de Segurança e Defesa no âmbito da União Europeia.
Em termos políticos e militares, Portugal está profundamente empenhado na cooperação bilateral com os Países de Expressão Portuguesa, bem como se encontra empenhado no aprofundamento da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), participando activamente em exercícios militares conjuntos e na promoção de uma força de paz para ser empregue em África.
Assim, pode‑se concluir que a mais‑valia de Portugal na Europa e no mundo é poder constituir‑se como porta de entrada de relações privilegiadas destes países com a Europa”.
(…)
“A plataforma naval disponibilizada pelos EUA, para ser utilizada pelo “nosso” comando de segundo nível é o navio “Mount Whitney”, tendo sido testada e validada no exercício Strong Resolve.
Nas conclusões do Strong Resolve, a que tivemos acesso, podemos realçar que este tipo de comando, embarcado numa plataforma naval, garante grande flexibilidade permitindo reduzir o tempo de intervenção da NATO em qualquer área do Globo, nas operações designadas por Out of Area.
Como já referimos, várias nações com peso na aliança foram contra este processo de transformação do nosso Comando em comando do Segundo Nível da NATO, tendo no entanto esta opinião sido preterida em prol do Comando sedeado em Oeiras.
Portugal, em nossa opinião, negociou este dossier de uma forma muito hábil tendo conseguido o seu desiderato, fundamentalmente pelo apoio político dado à invasão do Iraque, pela coligação liderada pelos EUA, a que se juntou o facto de estar relativamente próximo do Continente Africano, onde a NATO pretende começar a ter alguma preponderância, o que aliado às relações privilegiadas que Portugal tem com os países do Norte de África e com as suas ex‑colónias, também pesou nesta decisão”.
Torna-se evidente que o entendimento da NATO com o AFRICOM é cada vez mais perfeito, que Portugal é um intermediário ou um facilitador desse entendimento e da sua acção e isso significa um aumento exponencial das capacidades de ingerência da hegemonia em África, com Portugal intimamente associado a essa hegemonia.
O artigo foi publicado a 22 de Outubro de 2011, já as ingerências da NATO na Líbia estavam a entrar na sua fase final.
Portugal não esteve presente no teatro operacional da Líbia, mas foi, por exemplo, importante na tomada de posição do Conselho de Segurança (Resolução 1973, 17 de Março de 2011 – http://www.un.org/News/Press/docs/2011/sc10200.doc.htm#Resolution)...
2 - As elites dos países africanos não estão suficientemente despertas para a “utilidade” de Portugal, sobretudo a partir das visitas de Theresa Whelan, por diversas vezes a Lisboa, imediatamente antes da decisão da criação do AFRICOM, uma delas a 26 de Maio de 2006, para além de experiências tão traumatizantes que advêm do passado, numa profundidade de 50 anos!
Lembro as palavras de Theresa Whelan (http://www.canalmoz.co.mz/component/content/article/1-artigos-2006/9964-%5C):
“Áreas sem governação em Angola e Moçambique, onde são traficados diamantes, armas e drogas cujo comércio ilícito é passível de financiar o terrorismo, estão a preocupar as autoridades norte-americanas, disse a subsecretária da Defesa para os Assuntos Africanos.
Numa conferência em Lisboa sobre A Política dos Estados Unidos em África, Theresa Whelan centrou a sua intervenção nas chamadas áreas sem governação, definidas como terras de ninguém, remotas e opacas por escaparem à capacidade de controlo dos respectivos governos.
De acordo com a responsável pela política de Defesa do Pentágono para a África Subsaariana, que falava no Instituto de Defesa Nacional perante uma audiência maioritariamente formada por altas patentes militares e diplomatas, as áreas sem governação são espaços de eleição para o terrorismo internacional.
Whelan não escondeu que a comunidade internacional está a viver um tempo perigoso nos planos político, económico e militar, cuja imprevisibilidade só tem paralelo histórico com o período entre as duas guerras mundiais.
Segundo Whelan, África não se encontra, neste momento, no centro da agenda norte-americana, embora também não esteja à margem dela, mas o clima internacional pós 11 de Setembro de 2001 faz com que o Pentágono se detenha nas áreas sem governação, com ênfase nos países totalitários.
Para a configuração deste quadro indicou a persistência da crise política, económica e de segurança na África Subsaariana, o grave problema da corrupção, e a debilidade dos Estados para protegerem as suas fronteiriça e fazerem prevalecer o império da lei.
Face a uma maior dificuldade de previsão das situações anómalas, Whelan defendeu o imperativo de formular a tempo medidas preventivas" e, também, o "trabalho em parceria.
A subsecretária norte-americana identificou áreas sem governação na fronteira entre a África do Norte e o Sahel (grande zona desértica que atravessa transversalmente o continente), no Golfo da Guiné, Senegal, Angola, Delta do Níger (Nigéria), norte do Mali, Sudão, Somália, fronteira do Quénia, norte de Moçambique, África do Sul e Canal de Moçambique.
Sendo a maior prioridade do Pentágono a guerra contra o terrorismo e a proliferação de armas de destruição maciça (ADM), com ajudas expressamente destinadas a este objectivo, mas também à segurança marítima, e ao treino militar e educação, Whelan avançou com um conjunto de propostas de solução das quais, a principal, é estimular os governos a assumir as suas responsabilidades.
A concluir, a subsecretária norte-americana deixou para reflexão oito desafios para quem trabalha com África: Estar ciente das diferenças culturais, do fenómeno da corrupção, da falta de cuidados de saúde e da SIDA, do analfabetismo, do mau funcionamento das instituições democráticas e do sistema judicial, além da pobreza generalizada".
A posição de Portugal em relação aos PALOP e à CPLP, ao contrário da propaganda de muitos, é de facto a de um autêntico “cavalo de Tróia” da NATO e do AFRICOM!
PAZ SIM, NATO NÃO!
Foto: Parelha de aviões Fiat-G-91
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