sábado, 19 de novembro de 2011

Por mera formalidade e depois de autorizado, Passos Coelho aceitou falar com Samakuva




ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA*

O presidente da UNITA, que Passos Coelho parece não saber muito bem quem é e o que representa, lamenta desconhecer os termos exactos da cooperação entre Angola e Portugal.

"Nós não temos conhecimento exacto da cooperação de Angola com Portugal. De uma forma geral, temos o nosso governo bastante fechado para o cidadão", disse Isaías Samakuva, que falava à saída de um encontro com o primeiro-ministro português Pedro Passo Coelho.

Isaías Samakuva defendeu, por outro lado, que Angola "não se deve fechar", mas antes abrir-se ao mundo.

"Nós somos a favor que Angola não se feche, que Angola se abra cada vez mais para o mundo e consiga estabelecer acordos de cooperação que beneficiem também Angola, que beneficiem as partes envolvidas. E, neste caso, Angola tem todo o interesse em proteger, em beneficiar os interesses dos angolanos", adiantou.

O encontro de Passos Coelho com Isaías Samakuva, último ponto da agenda da visita oficial que o chefe do governo português efectuou a Angola, realizou-se na unidade hoteleira onde o primeiro-ministro ficou alojado.

O encontro com Isaías Samakuva foi apenas uma formalidade, devidamente autorizada pelo presidente de Angola. Passos Coelho está-se nas tintas para a UNITA, desde logo porque acredita, ou sabe com toda a certeza a partir dos donos do país, que a organização fundada por Jonas Savimbi nunca será poder. É tão simples quanto isso, pelo menos na interpretação dos ideólogos portugueses, chame-se eles Cavaco Silva, Passos Coelho, Paulo Portas, António José Seguro ou Jerónimo de Sousa.

A partir dessa suposta certeza, algo similar à que dava o “líder carismático” da Líbia como eterno, Portugal quer estar de bem, custe o que custar, com o dono de Angola, pouco se importando que José Eduardo dos Santos esteja no poder há 32 anos sem nunca ter sido eleito, ou que 70 por cento da população (sobre)viva na miséria.

Ora, se de um lado da balança estão os interesses económicos, financeiros e outros, e do outro os direitos humanos, a liberdade, a democracia, as regras de um Estado de Direito, Passos Coelho não tem dúvidas em escolher. Desde logo porque, como muitos outros, a vida dos angolanos não conta.

O que conta, mesmo que o regime seja, como é, dos mais corruptos do mundo, é o poder financeiro para ajudar Portugal a emergir do charco em que foi colocado pelos políticos a Alemanha está-se nas tintas para os angolanos. O que quer, como outros, é aumentar os negócios.

Por isso, a democracia não é chamada para as negociações. Passos Coelho, como antes José Sócrates, sabe bem que é mais fácil negociar com um ditador e corromper a sua seita do que, de facto, ter relações com um regime democrático. Portanto… siga a marcha.

Quanto à corrupção, também não é um problema nem para o governo português nem para os seus empresários que, com todo o engenho e arte que se lhes reconhece, até conseguem vender limpa neves para Luanda.

Aliás, a questão da corrupção em Angola é algo que o MPLA aprendeu a praticar com os colonizadores, tornando-se ainda melhor do que eles.

Nesta, como em muitas outras matérias, os angolanos foram bons alunos dos professores portugueses. É claro que, com a evolução natural, até os conseguiram ultrapassar a ponto de hoje serem também donos de grande parte do reino lusitano a norte de Marrocos.

Do ponto de vista teórico, interno e externo, Passos Coelho também diz que a corrupção tem de ser combatida, mas admite (tal como os seus congéneres europeus) que é uma tarefa que leva muito tempo. E leva mesmo. E como se admite que algumas alterações levem mais de 50 anos a dar os primeiros frutos, nada como aproveitar a onda actual e entrar na dança.

Enquanto Angola for o MPLA e o MPLA for Angola, de nada adiantará ter razão. A UNITA sabe-o bem. Aliás, parte dela trocou também a mandioca pela lagosta. E quando assim é...

Dizer a Passos Coelho que o regime é contra todas as formas de luta que ponham em causa o seu reinado, é chover no molhado. Ninguém se preocupa com isso.

Afirmar que os níveis de corrupção existentes em Angola superam tudo o que se passa em África, conforme relatórios de organizações internacionais e nacionais credíveis, é uma verdade que a comunidade internacional reconhece mas sem a qual não sabe viver. Aliás, é mais fácil roubar o Povo em regimes corruptos do que em democracias.

Aliás, basta ver como as grandes empresas, portuguesas e muitas outras, investem forte no clã Eduardo dos Santos como forma de fazerem chorudos negócios.

Foi assim, assim é e assim vai continuar a ser. E o poder do MPLA tem tanta força, para além de cobertura dos seus amigos da Internacional Socialista, que para além de os mortos também votarem nele, há sempre aquela variante que legitima as boas democracias e que respeita ao facto de em alguns círculos eleitorais apareceram mais votos do que votantes.

Enquanto a UNITA não perceber que está a fazer de figurante para legitimar uma democracia inexistente, que está a fazer de porteiro para o regabofe dos ditadores, que está com uma bandeja de prata à procura de comida nos caixotes do lixo dos donos do reino, nunca conseguirá mudar Angola.

Tal como não conseguirá enquanto não explicar como é que, entre outros, alguns dos seus generais (dos que estiveram até ao fim com o Mais Velho) são hoje dos homens mais ricos de Angola.

Mas, talvez mais importante do que tudo, a democracia não será edificada em Angola enquanto, como dizia o Mais Velho, não for a dor que nos faz andar, a angústia que nos faz correr, as lamúrias e as lamentações, que de vários cantos do país nos chegam, que nos fazem trabalhar; não for a razão dos mais fracos contra os mais fortes que nos faz marchar.

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.


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