terça-feira, 15 de novembro de 2011

SJ contesta relatório sobre serviço público e defende jornalistas na RTP e na Lusa





A Direcção do Sindicato dos Jornalistas (SJ) considerou hoje, dia 15 de Novembro, que o relatório do Grupo de Trabalho nomeado pelo ministro dos Assuntos Parlamentares para definir o serviço público pouco mais faz do que coligir opiniões de elementos do GT de apoio à privatização da RTP, mas contém expressões ofensivas para os jornalistas e propostas perigosas para a democracia.

Em comentário àquele documento divulgado hoje, a Direcção do SJ considera inaceitável a alimentação da suspeita de que a RTP e a Lusa são controladas pelo Governo e desafia o grupo a demonstrar as suas afirmações ou a retractar-se publicamente.

O SJ rejeita também o acantonamento da informação dos serviços de rádio e televisão em pequenos noticiários, como pretende o referido grupo, e discorda da extinção da RTP Informação, da submissão da RTP Internacional à tutela dos Negócios Estrangeiros e da extinção da RTP Madeira e da RTP Açores.

O comunicado é do seguinte teor:

Comentário do SJ ao Relatório do Grupo de Trabalho sobre o Serviço Público de Comunicação

Uma peça inútil, ofensiva e perigosa

1. O “Relatório do Grupo de Trabalho para a definição do conceito de serviço público de comunicação social” divulgado ontem confirma a justeza das posições do Sindicato dos Jornalistas sobre a sua criação, o seu objecto e o seu mandato, expressas em comunicado em 17 de Agosto passado, no qual se afirmava o receio de uma simulação de consulta para “legitimar” a intenção do Governo de desmantelar o serviço público e privatizar a RTP e a Lusa.

2. O documento pouco mais é do que uma mera recompilação de opiniões de elementos do chamado “Grupo de Trabalho” dispersas por alguns escritos e declarações, destilando aliás recorrentes preconceitos contra o serviço público e as empresas RTP e Lusa, e dispensando-se de recorrer à consulta de um significativo e representativo conjunto e entidades e personalidades.

3. Assim, o documento fica muito longe de constituir uma reflexão aprofundada e fundamentada sobre os serviços públicos de rádio, televisão e de agência, bem como um elenco de propostas sólidas para o futuro. Teria sido aliás mais prático que o ministro da tutela tivesse mandado elaborar uma súmula do que está publicado.

4. Apesar de o ministro ter já anunciado que o referido texto “servirá de base à definição, pelo Governo, de um conceito de serviço público de comunicação social”, o referido documento não pode ser entendido senão como uma contribuição de um conjunto de pessoas que não pode dispensar um trabalho verdadeiramente aturado de consulta e de discussão. Se o Governo não souber fazê-lo, exige-se que pelo menos o Parlamento o faça.

5. Por aqui ficaríamos se não fosse o conteúdo do documento que chega a ser ofensivo para os responsáveis editoriais e para os jornalistas ao serviço das empresas RTP e Agência Lusa, recorrendo a generalizações inaceitáveis, e perigoso para a democracia, pelo “modelo informativo” alternativo que propugna.

6. Com efeito, quer na “apreciação” sobre a concretização do serviço público, quer nas conclusões, vem o GT sustentar a existência de uma, pelos vistos sistemática, “intervenção ilegítima ou eticamente reprovável dos diferentes poderes na informação da rádio, TV e agência do Estado”.

7. Trata-se de uma afirmação que só seria legítima se o CT apresentasse circunstanciado esclarecimento das situações e dos intervenientes responsáveis pelo alegado comportamento ético reprovável. Mas, como não o apresenta, limita-se a fazer uma suspeita baseada em conjecturas pessoais ou actos ocasionais que servem para lançar, indiscriminadamente e quando convém, o labéu da ignomínia ética sobre os jornalistas que trabalham na RTP e na Lusa.

8. Por isso mesmo, esses jornalistas merecem e exigem uma retractação e um pedido de desculpas públicos por parte dos signatários do documento que não tiveram pejo de atentar contra o seu bom nome profissional, sob pena de se verem compelidos a recorrer a outras instâncias para verem a ofensa reparada. O SJ disponibiliza desde já o patrocínio judicial aos seus associados.

9. Para contornar a alegada “intervenção ilegítima”, o referido grupo não propõe mecanismos que reforcem as garantias de independência da RTP e Lusa, antes “propõe que os conteúdos noticiosos do operador de serviço público e televisão sejam concentrados em noticiários curtos, sejam limitados ao essencial e recuperem o carácter verdadeiramente informativo”, ao mesmo tempo que incensa o programa do Governo de desmantelamento do serviço público, reduzindo canais (um só canal em sinal aberto) e propõe a extinção da RTP Informação, alegando que “os canais privados garantem amplamente serviços de informação suficientes”.

10. Este confinamento das obrigações de serviço público em matéria de informação não só é absurdo como é completamente inaceitável: o serviço público pode e deve manter e aprofundar desenvolvidos serviços de programas informativos (noticiosos, de debate e entrevista, de reportagem, etc.), verdadeiramente pluralistas, contribuindo para dar aos cidadãos referenciais de ponderação sobre a vida do país e do mundo, os problemas da sociedade, da economia, da cultura, da ciência.

11. De facto, acantonar a informação do serviço público em “noticiários curtos” e “limitados ao essencial” é mesmo uma ideia extraordinariamente perigosa para a democracia, convertendo, isso sim, o departamento de informação do operador público em repartição de propaganda ou pelo menos de simplificação, senão mesmo de silenciamento – o que seria uma forma encapotada de censura – de realidades incómodas para o poder.

12. O facto de existirem – e bem – ofertas privadas de canais eminentemente informativos não pode dispensar a intervenção do operador de serviço público nesta vertente, nem a discussão pode resumir-se à ”concorrência” entre eles: além das obrigações de serviço público que um canal dedicado de informação também cumpre, é muito importante a moderação que resulta da coexistência de todos eles.

13. Quanto ao serviço Internacional da RTP, o SJ repudia a perigosa e inaceitável proposta do GT de colocação da orientação estratégica deste canal na alçada do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que definiria os respectivos “objectivos estratégicos” e possuiria “funcionalidade adequada” com “a incumbência principal de definição, coordenação e acompanhamento de execução do contrato-programa”. Por outras palavras: a RTP Internacional seria nada menos que a antena do MNE, numa espécie de reedição do SNI do tempo do fascismo!

14. Ainda em relação à rádio e à televisão, o relatório propõe a liquidação sumária de canais de grande importância para os cidadãos, como são a RTP Memória, a RTP Açores e a RTP Madeira, limitando-se a decretar, quanto às duas últimas, que “a sua missão histórica está terminada”.

15. O SJ pensa o contrário: a RTP Açores e a RTP Madeira estão muito longe de esgotar a sua missão de canais regionais que devem reflectir as respectivas realidades, na sua diversidade até geográfica, dando voz e espaço às suas populações e instituições, e contribuindo para enriquecer as emissões nacionais e aprofundar a coesão nacional.

16. Em relação à Agência Lusa, e além da ofensa acima referida, o grupo de trabalho envereda por considerações sumárias sobre “a confusão entre missões jornalísticas e de política externa”, que não demonstra, para se limitar a propor que o seu controlo passe para os accionistas privados, e sem ter em conta que uma tal “solução” poderia representar, entre outros aspectos gravosos, uma “sentença de morte” para a generalidade da imprensa regional.

17. A proposta de terminar com o contrato programa da Lusa com o Estado significaria o fim da missão de serviço público de informação que cabe à Agência e implicaria a curto prazo o despedimento da maioria dos seus trabalhadores e a curto/médio prazo o seu encerramento

18. Finalmente, o SJ regista a atabalhoada e mal sustentada ofensiva contra a regulação, propondo o relatório a extinção da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), o que é susceptível de levar a pensar se tal medida não é sugerida apenas com base em casos tidos por mal resolvidos.

Lisboa, 15 de Novembro de 2011

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