DEUTSCHE WELLE
Os números de manifestantes ainda são pequenos e observadores não veem a possibilidade de uma revolução real. Mas os protestos continuam, e até Gorbatchov pede novas eleições na Rússia.
"Se vocês forem cem, vamos derrubá-los a cassetadas. Se vocês forem mil, vamos usar gás lacrimogênio. Se 10 mil pessoas forem às ruas, vamos parar e observar. Mas se vierem 100 mil, nós nos juntaremos a vocês."
Essas palavras quase poéticas são uma citação, colocada como comentário de um vídeo sobre os atuais protestos em Moscou no portal de internet YouTube. Consta que um policial as teria dito após a prisão de um jovem russo.
Por enquanto ainda há mais policiais do que manifestantes nas ruas de Moscou. Segundo dados oficiais, 51 mil agentes de segurança estão nas ruas da capital russa. Eles entraram em confronto com opositores, que desde o início da semana protestam na cidade contra amplas fraudes nas eleições parlamentares.
Somente em Moscou mais de 560 pessoas – entre as quais numerosos oposicionistas – foram presas nas passeatas nesta terça-feira (06/12), além das 300 da véspera, assim como 200 outras em São Petersburgo. Nesta quarta-feira houve mais detenções: 100 manifestantes em São Petersburgo e cerca de 20 em Moscou, afirmou a polícia.
A situação no país levou o ex-presidente soviético Mikhail Gorbatchov a exigir a anulação do pleito e a convocação de novas eleições. "A liderança do país precisa reconhecer que houve inúmeras irregularidades e manipulações e que os resultados divulgados não expressam o desejo dos eleitores", declarou o ex-dirigente à agência de notícias russa Interfax.
No pleito de 4 de dezembro, o partido situacionista Rússia Unida sofreu sérias perdas, mas ainda assim alcançou a maioria absoluta no Parlamento, de acordo com os números oficiais.
Revolução improvável
As manifestações não são apenas contra, mas também a favor do partido do governo. Milhares de pessoas, sobretudo jovens, reuniram-se numa praça do centro de Moscou para festejar a vitória do Rússia Unida. Elas tocavam tambores, gritando: "Rússia, Putin!" ou "Medvedev, vitória!".
Mesmo três dias após a eleição, o clima permanece tenso na capital russa. Há notícias da prisão de jornalistas. Algumas praças e ruas estão interditadas pela polícia. Ônibus policiais e veículos especiais enfileirados marcam a paisagem no centro moscovita. Agentes das tropas especiais vigiam as saídas das estações de metrô, caminhões militares pesados estacionam ao longo do Hotel Moscou, na Praça da Revolução.
No entanto, segundo observadores, não há por que esperar uma revolução de verdade. Episódios como os ocorridos no inverno de 2004, na vizinha Ucrânia, são antes improváveis em Moscou. Na ocasião, centenas de milhares protestaram pacificamente, na capital Kiev, contra as fraudes na eleição presidencial, impondo um novo pleito. Foi a assim chamada Revolução Laranja.
Tais imagens não se repetiriam na Rússia, afirma Lars Peter Schmidt, diretor do escritório da Fundação Konrad Adenauer em Moscou: "Não conto com isso, no momento. Para tal, o establishment russo é forte e dominante demais".
Maioria silenciosa
Porém Schmidt não exclui a possibilidade de que os protestos se alastrem. "O grau de manipulação, também perceptível nos vídeos da internet, é relativamente grande. E também a geração mais jovem e a classe média recentemente formada nas cidades russas não estão mais satisfeitas com as circunstâncias políticas na Rússia, e encaram o atual sistema político de forma extremamente crítica."
Seu prognóstico é que, caso os protestos se mantenham, o Kremlin "provavelmente tentará conter a coisa através de pressão". O especialista da Fundação Konrad Adenauer em Moscou aponta a existência de um "aparato de segurança realmente muito ativo, na Rússia", que reprimiria os protesto, de forma que "a médio prazo eles voltarão a amainar".
Também Sascha Tamm, do escritório da Fundação Friedrich Naumann na capital russa, é da opinião que o número de manifestantes seja ainda reduzido demais para um país tão grande. Porém ele acrescenta: "Se a coisa se repetir durante vários dias e também se espalhar por outras cidades, então será um problema, pois mostra que o poder e penetração das autoridades não são assim tão fortes quanto se acredita".
De fato, há notícias de protestos contra os resultados das urnas também em outras cidades russas, como Rostov ou Samara. Mas ainda são poucas centenas de pessoas que vão às ruas nas províncias. A grande maioria silenciosa não se junta a elas.
Porém esse estado de coisas mudará se após essas eleições o Kremlin continuar agindo como até então, opina Lars Schmidt. "Se se deseja uma chance de sobreviver, também politicamente, é preciso permitir mais participação para a grande parcela descontente da população russa", comenta o expert da Fundação Adenauer. "Se não, não haverá como sobreviver a médio prazo."
Após as várias centenas de prisões em Moscou e São Petersburgo, a oposição russa declarou, nesta quarta-feira, estar preparada para a resistência continuada contra o resultado oficial da eleição parlamentar. Na internet, duas associações – Contra o Partido dos Traidores e Ladrões e Por Eleições Honestas – conclamam a novas manifestações nesta quarta e no sábado. Para esta última, mais de 15 mil confirmações já foram postadas no Facebook.
Autores: I. Winogradow / R. Goncharenko / A. Valente - Revisão: Alexandre Schossler
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