O PAÍS (ao)
A vacina contra a malária, descoberta em Novembro, serviu com sucesso para criar uma vacina em laboratório contra várias estirpes do tipo de malária mais virulenta de todas, mostra um estudo publicado esta terça-feira na revista Nature Communications.
A malária continua a matar anualmente mais de meio milhão de pessoas, particularmente bebés e crianças na África subsariana. No ano de 2010 houve 655.000 mortes, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), nove em cada dez causadas pelo mais perigoso dos parasitas, o Plasmodium falciparum.
Embora as mortes estejam a diminuir de ano para ano – a OMS refere que em 2009 morreram mais 36.000 indivíduos e em 2000 o número de mortes era 25% superior, atingindo um milhão de pessoas – a comunidade científica continua com dificuldade em encontrar uma vacina eficaz.
Este ano a farmacêutica GlaxoSmithKline apresentou os resultados de uma vacina já testada em humanos que tem uma eficácia que não atinge os 50%. Um passo em frente, mas que teve um certo sabor amargo.
Mas, em Novembro, uma equipa sediada no Instituto do Wellcome Trust Sanger, Cambridge, Reino Unido, descobriu o inesperado. Existe uma proteína que é essencial para a infecção das células sanguíneas pelo parasita e é comum às estirpes do Plasmodium falciparum.
Recapitulando um ciclo que demorou séculos a compreender-se: as várias espécies do plasmódio da malária infectam os humanos (e outros mamíferos) através da picada de mosquitos do género Anopheles. No caso do Plasmodium falciparum, o parasita que entra no corpo vai directamente até ao fígado, reproduzse nas células do órgão, modifica de forma e entra na corrente sanguínea onde, por sua vez, infecta os glóbulos vermelhos. Aqui entra em ciclos repetidos de reprodução e provoca os ataques de febre, mal-estar e dores de cabeça que caracterizam a doença e podem matar.
Pensava-se que a infecção dos glóbulos vermelhos era levada a cabo por várias proteínas na superfície do parasita. Por outro lado, sabia-se que os genes destas proteínas eram muito variáveis de estirpe para estirpe.
Estas duas características tornam o plasmódio muito resistente a vacinas.
Mas a equipa de Julian Rayner e Gavin Wright descobriu a PfRH5FL, uma proteína que aparece na superfície do parasita sem a qual nenhuma estirpe consegue entrar nas células sanguíneas. Ou seja, potencialmente a proteína seria uma óptima candidata para ser alvo de uma vacina que travaria o ciclo da malária no meio, como anteciparam de imediato os cientistas no artigo de Novembro da Nature que relatava a descoberta.
Foi isso que entretanto foi testado e que descrito no artigo agora publicado. Os cientistas conseguiram utilizar esta proteína para criar anticorpos suficientes tanto em ratos como em coelhos que os tornam imunes a várias estirpes de Plasmodium falciparum que foram testadas pela equipa de Adrian Hill e Simon Draper, da Universidade de Oxford. A equipa integra alguns dos cientistas responsáveis pelo artigo de Novembro.
“Criámos uma vacina que confirma a descoberta recente relacionada com a biologia do [receptor] RH5, já que pode gerar nos modelos animais uma resposta imunológica capaz de neutralizar muitas – potencialmente todas – as estirpes do parasita Plasmodium falciparum”, disse Alexander Douglas, em comunicado.
O artigo mostra ainda que esta proteína parece passar despercebida ao sistema imunitário humano, que cria poucos anticorpos contra ela, pelos menos na população queniana que foi observada. A razão deste fenómeno é desconhecida, mas poderá explicar a baixa variabilidade genética do gene da RH5, que não é muito variável dentro das várias estirpes do parasita, tornando a vacina mais eficaz.
O próximo passo é testar se a vacina é segura. Só depois poderá ser testada em humanos, algo que demorará dois a três anos para acontecer.
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