Milton Pinheiro e Sofia Manzano – Brasil de Fato, opinião
As condições subjetivas para uma revolução no país se consolidam
A revolução é o freio de emergência para conter a barbárie” - Walter Benjamim
Estamos vivendo um momento histórico em que o aprofundamento da crise sistêmica, que se configurou em grave crise econômica e social, deixa clara a posição do grande capital financeiro, na tentativa de recuperar suas altas taxas de rentabilidade a partir da relação com os fundos públicos. Na Europa e em outras partes do mundo, integrados na ideologia da colonização global que se encontra em curso, o aparato político da burguesia tenta operar um grande ajuste fiscal. Parte com voracidade sobre o Estado como instrumento para resolver os problemas dos balanços dos bancos privados. E as contradições da luta de classes avançam.
O cenário grego, no fulcro da crise, é desolador. O Banco Central Europeu, pressionado pela Alemanha e França, age dentro da lógica de rapina do imperialismo tentando tirar da Grécia todos os recursos necessários para salvar seus bancos.
Todas as medidas propostas têm levado ao desemprego, à informalidade no mercado de trabalho, à precarização e intensificação do trabalho no setor público, e ao corte de investimentos e custeio na máquina pública de saúde, educação e previdência. Processam um conjunto de privatizações e desenvolvem uma cruel política de demissão em massa no serviço público. Só a última lei aprovada permitiu a demissão de mais de 30 mil trabalhadores públicos.
Trabalhadores nas ruas
A Grécia não tem como sair da crise e a questão da burguesia europeia não é tirá-la da crise, mas sim operar um conjunto de medidas de profundos cortes e ajuste fiscal sem precedentes que sirvam como inspiração ideológica para os próximos acontecimentos. O capitalismo é uma “jaula de ferro”, onde a burguesia naturalizou o mercado e aprisionou os trabalhadores. Criou um mundo sem perspectivas, gerou a perda da liberdade humana através da alienação, do fetiche, da coisificação do homem. É o culto ao dinheiro, é o tempo do mammonismo que está parindo uma outra “civilização”. Portanto, não serão políticas reformistas de corte social-democrata que resgatarão a perspectiva dos trabalhadores na sua luta pela emancipação humana.
A social-democracia grega e o seu partido no governo barlaventeou e capitulou, como é de praxe, à política da burguesia para os períodos de crise. Só que agora a crise é sistêmica e os trabalhadores foram para as ruas em toda a Grécia. A cena política no país é de luta direta das massas. A disputa está em todas as ruas de Atenas, as manifestações são gigantescas, as greves são cada vez maiores. Os trabalhadores, a central sindical Pame e o KKE estão marchando à frente das manifestações juntamente com outros movimentos sociais e forças políticas. Neste momento da história da Grécia, consolidou-se uma hegemonia de classe e o bloco histórico dos trabalhadores está em movimento. O que fazer?
Socorro aos bancos
A Grécia é um país que tem parte significativa de seu Produto Interno Bruto baseado nos serviços – só o turismo, que recebe 17 milhões de pessoas por ano, representa 15% do PIB e emprega 17% da população. O país tem uma população de 11 milhões de pessoas – sendo 5 milhões os trabalhadores – e uma taxa de desemprego que atualmente chegou a 17% da força de trabalho. O segundo setor econômico grego é a marinha mercante, a segunda maior do mundo, atrás do Japão. Os gregos contam com 4 mil navios de carga, que empregam cerca de 250 mil trabalhadores e geram 5% do PIB. O fato pitoresco é que este setor não paga impostos.
Pelos levantamentos de 2010, o PIB grego é de 230 bilhões de euros, concentrado no turismo, transporte marítimo, construção civil, pesca, agricultura e indústria extrativista. Todavia, a perspectiva da dívida pública, pelos levantamentos atuais, atingirá 161% do PIB em 2012.
Cabe esclarecer que, ao contrário do que alardeiam os meios de comunicação burgueses, essa dívida pública, como todas as dívidas dos demais países, foram contraídas em virtude de socorro ao sistema financeiro e ao pagamento de altos juros aos detentores dos títulos públicos. O capital financeiro, detentor desses títulos, está pressionando o governo grego, via a “troica” –, ou seja, os inspetores do Banco Central Europeu, do FMI e da Comissão Europeia –, a encontrar recursos para continuar a sugá-los para a burguesia.
Exigências do capital
Como o Estado grego não tem mais condições de arcar com essas despesas, os representantes do grande capital exigem: privatizações – da rádio estatal, do aeroporto de Atenas e a quebra do monopólio estatal do jogo através da venda das loterias –, ajuste fiscal, aumento da tributação sobre a população, corte de salários e corte dos direitos sociais. Se não bastasse esse brutal pacote, a “troica” exige que todas essas medidas sejam efetuadas e controladas por agências externas.
A partir desses dados, podemos perceber que a economia grega é periférica dentro do sistema capitalista, o que faz da Grécia o elo fraco da corrente. A burguesia que controla a zona do euro não vê mais importância na Grécia, por isso, utiliza-se de ações tão violentas como forma de testar, política e ideologicamente, seu projeto, que é de construção de um novo ciclo do capital para ampliar a sua acumulação. Todavia, as contradições objetivas estão dadas pelo quadro de crise sistêmica que se estabeleceu no processo grego. Mas, o mais importante é percebermos que as condições subjetivas estão em franco processo de consolidação.
Há vários meses os gregos estão nas ruas para impedir os pacotes do governo. Fizeram comícios, lutaram com pedras nas mãos nas barricadas por toda Atenas, cercaram o parlamento, paralisaram os transportes, fecharam o comércio, fizeram greves e tudo isso com uma grande presença de trabalhadores.
Chegou o momento de dar o salto de qualidade na luta política. O bloco histórico dos trabalhadores demonstra força e organização. A questão central é levantar bandeiras que captem as contradições da relação capital-trabalho.
Ensaio
Essas bandeiras devem estar centradas na moratória da dívida, na saída da Grécia da zona do euro, no retorno ao dracma (antiga moeda) – com sua consequente desvalorização cambial –, estatização do turismo, da logística e do sistema financeiro, e a tributação da marinha mercante. Galvanizada por tais bandeiras, a questão imediata é levantar a justa palavra de ordem: todo poder aos trabalhadores em luta.
Os trabalhadores gregos fizeram o seu ensaio geral; os ecos do padrão histórico da revolução proletária ressoam por todas as ruas da Grécia carregados pelos turbilhões humanos nas grandes manifestações. A luta chegou a um impasse. Ou a vanguarda e seu bloco histórico se utilizam da perspectiva clássica e assumem a luta pelo poder, ou essas batalhas que ocorrem hoje em toda a Grécia não encontrarão uma perspectiva real de saída, levando os trabalhadores derrotados de volta para suas casas.
As bandeiras são concretas, está faltando a ação da vanguarda para lançar a palavra de ordem: todo poder aos trabalhadores em luta!
*Milton Pinheiro (mtpinh@uol.com.br) é professor de ciência política da Uneb (Universidade do Estado da Bahia)
*Sofia Manzano (sofi amanzano@hotmail.com) é professora de economia na USJT (Universidade São Judas Tadeu).
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