José Ribeiro – Jornal de Angola, opinião, em A Palavra ao Diretor
A história de Angola é atravessada por guerras, conflitos, violência. No nosso imaginário e no universo das ideias dos angolanos ficou plantada a mentalidade errada de que é a contradição pura e dura e a ruptura que comandam o desenvolvimento.
O mundo das ideias não pára, e o que ontem era válido como verdade pode estar hoje ultrapassado. Verdades absolutas adoptadas no passado são hoje postas em causa ou estão caducas. Toda a vida é feita de mudança e as ideias, mais do que os aspectos materiais, correm e nem sempre conseguimos estudá-las ou segui-las.
O conflito e a violência nunca foram a fonte do desenvolvimento, e a Humanidade passa muito bem sem elas. A realidade dos dias que vivemos em Angola mostra de uma forma muito evidente que a mola real do desenvolvimento, a pedra de toque da felicidade, é o diálogo e o entendimento. As contradições e a crítica pela crítica, sem diálogo e sem o seu sucedâneo natural, o entendimento, conduzem ao desrespeito mútuo e ao conflito. É evidente que as sociedades têm pólos diferentes, e até têm a ganhar se existirem divergências dentro delas, mas nenhum conflito e nenhuma violência é verdadeiramente fonte de progresso.
Os exemplos no campo político são imensos. A independência de Angola foi conquistada quando portugueses e angolanos se entenderam em Alvor. Tinham sido evitadas muitas mortes se o sistema colonial e fascista português tivesse aceitado a via do diálogo como solução. A paz e reconciliação em Angola só foi conseguida quando se assinou o Memorando de Entendimento do Luena. Muitas vidas se tinham poupado se esse entendimento fosse conseguido muito antes, por exemplo, em Lusaka. O caminho para a paz em Cabinda foi aberto com a assinatura do Memorando de Entendimento do Namibe. Depois do regresso à paz, os entendimentos de cooperação com outros países tornaram-se o prato de cada dia, o que vale dizer que de nada serve estar a criar conflitos entre Nações, só interessa que elas se entendam. A mola real impulsionadora do progresso e da reconciliação angolana e da entrada em força de Angola na cena internacional, foi a sua infinita capacidade de entendimento e cooperação com os outros.
Foi quando os angolanos foram capazes de se entender que se calaram as armas e acabaram as agressões. Foi quando as diferenças se agudizavam no conflito que veio a clarificação e o entendimento salvou milhares de vidas humanas, devolveu a milhões de angolanos a paz, deu aos refugiados a possibilidade de regressarem a casa. Ao Estado, abriu o caminho para investir a riqueza nacional nas estradas, na habitação, na saúde, na educação, na cultura e nas famílias, numa dimensão inigualável em qualquer época e em qualquer parte do mundo. À iniciativa privada e ao empreendedorismo, Angola abriu as portas da liberdade de comércio de tal modo que as nossas zungueiras até já descobriram que ganham mais dinheiro se venderem durante a noite e a madrugada pelas ruas de Luanda.
Em democracia, força catalizadora do diálogo no tecido social, temos, antes de tudo, que fazer um esforço para compreender e respeitar os outros, para aceitá-los e para reconhecermos neles uma extensão de nós próprios, em vez de os vermos apenas como alvos preferidos da nossa crítica. Mais do que o diálogo, muito mais, o que arrancou Angola dos escombros da guerra nos últimos dez anos foi verdadeiramente o entendimento. Foi a compreensão fraterna das deficiências e insuficiências dos outros. Foi o braço estendido a quem só via morte e destruição à sua frente. Foi abraçar quem ofendeu e agrediu.
É este país do entendimento que o secretário-geral das Nações Unidas Ban Ki-moon vai encontrar quando chegar hoje a Angola. Um país pacificado e reconciliado e que fez o seu “Plano Marshall”. Um país que acabou com a fome, que afectava em 2002 quatro milhões de seres humanos. Um país democrático com poderes legitimados pelo voto popular que garante para o terceiro trimestre deste ano as mais justas e transparentes eleições de sempre. Um país com o poder judicial independente e com a Justiça a estender-se aos municípios. Um país com uma imprensa pluralista e livre – apesar de não ter contado nunca com as ajudas da ONU – e uma sociedade civil construtiva emergente. Um país que preside de maneira brilhante à Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) e à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Este é o país do entendimento que serve de exemplo ao mundo inteiro. O entendimento é o caminho da paz, da reconciliação e do desenvolvimento. A mão pura que se estendeu à mão armada e que levou ao Entendimento do Luena dá a experiência de Angola e da África Austral, para que ninguém mais pense nos dias de guerra, morte e destruição.
Mas há hoje no nosso planeta quem teimosamente se afaste do diálogo e do entendimento e aposte abertamente na violência e desenterre o machado doloroso do conflito e da guerra. A esses, a democracia angolana, que é filha do entendimento e está cada vez mais forte, só tem para lhes oferecer as suas pombas brancas.
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1 comentário:
A AUSÊNCIA DE TIROS NÃO É A PAZ, É PRECISO LEMBRÁ-LO E A PAZ NÃO É APENAS UMA OBRA DE ENGENHARIA, A UTILIZAÇÃO PROLÍFERA DO CIMENTO E DO ALCATRÃO, EDIFICANDO O PAÍS QUE HISTORICAMENTE NUNCA O HAVIA EXPERIMENTADO.
A PAZ, PARA O MOVIMENTO DE LIBERTAÇÃO, É O MAIOR DOS OBJECTIVOS E ELA CONSTRÓI-SE COM O HOMEM E PARA O HOMEM, NUM ESFORÇO CONTÍNUO, GERAÇÃO APÓS GERAÇÃO.
O MPLA COMPROMETEU-SE EM CONSTRUÍ-LA, LUTANDO CONTRA O SUBDESENVOLVIMENTO, AS DESIGUALDADES, A GUERRA, A FOME, AS DOENÇAS...
POR ISSO É PRECISO NÃO SÓ LEMBRAR, MAS ASSUMIR:
PAZ É EQUILÍBRIO E ENTENDIMENTO, PAZ É SOCIALISMO, É DEMOCRACIA CADA VEZ MAIS PARTICIPATIVA E NÃO É COM OS IMPACTOS NEO LIBERAIS DUM CAPITALISMO SELVAGEM, NEM COM DEMOCRACIAS REPRESENTATIVAS DO GÉNERO DAS QUE SÃO IMPINGIDAS A TODO O MUNDO QUE ALGUMA VEZ SE VAI CHEGAR À JUSTIÇA SOCIAL, MESMO QUE SE PROMOVAM MÚLTIPLAS IGREJAS, ONGS, GRUPOS DE DIREITOS HUMANOS E... AS CONVICÇÕES DE CONVENIÊNCIA!
Martinho Júnior
Luanda.
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