João Silvestre Alvarenga – Liberal (cv), opinião, em Colunistas
Em Cabo Verde, a desigualdade de género constitui-se numa das características estruturantes das relações interpessoais e sociais, historicamente. Foi assim, durante todo o período colonial e, não obstante, a independência nacional e a democratização do país, persiste, ainda, um quadro de desigualdades baseada no género, estando as mulheres em situação de desvantagem relativamente aos homens.
Resultados de um estudo realizado em Janeiro do corrente ano aferindo algumas condições de vida dos moradores da cidade da Praia com 18 ou mais anos de idade mostram que: (I) no capítulo da educação, a) as mulheres estão em maioria no grupo dos 9% de analfabetos; b) continuam maioritários entre os que estudam ou têm o ensino primário ou secundário completo; c) porém, estão em minoria entre os que estudam ou já concluíram o ensino superior; (II) quanto ao emprego, a) as mulheres são maioritárias na lista das pessoas que declararam estarem desempregadas e, b) estão em minoria entre as pessoas empregadas; (III) no item renda, a) são maioritárias no grupo que aufere até 15.000,00 (ou não tem renda), ou seja, entre os mais pobres; b) nas demais faixas de renda acima dos 15.000,00, elas são minoritárias e com uma diferença expressiva média de 20% em favor dos homens. As mulheres estão em maior proporção no grupo das pessoas que recebem menos e no grupo das pessoas “remediadas” e “na jeito”, elas estão em proporção menor do que a proporção dos homens.
Existem desigualdades no interior do grupo das mulheres relativamente aos três itens mencionados bem como existem mulheres bem “situadas” em termos educacionais, de emprego e de renda que superam vários homens. Entretanto, essa não é a regra, é apenas excepção. A grande massa das mulheres vive numa situação de desvantagem relativamente aos homens nesses indicadores apontados de condições de vida.
Quando se dispõe os dados colhidos e organizados numa perspectiva longitudinal, observando o comportamento de três gerações diferentes em matéria de educação, constata-se que ocorre uma mudança clara e notável em termos dos padrões de desigualdade de género entre as gerações: 1º) na geração com 61 anos ou mais ocorre a desigualdade de género em toda a linha, em todos os níveis educacionais, favoráveis aos homens. No grupo dos analfabetos, as mulheres estão em maioria e, nos demais grupos alfabetizados do primário ao ensino superior, os homens dominam; 2º) na geração com 31 a 36 anos, observa-se uma quase “paridade” em todos os níveis educacionais para os dois géneros, com excepção no primeiro nível, analfabetos, em que ocorre uma inversão, agora, favorável às mulheres. Nessa faixa etária (31 a 36 anos), no grupo dos analfabetos, os homens estão proporcionalmente em maioria relativamente às mulheres. Trata-se de uma mudança assinalável, visto que 30 anos antes a situação estava invertida; finalmente, 3º) na geração com 18 a 24 anos, ocorre uma verdadeira revolução educacional, na medida em que nesse grupo as mulheres passam a liderar, pela primeira vez, os dois principais níveis de ensino, o secundário e o nível superior, em maior proporção do que os homens.
Quanto à renda, a tendência também é pela diminuição das desigualdades de renda baseadas no género entre as gerações, porém, as desigualdades intra-grupos aumentaram tanto no interior do grupo das mulheres quanto dentro do grupo dos homens.
Conclui-se, portanto, que a melhoria dos indicadores sociais relativos à equidade de género verificados ao longo do tempo é uma conquista relevante que precisa ser reconhecida e preservada. Porém, os desajustes, ou melhor, a acentuação de desequilíbrios em alguns domínios observados carecem de serem melhor conhecidos para que se possa evitar “deitar fora a água do banho com a criança juntas”.
JOÃO SILVESTRE ALVARENGA - joaostav@hotmail.com
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