quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Requerimento potestativo do PCP obriga Passos a responder na AR sobre as “secretas”




Governo desafia PCP a questionar Passos sobre as "secretas" no debate quinzenal

Carlos Santos - RTP

É a remeter todas as questões para o debate quinzenal desta semana que o Governo reage ao requerimento potestativo do PCP para que Pedro Passos Coelho dê explicações sobre o funcionamento dos serviços secretos na comissão de Assuntos Constitucionais. O agendamento, frisam os comunistas, justifica-se por “factos da maior gravidade” e não pode ser recusado. Em entrevista à Antena 1, o ministro dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, critica a iniciativa e afirma que “todas as matérias públicas” devem ser abordadas “sem circo”.

O requerimento do PCP para a audição do primeiro-ministro na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decorre ao abrigo do artigo 104.º do Regimento da Assembleia da República, segundo o qual “cada grupo parlamentar pode, em cada sessão legislativa, requerer potestativamente a presença de membros do Governo”.

Ao anunciar a iniciativa, na tarde de quarta-feira, a bancada comunista sublinhou que o pedido não pode ser rejeitado. E acrescentou que um depoimento por escrito “não resolve o problema, porque não permite o contraditório”.

A primeira reação do Governo partiu do ministro dos Assuntos Parlamentares. Em entrevista à editora de Política da Antena 1, Maria Flor Pedroso, Miguel Relvas remeteu os comunistas para o debate quinzenal.

“O primeiro-ministro vai ao Parlamento de 15 em 15 dias, que é o que está regimentalmente definido e cumpre escrupulosamente, como é sua obrigação. E lá estará, sexta-feira, para responder às questões dos grupos parlamentares e dos senhores deputados que entendam que o possam fazer”, devolve o governante.

Crítico da decisão do PCP, Relvas afirmou ainda que “todas as matérias públicas devem ser tratadas com elevado sentido de responsabilidade e sem circo”, acrescentando que questões como a do funcionamento dos serviços secretos devem ser tratadas com “cuidado, sentido de Estado e elevação”.

“É nesse plano que o Governo e a maioria que o suporta se colocam”, rematou.

"Factos da maior gravidade"

Para o PCP, contudo, estão em causa “factos da maior gravidade” que “põem em causa a idoneidade” dos serviços informações e “o seu funcionamento”. E o primeiro-ministro, sustentava ontem o deputado comunista António Filipe, é “o único membro do Governo que está em condições para responder a estas questões e prestar esclarecimentos à Assembleia da República”.

O PCP considera que há “claros indícios de promiscuidade” nas notícias que revelaram que Jorge Silva Carvalho “manteve relações privilegiadas” com o grupo Ongoing quando desempenhava o cargo de diretor do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED). O partido lembra o acesso aos registos de chamadas telefónicas do jornalista Nuno Simas, atual diretor adjunto da agência Lusa, o que “configura um ilícito criminal da maior gravidade”.

“Para mais, nos últimos dias foi noticiado que Jorge Silva Carvalho detinha ainda registos, fichas, sobre milhares de pessoas que levou dos serviços de informações e que usará de forma pessoal ou, pelo menos, ao serviço do grupo privado que entretanto integrou. E que para além disso, mesmo assim, teria sido convidado pelo atual Governo para apresentar propostas de reestruturação dos serviços e, eventualmente, até para os dirigir [como secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa]”, notou, por sua vez, o líder do grupo parlamentar do PCP, Bernardino Soares.

“Fiscalização política”

Ainda segundo Bernardino Soares, o Parlamento “não pode ignorar que, se houve indícios que justificaram a apresentação de processos criminais, se existe na opinião pública uma convicção de que é inegável que os serviços de informações atuam à margem da lei e da Constituição e que também existem situações de promiscuidade com interesses privados, tem de haver uma consequência, tem de haver uma solução para que se possa fazer esta fiscalização política”.

Por outro lado, apontam os comunistas, “a Assembleia da República viu-se impedida de apurar responsabilidades políticas nesta matéria por dificuldades decorrentes do regime do segredo de Estado e também porque o primeiro-ministro se recusou a fornecer à Assembleia da República os elementos relativos a um inquérito que solicitou acerca desta situação”.

A iniciativa já foi reportada pelos deputados comunistas ao presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais. Esperam agora que o social-democrata Fernando Negrão proceda ao agendamento com “a maior brevidade possível”.

Bernardino Soares assinalou tratar-se de uma situação sem precedentes que obrigou a ponderação, “uma vez que se trata do primeiro-ministro e nunca aconteceu o primeiro-ministro vir a comissões parlamentares”. António Filipe considerou que, “tendo em conta o estatuto constitucional do Parlamento, o primeiro-ministro não deve refugiar-se pura e simplesmente no segredo de Estado sem qualquer fundamentação”.

“Não faz o mínimo sentido”

Numa reação às declarações do ministro dos Assuntos Parlamentares à rádio pública, o deputado do PCP António Filipe refutou a ideia de que as questões relativas às “secretas” possam ser discutidas “no plenário da Assembleia da República”.

“O ministro Miguel Relvas parece não conhecer o Regimento da Assembleia da República, porque de facto existe uma disposição regimental que permite aos grupos parlamentares impor a ida de qualquer membro do Governo a uma comissão”, explicou António Filipe.

“Por outro lado, não faz o mínimo sentido aquilo que o senhor ministro Miguel Relvas sugere, que o primeiro-ministro dê esclarecimentos sobre matéria tão sensível como é a dos serviços de informações no plenário da Assembleia da República”, continuou.

“Entendemos que esta matéria deve ser tratada eventualmente à porta fechada, se o primeiro-ministro assim o entender. Sentido de responsabilidade é tratar uma matéria destas com o melindre que ela tem e isso só numa comissão é que será possível”, retorquiu o parlamentar comunista.

*Título PG


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