... mesmo que não sejam cabo-verdianos
Expresso das Ilhas (cv)
Cabo Verde cede às exigências da UE e aceita princípio da readmissão. Quando o acordo de parceria para a mobilidade for assinado, Cabo Verde ficará obrigado a receber os ilegais apanhados na Europa, mesmo que não sejam cidadãos nacionais. Basta que tenham partido do arquipélago em direcção ao velho continente.
Este era um dos pontos menos consensuais das negociações em curso entre a União Europeia e o Estado cabo-verdiano. Em cima da mesa estavam a questão da readmissão e a facilitação de vistos para todos os cabo-verdianos. O acordo foi alcançado esta terça-feira, depois da reunião que juntou o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros cabo-verdiano, José Luís Rocha, e o chefe da representação da Comissão Europeia (CE) em Cabo Verde, o espanhol Josep Coll. O documento será rubricado nas próximas semanas.
A Parceria para a Mobilidade, integrada na parceira especial, é uma oferta específica e concreta de diálogo e cooperação da UE e dos seus Estados-membros nos domínios da migração legal e da migração e desenvolvimento em troca de uma cooperação maior dos países terceiros nos domínios da luta contra a imigração ilegal e a readmissão.
O secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros cabo-verdiano, José Luís Rocha desvalorizou a questão da readmissão, referindo que o número de ilegais que o país poderá receber depende dos fluxos imigrantes clandestinos. Uma movimentação que ,segundo o governante, não deverá ser de grande relevância.
Por isso mesmo, garantiu que Cabo Verde não terá qualquer centro de acolhimento, estando previsto apenas a criação de uma sala nos quatro aeroportos internacionais do arquipélago, “com condições dignas”, para instalar todos os que cheguem ilegalmente ao país. Não ficou explicado quanto tempo é que essas pessoas permanecerão no local, nem o que acontecerá a seguir, caso os países de origem não os aceitem de volta.
O secretário de Estado preferiu valorizar o acordo sobre os vistos. José Luís Rocha salientou que, inicialmente, Cabo Verde definiu como meta a isenção de vistos para todos os cabo-verdianos, “sendo esse o objectivo final”, embora haja necessidade de, primeiro, testar os novos passaportes electrónicos, através da concessão de autorizações, múltiplas e durante cinco anos, para 10 categorias. Entre elas figuram os detentores de passaportes diplomáticos e de serviço, bem como académicos, empresários, jornalistas e artistas.
O documento está já “tecnicamente pronto”, faltando agora as traduções para as várias línguas utilizadas pelos “27” para que o Conselho de Ministros o aprove definitivamente.
Tratamento diferente para Europa e África
Esta abertura de portas aos ilegais detectados na Europa acontece na mesma altura em que Cabo Verde quer rever protocolo de livre circulação da CEDEAO. Esta é uma das medidas que consta na Estratégia Nacional de Imigração (ENI), um documento onde está prevista também a criação de um Centro de Protecção Civil para receber migrantes em situação ilegal.
O governo considera a possibilidade de negociar cláusulas específicas do Protocolo da CEDEAO sobre a Livre Circulação. A própria Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental abre esta possibilidade quando refere que estados insulares que possam enfrentar dificuldades socioeconómicas poderão receber um “tratamento especial” na aplicação de algumas das disposições do protocolo.
Como a maioria da imigração provém da CPLP e da CEDEAO, Cabo Verde quer aproveitar esta oportunidade legal e política para, depois de negociados os artigos, partir para o estabelecimento de um quadro institucional, considerado necessário, para gerir os fluxos de imigrantes e a sua integração no mercado de trabalho, erradicar as práticas ilegais e a exploração dos imigrantes e, ao mesmo tempo, criar as condições para pôr em prática os direitos fundamentais dos trabalhadores migrantes.
O governo quer também rever o sistema de vistos e estabelecer procedimentos de emissão claros, que passam pela avaliação de diferentes categorias de candidatos, consoante os motivos para a entrada em Cabo Verde.
O mercado de trabalho é outra das preocupações do executivo. Como é referido no documento sobre a ENI, as necessidades da economia nacional, aliada à falta de oportunidades noutros países, provocou um desfasamento entre a oferta e a procura em Cabo Verde, ou seja, há trabalhadores a mais e oportunidades de emprego a menos.
Uma das consequências é a dependência crescente que muitos empregadores têm em relação ao trabalho migrante irregular enquanto fonte de mão-de-obra barata. Por isso mesmo, uma das respostas políticas avançada é a avaliação do mercado laboral para que se estabeleçam critérios para o recrutamento e emprego de mão-de-obra estrangeira através de uma lei especializada. Em cima da mesa está também o estabelecimento de mecanismos para regular o mercado laboral, principalmente o sector informal e o reconhecimento da qualificação dos imigrantes que entram no mercado de trabalho nacional.
Jorge Montezinho, Redacção Praia
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