sábado, 14 de abril de 2012

RAPIDINHAS DO MARTINHO - 73



Martinho Júnior, Luanda

O REMÉDIO ANGOLANO FEZ O DOENTE PADECER AINDA MAIS!

A situação corrente na Guiné Bissau, no que toca aos relacionamentos desse país com Angola, coloca em evidência quanto os “medicamentos” da “farmácia” capitalista e neo liberal, aplicadas em determinadas condições, acabam por agravar a doença dum paciente que é extremamente sensível a esse tipo de terapias de choque e manifestamente contrário às falhas de integração.

Os acordos assinados no âmbito dos relacionamentos bilaterais, abrangeram o que dita as “regras do deus mercado” em época de império: privilegiaram-se os negócios e a tentativa de moldar as frágeis instituições políticas e militares ao figurino típico das regras das “democracias representativas”, esquecendo-se que o homem, em toda a sua complexidade, deveria ter sido antes de tudo o mais o prioritário elemento de todas as atenções antropológicas, sociológicas, psicológicas, históricas, sócio-políticas e institucionais!

Trazer a uma sociedade que tem suas próprias doenças e traumas, assim como uma frágil identidade nacional, com uma hesitante vontade consensual historicamente comprovada em muitas ocasiões e cenários, com manifesta inexperiência em termos de diálogo e com um acentuado deficit de cidadania e participação (a Guiné Bissau é dos últimos na escala dos Índices de Desenvolvimento Humano), negócios financiados por si, mas sobretudo por outros, acompanhados dum efectivo militar “regenerador”, por muito louváveis intenções que hajam, é uma prova de quanto, neste caso Angola, se está a resvalar para caminhos menos avisados e nada amadurecidos, próprios duma globalização que cada vez tem menos a ver com o homem e com a natureza do planeta.

Por outro lado, num momento em que estalam as crises do capitalismo neo liberal por todos os recantos do globo, assumir uma emergência que afinal está a ser catapultada por uma dose excessiva dos mesmos “remédios” que fomentaram essas mesmas crises a partir de “plataformas financeiras” que se julgam “inócuas” como Macau e Hong Kong, é um ingrediente que não serve para África e tende a semear mais desigualdades e injustiças sociais quando os povos, as sociedades e as comunidades estão sobejamente esgotadas pelo subdesenvolvimento crónico a que têm sido historicamente sujeitas!

É evidente que condeno como todos o golpe e as consequências que situações como essa, de forma repetida, têm trazido para a Guiné Bissau!

É evidente que sou daqueles que tenho assumido a necessidade de paz, de diálogo e do aprofundamento da democracia conferindo-lhe mais cidadania, mais participação e menos representatividade!

Precisamente por isso não posso deixar de sublinhar que as terapias correntes, segundo modelos condicionados à tipologia de métodos, manipulações e ingerências do império a que temos assistido em África desde o final da Guerra Fria, são inevitavelmente contraproducentes por que o homem continua a ser sujeito a todo o tipo de choques em função do “mercado” selvagem global, que é necessário antes de mais saber evitar!

Todos os programas bilaterais ao nível do que foi estabelecido entre Angola e a Guiné Bissau, mereciam muito mais que serem dados a conhecer através dos diplomas legais e oficiais: deveriam ser amadurecidos e discutidos por toda a sociedade e particularmente no âmbito das franjas onde os traumas mais subsistem.

Só assim seria possível mobilizar as vontades e trabalhar com sabedoria e paixão o espírito de unidade nacional indispensável para o arranque e a dinamização dos grandes projectos!

Ao não se fazer assim, o empirismo tirou partido do facto de ter havido demasiada dose de segredo (dizem os do mercado, ainda hoje, que “o segredo é a alma do negócio”) e isso, ficou demonstrado, é incompatível com o estado actual da sociedade da Guiné Bissau!

O modelo do relacionamento bilateral formulado entre a Guiné Bissau e Angola, tenha-se a coragem de concluir, não serve e será ainda mais nefasto se continuar a persistir: é imperioso o estudo da situação humana na Guiné Bissau e os seus reflexos em todas as instituições, sobretudo as políticas e as castrenses.

Trazer os impactos das desigualdades e das assimetrias, quando uma sociedade está reconhecidamente tão dividida e historicamente traumatizada, é um “remédio” que levará sempre o doente a ficar ainda mais doente!

Obs: 14 de Abril de 2012, aniversário da morte em combate do heróico Comandante Hoji ya Henda, no quartel de Caripande, leste de Angola.

Foto: Destacamento que compunha a Missang em Bissau.

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