André Catueira, da Agência Lusa
Chimoio, Moçambique, 12 mai (Lusa) - Regina, 13 anos, ralha com a irmã mais nova, impaciente com uma jarra com água para lhe dar banho, antes de a levar à escola, numa manhã de fome, como todas as outras em Gondola, Manica, centro de Moçambique.
"Ela não quer ir a escola porque não comeu à noite. Eu disse-lhe que ia arranjar um lanche mas ela deve estar desconfiada porque sabe que não tenho dinheiro para comprar nada. Mas precisamos nos esforçar para estudar", explica à Lusa Regina Hermenegildo.
Ela e a irmã sobrevivem de venda de garrafas usadas de água mineral, que recolhem nas ruas depois da escola. Além das doações dos vizinhos, com o dinheiro compram comida e cumprem outras necessidades básicas. Elas são órfãs e dos pais herdaram uma minúscula casa, num bairro pobre na vila ferroviária de Gondola.
Estatísticas governamentais apontam que nos últimos dois anos aumentou o número de crianças com certificado de pobreza, na província de Manica. Em 2011, ao todo, existiam 6.910 crianças pobres contra as 4.808 crianças registadas em 2010, com atestado de pobreza concedido pelos governos distritais, para apoio alimentar, além de isenção de pagamento de taxas de ação social escolar.
O apoio governamental inclui leite artificial para bebés menores de 24 meses, cujas mães perderam a vida ou se encontram doentes com indicações médicas para não amamentarem, através da Direção da Mulher e Ação social.
"Eu acolhi algumas crianças que passavam uma situação difícil. Junto com outras mulheres criámos pequenos projetos de cultivo para sustentar as crianças, mas a falta de apoio, sobretudo em semente melhorada, para produção de comida, tem reduzido as nossas forças de apoiar mais crianças", disse Celeste Frank, durante um comício orientado pela governadora de Manica.
A governadora de Manica, Ana Comoana, disse que das atividades realizadas em 2011 pelo governo, muitas ações incidiram na melhoria de condições da população, sobretudo na questão da melhoria dos cuidados de saúde e apoio familiar.
"Em 2011 tínhamos 2.633 mulheres empreendedoras, que nas suas ações apoiam de forma direta crianças órfãs e o governo integrou muitas crianças, em situação difícil, no ensino, além de construir casas para aquelas sem condições de habitação e apoio alimentar para as necessitadas", explicou Ana Comoana, no relatório sobre as atividades governamentais de 2011.
Dados do inquérito aos Orçamentos Familiares, publicado em 2010, uma pesquisa do Instituto Nacional de Estatísticas (INE), ligado ao Ministério de Planificação e Desenvolvimento, mostram que as políticas de luta contra a pobreza estão a falhar em Moçambique.
A miséria agravou-se por todo o pais, sobretudo na região centro, onde a situação é descrita como especialmente dramática. As taxas de pobreza aumentaram de 54,1 por cento em 2002-2003 para 54,7 por cento em 2008-2009, segundo os dados refletidos na terceira avaliação da pobreza.
Segundo as estatísticas governamentais, o aumento da pobreza é descrito como dramático, no que se refere a "pobreza de consumo", na província de Manica, onde a miséria aumentou de 43,6 por cento em 2002-2003 para 55,1 por cento em 2008-2009.
O inquérito do INE incidiu em três principais pilares: a pobreza de consumo, a pobreza não monetária, e a desnutrição, além de outros indicadores como as desigualdades, a taxa de escolarização e o acesso à saúde.
"Aqui quase falta tudo, desde comida a vestuário, mas alguns vizinhos apoiam-nos. Eu sempre encorajo a minha irmã para não deixar de estudar para termos um bom futuro. Eu queria que ela acordasse e encontrasse na mesa tudo com fartura para ir à escola", afirma Regina Hermenegildo, apaixonada por camiões de longo curso, que sonha um dia condizir.
Uma iniciativa da ChildFund Moçambique, uma Organização Não Governamental (ONG), tem criado ligações de apadrinhamento de crianças em Gondola por famílias ou singulares na Europa. Ao todo, existem 839 crianças apadrinhadas, das quais 49 receberam mais de 43.500 meticais (1.175 euros) como apoio financeiro dos padrinhos em 2011.
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