Rui Peralta
Trincheira firme
Assisto no meu dia-a-dia a uma campanha típica de desestabilização contra Angola, levada a cabo nas mais diversas frentes. É natural que as coisas por aí caminhem e que perante a irrelevância que a oposição tem no sistema político da Republica de Angola, os interesses imperialistas e neocolonialistas, que necessitam desesperadamente de tomar posições no continente africano recorram às técnicas típicas (mas sempre inovadoras) de desestabilização. Com isto não me refiro ao direito que a oposição tem de reforçar-se no terreno, o que seria salutar, pois as democracias políticas, por aquilo que representam, devem ser constituídas por oposições fortes e capazes, de forma a que os poderes instituídos sintam que existe uma vigilância e uma atenção á forma como actuam e á forma como desenvolvem as suas actividades. Aliás isso é inerente ao funcionamento democrático. Porque as democracias, são essencialmente grandes centros de negociação. Vou fazer um desvio na conversa para precisar melhor a minha posição na defesa dos valores da Republica de Angola.
O conceito de democracia pressupõe que a sociedade seja composta por sujeitos dotados de livre arbítrio. Para que isso aconteça os sujeitos têm de estar fora da forma mercadoria e em condições de disporem do valor como seu objecto. Mas no capitalismo não podem existir sujeitos autónomos e conscientes, existem apenas sementes fragmentadas desse sujeito. É que o valor não é apenas uma forma de produção. É também uma forma de consciência. Apresenta-se como natural, como um “sempre foi assim” fatal e melancólico como um fado. Tudo o que o sujeito possa querer, fazer, imaginar, implica a forma de mercadoria, de dinheiro, gastos, despesas, custos, de poder, de estado, de direito…O livre arbítrio não escapa a este universo concentracionário do valor. Nas constituições burguesas (que são todas as que existem no mundo actual) não existe vontade do sujeito no exercício real e objectivo dos direitos, liberdades e garantias formulados. Não na realidade objectiva, apenas no subterfugio do conceito formal. Isto porque as leis do valor estão fora do alcance do livre arbítrio dos indivíduos, logo inacessíveis á vontade politica. Na sociedade capitalista a democracia é a sua forma mais completa, onde as relações mercantis e a forma de mercadoria são interiorizadas pelos indivíduos. Estes vivem para trabalhar e ganhar dinheiro. Já não é necessário inculcar estes objectivos á força, pois eles passam a ser naturais, inerentes á condição humana. É na democracia que se realiza o homo-economicos.
Os politicamente correctos põe constantemente em relevo o facto de os grupos económicos, os lobbies, os media, as igrejas, os partidos do leque do poder, o estado e outros, manipularem as eleições e transformarem a democracia em algo oposto ao que está nas Constituições. É claro que as manipulações existem, tal como é evidente que em termos estratégicos as lutas desenvolvidas em torno das cartas constitucionais são de grande importância e fundamentais, mas a democracia é isso mesmo, ou seja, realiza-se no momento em que tudo está submetido a negociações. E por uma razão muito simples. Os sujeitos, para quem a transformação do trabalho em dinheiro é o fundamento indiscutível, a razão da sua existência, decidirão sempre, mesmo apesar do livre arbítrio, da liberdade de opção e de escolha, a favor daquilo que as leis da mercadoria assumam como imperativo do mercado. O discurso do “desmascarar os interesses escondidos”, vale o que vale como discurso. A dinâmica democrática e as lutas dos cidadãos são fundamentais para um mais amplo bem viver e para uma maior liberdade individual e de grupo e reforçam sem dúvida alguma direitos liberdades e garantias, que de outra forma seriam apenas mais formais.
Mas de qualquer das formas não deixam de ser interesses escondidos. Fazem parte da manipulação, agindo muitas vezes como a principal força de dissuasão e o principal fornecedor de mão-de-obra disciplinada, ou de desempregados bem comportados, que creem firmemente nos seus deveres cívicos, mesmo quando estes já foram espezinhados, trucidados e são inúteis ao funcionamento da cadeia de valorização.
Muitas da vezes mistura-se defesa dos interesse com processo de emancipação. Isso é frequente nas movimentações de trabalhadores, por exemplo e no discurso sindicalista. É evidente que os assalariados necessitam de defender os seus interesses, para não serem completamente espezinhados, mas isso não tem nada de emancipador. São apenas uma categoria de vendedores, neste caso de força de trabalho, que têm de competir com outros vendedores. É nisso e apenas nisso que consiste a luta pela defesa dos interesses, obviamente justos, mas sem qualquer outro sentido.
Feita esta introdução, necessária para determinar a minha posição ideológica e não dar azo a mal-entendidos, vou então passar a ser mais concreto sobre algumas questões que foram noticiadas aqui no Pagina Global, que é um espaço de livre arbítrio e de livre informação e no qual sinto um grande prazer em participar. O primeiro refere-se ao papel da TPA. Concordo em quase tudo o que foi aí escrito. E acrescento: o problema da TPA é de ser constituída por lambe-botas e os lambe botas precisam de ser mais papistas que o Papa. O lógico seria de facto a TPA falar de forma séria sobre o assunto, convidando o amplo leque de opiniões da oposição e discutir o assunto como ele foi discutido na sociedade angolana de uma forma geral, que considerou absolutamente normal a decisão do Supremo. Mas isso é tranquilamente visto e discutido pela maioria do povo, porque quem não deve não teme, o que não é o caso da TPA (e de outros órgãos de comunicação nacionais) que necessitam do acto transcendente dos lambedores de botas, porque a consciência não está tranquila. Devem e como devem, temem e ao temer tremem e ao tremer fazem o papel a que estão destinados. Higiénico. Tal como os ditos cidadãos agrupados em qualquer coisa de Paz, Democracia e Segurança…os lambe botas mais arruaceiros, geralmente constituídos por uma escumalha de pequenos ladrãozecos de bairro, mas já chefes de família, que necessitam de expedientes para sobreviverem. Existem para servir os interesses alheios ao Povo Angolano.
O outro artigo, enfim, é lamentável o que descreve e se assim foi é um acto condenável e que urge averiguar e levar a tribunal, para condenar quem o cometeu. Só não entendo, porque também não está descrito, o porquê de terem ido á Lusa. Existem instituições, como a Policia Nacional, ou a DNIC, onde se pode apresentar uma queixa-crime, aliás onde elas devem ser apresentadas. O ir á Lusa só serve mesmo para português ver. Se desconfiam da PN ou da DNIC, vão a um advogado, por exemplo de uma das muitas associações existentes em defesa dos cidadãos e que inclusive contam com prestigiados advogados próximos á oposição.
Por fim a posição assumida pelo Pagina Global. É tão legítima e responsável como outra qualquer e portanto merece da minha parte o maior respeito. É óbvio que discordo dela, em absoluto, pois representa uma posição de hostilidade para com os caminhos traçados pela grande maioria da Nação Angolana. Mas sendo o Pagina Global um espaço de liberdade, logo implica que seja um espaço de confrontação de ideias, projectos e interesses. E que assim continue por muitos e muitos anos, num mundo onde cada vez há menos espaço para respirar. E aqui em Angola, na nossa memória ainda prevalece o espirito heroico da trincheira firme da Revolução em África. Porque essa é a nossa identidade e sem ela não somos nada!
Estamos juntos. Sempre!
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