quarta-feira, 23 de maio de 2012

TELEVISÃO POPULAR DE ANGOLA MANIPULA TELESPECTADORES



Carlos Duarte - Maka Angola

A cobertura da Televisão Pública de Angola (TPA) à decisão do Tribunal Supremo de impugnar a nomeação de Suzana Inglês para o cargo de presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), na quinta, feira, 17, é preocupante. A TPA manifestou claro favorecimento editorial ao MPLA, como é aliás prática recorrente. A três meses da realização das eleições, o MPLA continua a monopolizar o tempo de antena da televisão pública e já está em pré-campanha.

Após a leitura da notícia sobre a decisão judicial, um dos apresentadores do telejornal leu um extenso comunicado do MPLA a respeito e, logo de imediato, a estação televisiva ouviu dois juristas, nomeadamente Inglês Pinto, ex-bastonário da Ordem dos Advogados de Angola (OAA) e Raúl Araújo, professor universitário e colega da Suzana Inglês na CNE.

Ambos tergiversaram sobre a deliberação do Tribunal Supremo mas, de forma grosseira, a TPA manipulou as vagas declarações dos juristas colocando uma legenda temática durante o noticiário anunciando que “juristas rebatem decisão do Supremo”.

De acordo com os dicionários de língua portuguesa, “rebatem” significa, entre outros, desmentem, impugnam, repelem, destroem, reprimem e refreiam. Em circunstância nenhuma, porém, os dois entrevistados da TPA contestaram a decisão do Tribunal Supremo. Na verdade, os juristas não manifestaram qualquer posição sobre a legalidade ou justeza da decisão, limitando-se apenas a reiteirar que, em democracia, as diferenças são resolvidas com recurso aos tribunais, para além de usarem a decisão como evidência do triunfo do Estado de direito e democrático angolano. Também o MPLA aproveitou a oportunidade para, de forma propagandística, afirmar a existência de separação efectiva de poderes em Angola.

Em momento algum a TPA procurou ouvir a UNITA ou o PRS que interpuseram os recursos para a impugnação da nomeação de Suzana Inglês.

Raúl Araújo aproveitou a ocasião para meter a foice em seara alheia ao ter afirmado, nas suas conclusões, que “é que assim que se resolvem questões do género e não com manifestações, embora estas ajudem”. O constitucionalista referia-se à manifestação convocada pela UNITA, para o dia 19 de Maio.

Como jurista, Raúl Araújo sabe muito bem que o direito à manifestação está consagrado na Constituição e é um mecanismo legítimo de recurso dos cidadãos para fazer valer os seus direitos e protestar num Estado de direito e democrático. A apresentadora Ana Lemos retomou as palavras do jurista para encerrar o telejornal distorcendo-as de forma perigosa ao falar em “manifestações violentas”.

Foi a TPA que, a 12 de Março passado, legitimou os actos de violência perpetrados por milícias pró-governamentais contra cidadãos indefesos a 9 e 10 de Março. Essas milícias, inclusive, atacaram a residência do rapper Carbono Casimiro, onde este se encontrava reunido com mais quatro organizadores para a planificação de uma manifestação no dia seguinte, 10 de Março. Atacaram-nos com barras de ferro, causando ferimentos a quatro deles. A TPA concedeu destaque e tempo de antena ao suposto Grupo de Cidadãos Angolanos pela Paz, Segurança e Democracia na República de Angola que reivindicou os ataques. O grupo prometeu mais actos de violência contra manifestantes e opositores, argumentando que assim agia em defesa da “paz, segurança e democracia em Angola.” A TPA ocultou a identidade e o rosto do porta-voz dos atacantes e não concedeu qualquer espaço de antena às vítimas.

Com a cobertura da impugnação de Suzana Inglês, a TPA demonstrou, uma vez mais, ser um veículo de propaganda política dos poderes instituídos.

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