Estratégia do governo parece ser protelar. Alastramento da greve para outros setores sugere que aposta pode ser de alto risco
Laís Bellini – Outras Palavras
Iniciada há cerca de 60 dias, a greve dos professores das universidades federais assumiu repercussões surpreendentes nesta quarta-feira (18/7). Entre 10 mil (segundo a PM) e 30 mil pessoas (para os manifestantes) concentram-se na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, para protestar contra a demora do governo em abrir negociações efetivas. Além da mobilização numerosa, o movimento chamou a atenção por ter se alastrado rapidamente. Agora, 26 setores da administração pública (e 350 mil funcionários) estão parados. Nas universidades, a adesão é quase total: de 59 universidades públicas federais, apenas uma a três (há informações contraditórias) ainda não aderiram.
Centenas de professores ainda estão em Brasília. Eles querem uma reunião com a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, a fim de debater suas três reivindicações básicas (ver texto de Bruna Bernacchio): reajuste salarial, plano nacional de carreira e melhores condições de trabalho, ensino e pesquisa.
A greve começou em 17 de maio, inicialmente em 14 universidades federais. Além de ter se espraiado a quase todas as instituições, abrange 34 dos 38 institutos federais, dos Centros de Educação Tecnológica (Cefets) e o Colégio Federal Pedro II, no Rio de Janeiro. São cerca de 55 mil professores e 600 mil estudantes – estes últimos, ativamente paralisados em cerca de 40 universidades.
O histórico do conflito começa com a grande expansão das universidades federais, nos últimos anos. Só entre 2008 e 2010, o número de estudantes saltou de 653 mil para 850 mil em 2010. O Orçamento do sistema cresceu de R$ 3,9 bilhões para R$ 7,7 bilhões em 2012 no período – mas não foi suficiente, segundo a presidente do Andes (Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior), Marinalva Oliveira.
A expansão das matrículas acabou elevando a carga horária dos docentes e tornando ainda mais precárias as condições de pesquisa, diz a professora. Em consequência, ela acrescenta, muitos recorrem a financiamento privado, o que ameaça sua autonomia e compromete os objetivos de seu trabalho. Além disso, as salas de aula estão lotadas, chegando a reunir 80 alunos. Soma-se falta de laboratórios, restaurantes, creches e professores. Segundo Marinalva, o ANDES defende a expansão das universidades federais – “mas com qualidade”…
Em busca de saídas, governo e sindicato firmaram, em 2011, acordo que visava implantar um Plano Nacional de Carreira até março deste ano. No final de maio, contudo, o MEC anunciou que a medida ficaria para 2013.
A pauta de reivindicações dos professores foi protocolada em fevereiro deste ano. O governo tem optado pela protelação. Só em 12 de junho, marcou a primeira reunião depois do início da greve, pedindo trégua que não foi dada. O encontro, porém, foi adiado e depois suspenso.
Durante a campanha eleitoral, a então candidata Dilma Rousseff frisou que Educação seria uma de suas prioridades – e que isso incluía correção da defasagem salarial dos professores. Hoje, alega dificuldades provocadas pela crise financeira internacional. Marinalva contra-argumenta lembrando que há dinheiro, por exemplo, para as obras da Copa do Mundo. Lembra também que o governo não vê problemas em dar isenção fiscal a empresários. Cita o caso da dívida tributária das universidades particulares, que atingiu R$ 17 bilhões. Uma proposta de renegociação daria a elas o direito de pagar 90% em bolsas de estudos e os 10% restantes, apenas em 15 anos. Quanto às negociações, a presidente do Andes diz: “Temos interesse em encerrar essa greve, mas desde que o governo nos receba, analise nossa proposta”.
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