domingo, 23 de setembro de 2012

Brasil: O MORIBUNDO CRBE

 


Estado do Emigrante – Direto da Redação
 
O Conselho de representantes de emigrantes não deu certo, todo mundo sabe. E por que não deu certo ? Porque o MRE, Ministério das Relações Exteriores, traiu os emigrantes na I Conferência Brasileiros no Mundo, para adotar um formato de política de emigração que lhe garantia uma importante verba como tutor dos emigrantes.
 
Antes de escrever esta coluna, fui ao sítio Brasileiros no Mundo e vi como foi resumido e deturpado o vídeo do final da I Conferência. Quem ouvir o final do vídeo compreenderá também que o objetivo simplista do MRE, em 2008, era o de criar apenas a Conferência anual Brasileiros no Mundo, no qual os emigrantes seriam representados por um pequeno grupo de privilegiados, encarregado de apresentar as reivindicações dos brasileiros do exterior.
 
Essas reivindicações seriam compiladas num documento chamado Ata Consolidada. A seguir, a recém-criada Subsecretaria das Comunidades Brasileiras no Exterior levaria tais demandas à direção do MRE, que, por sua vez, deveria levá-las ao governo. Os diplomatas da época, Oto Maia, Moscardo, Gradilone e o próprio Celso Amorim deviam pensar ser fácil tapear as lideranças emigrantes com esse projeto primário e chinfrim, revelador do nível de consideração em que são tidos os emigrantes pelos diplomatas.
 
Mas armada a ratoeira, o rato não entrou. E aqui começou uma história de conscientização política e revolta, jamais esperada pelo Itamaraty, mas que vem lhe valendo um desprestígio crescente. Os emigrantes não são trouxas e hoje a Subsecretaria SGEB virou um rabo de foguete, que pode custar um péssimo fim de carreira para diplomata. Pode ser também um péssimo começo de carreira.
 
Porque o rato não entrou na ratoeira ? Porque ficou evidente, naquela I Conferência Brasileiros no Mundo, o mínimo e o ridículo oferecido aos emigrantes. A política brasileira de emigração oferecida pelo Itamaraty era de provocar gargalhadas em países com experiência na matéria, como Portugal, Itália e até a França.
 
Diante das migalhas oferecidas, redigimos um abaixo-assinado no qual rejeitávamos como insuficiente a Ata Consolidada e pedíamos uma Comissão de Transição para se criar um órgão institucional emigrante. Houve 135 assinaturas para 170 presentes. Era maioria mais que absoluta. Porém, acabou sendo rejeitada pelo presidente da mesa, Oto Maia, por não haver consenso, como se no Parlamento os projetos fossem aprovados por consenso e não pela maioria.
 
Embora o tal abaixo-assinado tivesse sido discutido e filmado durante 45 minutos, no final da I Conferência Brasileiros no Mundo, acabou sendo ignorado na Ata Consolidada pelo relator da Europa e só foi mencionado diante de nossos protestos. Protestos inúteis, porque na última versão da Ata Consolidada desapareceu por completo, num ato de prestidigitação do Itamaraty, que eu considero como fraude vergonhosa.
 
Por que ? Porque nessa altura era importante a verba do governo para o Itamaraty tutelar os emigrantes. Qualquer tentativa de se desviar essa verba para um órgão institucional emigrante, uma Secretaria dos Emigrantes, independente, se tornou tabú e sacrilégio.
 
Em lugar de uma Comissão de Transição, pedida pela maioria, o Itamaraty ofereceu um Conselho de Representantes, CRBE, mas previamente emasculado, uma espécie de órgão eunuco, sem qualquer autonomia e sob tutela, cujos membros funcionariam como uma espécie de entregadores de café para os diplomatas – voluntários e sem verba nem para viagens fariam o trabalho de campo e entregariam ao seus tutores, bem pagos, que lhes afagariam a cabeça como agradecimento.
 
O CRBE foi eleito por 0,02 % dos emigrantes e houve fraudes. Embora para os emigrantes nada representasse, foi para alguns eleitos a chance de terem um cartão de visita com brasão da República, prestígio e alguns holofotes do show Focus Brasil, financiado também pelo Itamaraty. Entre o mito, engodo e enganação, o CRBE veio se arrastando até aqui.
 
Diante de minhas denúncias, tentaram me expulsar de um cargo de suplente. O tiro saiu pela culatra. Quem acabou saindo foi o autor da proposta de minha expulsão. Ao me titularizar, descobri um CRBE inerte. Embora considerado órgão de interlocução, tinha sido desconectado do Itamaraty. Os diplomatas perceberam que, na tentativa de criarem um conselho dócil e submisso, tinham formatado um órgão inócuo e inútil.
 
Continuamos denunciando esse CRBE cheio de astros apagados, nas nossas conferências em Zurique, Berna, Genebra, Bienne, Boston, Nova Iorque, Newark e nos nossos textos pela mídia alternativa. Mas já não estávamos tão sós como no início. Hoje somos milhares no Facebook e o projeto de uma verdadeira política de emigração circula mesmo entre parlamentares e políticos.
 
Ao mesmo tempo, a presidente Dilma também foi informada do fiasco da política brasileira de emigração. E fechou a torneira das verbas – nem reunião presencial do CRBE e nem Conferência Brasileiros no Mundo, mesmo se isso é exigência de Decreto.
 
Depois de abandonado alguns meses pelo Itamaraty, que rejeita o filho mal formatado, nos chegou, enfim, uma carta do novo diretor da Subsecretaria das Comunidades Brasileiras no Exterior, o embaixador Sérgio França Danese, cuja experiência anterior era parlamentar.
 
Veio em linguagem diplomática, mas quem entende itamaratês, pode ler, segue em anexo. Com a experiência de jornalista, acostumado a ler nas entrelinhas dos discursos e comunicados oficiais, tenho uma péssima informação.
 
Com medo dos protestos e sem verba, o Itamaraty não fará outra Conferência Brasileiros no Mundo. Poderia aproveitar o mês de novembro, mês de eleições no Brasil, para eleger novo CRBE, porém esse conselho, suspenso e em moratória, deverá ser revisto e ter outro formato. Em outras palavras, o Itamaraty decidiu aplicar a eutanásia ativa no CRBE.
 
A opção do embaixador Danese é a de deixar vencer os mandatos dos membros do CRBE. Assim, o Itamaraty poderá imaginar, quem sabe, outra solução menos minimalista para tutelar os emigrantes sem tanta confusão e falta de resultados. Como bom diplomata, em respeito aos antecessores, fala em não abrir mão do patrimônio construído (!).
 
Seria melhor não só ignorar tudo feito até agora, não vejo nenhum patrimônio construído a lamentar, e entregar a nós emigrantes a sequência. Aceitar o fracasso e o erro de se imaginar que um órgão sem verba, sem autonomia, sem independência, de emigrantes tutelados por diplomatas, pudesse funcionar e dar certo.
 
Seria bom se a presidenta tivesse cinco minutos para os emigrantes e, diante do fracasso do CRBE que é também do Itamaraty, criasse uma Comissão de Transição para uma Secretaria dos Emigrantes ou, para ganhar tempo, já criasse a Secretaria dos Emigrantes, mas, é claro, com emigrantes que defendem esse projeto.
 
Rui Martins
 

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