Fernando Santos – Jornal de Notícias, opinião
Em nome do objetivo (mirífico) de salvação nacional, o primeiro--ministro, dispensado de pedir licença, entrou em casa dos portugueses para a todos transmitir péssimas notícias. Nos últimos anos, sempre e quando um primeiro-ministro faz anunciar uma comunicação ao país, o povo senta-se em frente a um televisor para o ouvir, mas tem um comportamento automático, o qual passa por levar a mão ao bolso para segurar a carteira, gesto de todo inglório! A umas palavras de circunstância, destinadas a adocicar a mensagem, segue-se sempre o anúncio de mais e mais austeridade.
A mensagem de Passos Coelho não fugiu ontem à regra: blá-blá-blá, o elogio da reputação de Portugal no exterior e a seguir a revelação de linhas orientadoras gerais para a construção do Orçamento do Estado de 2013 sob um signo: mais captação de dinheiro para os cofres do Estado, retirando-o a quem tem ainda a felicidade de lhe deixarem alguns mesitos do ano para trabalhar para si mesmo.
Como todos os portugueses têm um pouco de médicos, o primeiro- -ministro, embora sem estar equipado com um estetoscópio, deu uma de La Palisse, fazendo o favor de recordar-nos que "não existem curas rápidas". E partiu para um enunciado de retirada de novas e pesadas fatias do já de si pouco rendimento das famílias, alargando-o agora - para aplauso dos defensores de uma equidade falaciosa - também aos trabalhadores do sector privado.
Todos os esforços de engenharia contabilística não são capazes de tapar a dureza dos números finais: os reformados e pensionistas vão continuar a sofrer as agruras provocadas pelos cortes dos subsídios de férias e de Natal; os funcionários públicos, os que tão zelosamente o Tribunal Constitucional achou estarem a ser vítimas de tratamento desigual, permanecerão sem um subsídio, o segundo ser-lhes-á artificialmente reposto e, pior, feitas as contas, serão obrigados a um maior contributo para a Segurança Social. E para os trabalhadores do sector privado que ainda resistem a tanta desgraça junta saiu a fava do bolo: pagarão mais sete pontos percentuais para um esquema de Previdência de um Estado capaz de deitar fora todos e quaisquer direitos adquiridos por quem vive do salário e, por isso, sem garantias de ao menos chegarem à velhice com um cenário de algum rendimento.
O que resta de esperança após um plano destes?
Está bem, o Governo desonera em cerca de seis pontos percentuais a Taxa Social Única das empresas, convencido (ideologicamente) de que um tal alívio permitirá mais fácil financiamento, mais produção e, concomitantemente, contratação de parte do contingente de desempregados no país. Da intenção à prática a distância é enorme e não se percebe como de bolsos vazios vão os portugueses contribuir para o consumo e um não aprofundar da recessão económica.
Deixemo-nos de sofismas e de demagogias. O cenário não é negro, é negríssimo. Tanto mais quanto - preparemo-nos! - as decisões draconianas não vão ficar por aqui.
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