O dr. Cavaco falou e disse. Disse que a troika falhara, no rude empreendimento da austeridade, origem de todos os nossos infortúnios. Os partidos de Esquerda tinham avisado dos perigos da proposta; porém, economistas de todo o quilate haviam-na aplaudido com fervor. O próprio dr. Cavaco era seu panegirista. Repetia, cheio de enlevo, que o Governo rumava cerro. E Passos Coelho, rubro de entusiasmo, decidiu ir mais além das exigências dos burocratas. Afinal, o plano de austeridade não cabia, por inteiro, àqueles senhores. O Governo procedera a uma espécie de incorporação dos seus próprios desígnios ideológicos e arrastara-nos para esta triste situação.
A combinação do embuste com a mais funesta manipulação dos factos tem criado novas situações de incerteza. A democracia de Pedro Passos Coelho provoca reservas e desconfianças surpreendentes. O desregulamento das regras e a liquidação dos princípios republicanos consentem todas as velhacarias. Inclusive a reprodução dos dispositivos da aldrabice. O descaramento com que o primeiro-ministro mente já deixou de provocar assombro: suscita repugnância. Para limitar as vias de acesso de outros ao poder, ele é capaz de nos dizer que tudo caminha pelo melhor. A impostura fere muitos milhares de portugueses, e indigna-os porque os humilha e castiga.
Nesta altura, o dr. Cavaco tinha a obrigação moral de apor um ponto de exclamação na mais escassa frase que pronunciasse. Atribuir à troika o grosso das culpas liberta Passos Coelho de qualquer responsabilidade. E coloca-se no supremo e imaculado papel de julgador. Além de idiota, a manobra entra nos domínios do irracional, porque já se sabe o que tem acontecido nestes domínios. Se a troika falhou, como pretende, docemente, o dr. Cavaco, que fizeram aqueles sábios que lhe seguiram o rasto e obedeceram às indicações? Quem falhou, afinal?
A charada é menos imbricada do que parece. Manifesta-se um fiasco generalizado em todas as actividades do Governo, cuja existência política já soçobrou, embora ele não reconheça nem admita. A troika, que falhou, lava as mãos das decisões eruptivas tomadas pelo Executivo; no entanto, ela age na sombra e no silêncio. E os mangas-de-alpaca que aí estão são, eles também, subalternos de uma ideologia na qual dominam os obscuros valores da finança.
A sociedade civil deixou, pura e simplesmente, de acreditar na escala local. E os esforços dos sindicatos, para inverter esta tendência, têm dado módicos resultados. Muitos de nós continuamos a acreditar que a cultura é prioritária. A cultura, entendida como actividade de relação, e como contrapoder, pode alterar, substancialmente, o sentido das coisas. Para isso, Portugal carecia de outro Presidente e de outro primeiro-ministro. E, acaso, de outra fibra.
1 comentário:
PRECISAM DUMA CONSULTA DE OFTALMOLOHIA :
TODOS OS PORTUGUESES ANDAM MESMO DE OLHOS "TROYKADOS" !!!
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