Não só o novo
prefeito de São Paulo é um descendente de libaneses: os árabes têm uma forte
presença na sociedade brasileira. Também o comércio entre o Brasil e os países
do mundo árabe vai bem: desde 2002, cresceu 400%.
Visível nos traços
físicos de pessoas, na culinária, nos nome de políticos, personalidades ou
empresas, a imigração árabe pode ser facilmente encontrada no Brasil. Basta um
passeio por alguns bairros de São Paulo – cidade que concentra uma grande
comunidade de sírios e libaneses e cujo novo prefeito, Fernando Haddad, tem
origens no Líbano – para esbarrar na herança cultural dos imigrantes árabes.
Eles começaram a
chegar ao Brasil no fim do século 19. Estima-se que o país tenha a maior
comunidade fora dos países do mundo árabe, formada principalmente por libaneses
e sírios. Grande parte dos mais de 12 milhões de brasileiros com ascendência
árabe está em São Paulo
e na região da chamada tríplice fronteira.
Das várias levas de
imigrantes, a primeira foi constituída majoritariamente por cristãos, que
saíram de suas terras – atualmente a Síria, o Líbano e a Palestina – por causa
das perseguições religiosas do Império Otomano, que era formado por islâmicos. Já
os árabes muçulmanos chegaram ao Brasil em grande número durante o século 20.
O Brasil era muito
atraente por causa das oportunidades que oferecia. Grande parte dos imigrantes
tinha conhecimentos de agricultura, mas, como o panorama agrário não era
satisfatório naquele período no Brasil, dedicou-se essencialmente ao comércio e
à indústria.
Os primeiros
imigrantes eram vendedores de porta em porta e comercializavam pequenos itens
como bijuteria, vegetais e frutas e, mais tarde, roupas. "Nos seus vários
períodos, a imigração árabe teve uma influência direta na sociedade, na
economia e na cultura brasileira", afirma o professor Salem Nasser, da
Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Brasil se volta aos
países árabes
Mas foi somente a
partir da década de 1970, por razões econômicas e devido à sua dependência do
petróleo, que o Brasil começou a dar mais atenção para os países árabes.
Ao mesmo tempo em
que o Iraque exportava petróleo para o Brasil, as empresas brasileiras –
principalmente do setor de construção civil – investiam naquele país.
Outro setor que fez
bons negócios com o mundo árabe foi o automobilístico. Entre 1983 e 1988, época
em que a Volkswagen do Brasil buscava novos mercados, a empresa chegou a
exportar para o Iraque cerca de 170 mil unidades do modelo Passat.
O caráter da
transação era bem inusitado: os carros eram pagos em petróleo, repassado à
Petrobras. Quando esta passou a ter um excedente do óleo, os veículos –
carinhosamente apelidados de "Passat Iraque" – sobraram e a solução
foi vendê-los no mercado brasileiro, a partir de 1986.
Relação sul-sul
O Brasil fez claras
mudanças na sua política externa e se tornou um player ambicioso na área
internacional durante o primeiro governo Lula, como lembra Nasser. "Houve
uma opção por privilegiar a chamada relação sul-sul, fazendo uma aproximação
especialmente com os países árabes e africanos e, naturalmente, com os países
vizinhos na América Latina", diz Nasser.
Os efeitos dessa
política se fazem sentir. De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior (MDIC), entre 2002 e 2011 houve um crescimento de
400% no intercâmbio comercial entre o Brasil e os 22 países que fazem parte da
Liga Árabe – de 4,9 bilhões de dólares para 25,1 bilhões de dólares.
Apenas entre 2010 e
2011 o aumento foi de 20,3%. Essa taxa elevada não deve se repetir em 2012,
ficando entre 5% e 8%, principalmente por causa da instabilidade política na
região – a chamada Primavera Árabe – e a crise econômica mundial.
De olho no
crescimento das relações comerciais, o ministro das Relações Exteriores,
Antonio Patriota, visitou a Palestina em outubro deste ano. Além de reforçar as
intenções do Brasil de servir como mediador nas negociações para a paz na
região, a visita teve o objetivo de impulsionar o comércio com os árabes. Foi a
primeira viagem de um chanceler brasileiro ao território palestino desde que o
Brasil reconheceu o Estado da Palestina, em dezembro de 2010.
Condições
favoráveis ao comércio
O bloco árabe é uma
das economias mais importantes do mundo: são 22 países que têm uma população
total de 370 milhões de pessoas. De acordo com Michel Alaby, diretor da Câmara
de Comércio Árabe-Brasileira (CCAB), os países árabes importam anualmente cerca
de 550 bilhões de dólares em produtos e o Brasil representa somente 2,5% desse
valor.
"É muito pouco
em relação ao bolo total de exportações do Brasil. Elas podem aumentar muito
mais, pois são muitos países árabes. É um começo, o Brasil está explorando esses
laços históricos que tem com o mundo árabe", comenta o professor de
relações internacionais Argemiro Procópio, da Universidade de Brasília (UnB).
O comércio ainda é
concentrado em poucos produtos. "O desafio é diversificar a pauta de
exportação para esses países que crescem num ritmo expressivo, que têm uma
população que consome cada vez mais e renda cada vez mais elevada", diz a
secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior (MDIC), Tatiana Prazeres.
Em 2011, o Brasil
exportou mercadorias no valor de 15,1 bilhões de dólares para os países árabes,
principalmente açúcar, carnes, milho e trigo. "Há nichos de mercado
ocupado pelos brasileiros e há um potencial de crescimento, já que os árabes
têm uma simpatia muito grande pelo Brasil", frisa Alaby.
Desse valor, cerca
de 70% foi direcionado para somente cinco países – Arábia Saudita, Egito,
Emirados Árabes, Argélia e Marrocos. "Há muito mercado ainda para ser
explorado e o Brasil precisa trabalhar mais com marketing", diz Alaby.
A secretária de
Comércio Exterior do MDIC concorda com Alaby e avalia que existem muitas
condições favoráveis para aumentar o fluxo comercial com a região. "Nesses
países as barreiras tarifárias são relativamente baixas e as barreiras
sanitárias foram superadas, sendo que há boas oportunidades, especialmente para
o setor de carnes."
O grande desafio,
porém, é assegurar a regularidade das exportações. "O Brasil precisa ter
uma presença forte e constante na região para conquistar ainda mais esses
mercados e o governo brasileiro está consciente disso e contribuindo nesse
sentido", avalia Tatiana Prazeres.
Mas ainda falta a
cultura exportadora para o empresariado brasileiro. "E para isso,
precisamos desenvolver programas de marketing internacional e adaptar as
empresas brasileiras ao processo de internacionalização", comenta Alaby.
Copa do Mundo de
2022
As empresas
brasileiras – principalmente do setor da construção civil – que acumularem
experiência na Copa do Mundo no Brasil de 2014 devem ter um grande mercado para
oferecer seus serviços para a Copa de 2022, a ser realizada no Catar.
Tatiana Prazeres,
do MDIC, diz que várias empresas de construção já identificaram no Catar boas
oportunidades de investimento. "Claramente é uma nova fronteira para as
exportações brasileiras no setor de construção civil."
Grandes
construtoras brasileiras, como OAS, Andrade Gutierrez, Odebrecht e Queiroz
Galvão já estão no Catar. "Não há dúvidas que as empresas que estão
construindo estádios no Brasil terão grandes chances de fazer bons negócios na
Copa de 2022", conclui Alaby.
Autor: Fernando
Caulyt - Revisão: Alexandre Schossler
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