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Um massacre ainda
"desconhecido"
12 de Dezembro de
2012, 08:44
Luís Andrade de Sá,
da Agência Lusa
Wiriyamu,
Moçambique, 12 dez (Lusa) - Passaram 40 anos sobre o massacre de Wiriyamu,
cometido por tropas especiais portuguesas sobre civis suspeitos de apoiarem a
Frelimo, no centro de Moçambique, mas os contornos da "Operação
Marosca" continuam ainda envoltos num certo mistério.
"Continua
difícil verificar com precisão os acontecimentos de 16 de dezembro de 1972
(...) Isto porque as autoridades portuguesas, quer antes, quer depois do golpe
de 25 de abril de 1974, não autorizaram um inquérito independente à Operação
Marosca", queixam-se os investigadores portugueses Bruno C. Reis e Pedro
A. Oliveira num texto publicado em março deste ano na revista 'Civil Wars'
("Cutting Heads or Winning Hearts: Late Colonial Portuguese
Counterinsurgency and the Wiriyamu Massacre of 1972").
Apenas um pequeno
sinal, quase escondido na berma da estrada nacional 7, à saída de Tete, indica
o desvio para Wiriyamu, o local de um dos maiores massacres ocorridos na então
província portuguesa e que terá apressado o fim das guerras coloniais que
Portugal travava em África.
Na aldeia, um
monumento com ossadas humanas evoca a tragédia ocorrida em Wiriyamu, Juwau e
Chawola, três povoados nas cercanias dos rios Zambeze e Luena, mas o jovem
Carrilho, 12 anos, que ali passa de bicicleta, não consegue identificar nem os seus
responsáveis nem o que aconteceu.
O diretor da escola
primária completa de Wiriyamu, Carlos Alciano, 40 anos, garante que o massacre
faz parte do programa de ensino dos alunos da sexta e sétima classes e que as
visitas ao monumento são frequentes.
"Eles têm que
conhecer quando surgiu o massacre, quem o fez, quantas pessoas morreram",
diz, mas o número de vítimas varia: "400", segundo os padres de
Burgos, os primeiros a denunciaram o massacre, "cerca de 200", de
acordo com o médico Rodrigues dos Santos, que visitou o local pouco depois dos
acontecimentos, "63" ou "98", assumidas por autoridades
portuguesas, segundo diversas fontes, ou os "450" evocados na base do
monumento em Wiriyamu.
Independentemente
do número de mortes, a "Operação Marosca" resultou num massacre,
"a ocorrência de crimes e, por vezes, extremamente cruéis, execuções de
civis desarmados, em grande número", asseguram os dois investigadores
portugueses.
Bruno Reis e Pedro
Oliveira defendem, no entanto, que, se se pode dizer que se tratou de
"matança indiscriminada", já que ninguém foi poupado, também se pode
afirmar o seu contrário, no sentido de que "a operação tinha como alvo o
que era visto como bases da Frelimo disfarçadas de aldeias civis" e que os
militares portugueses se baseavam em informações aparentemente falsas da
PIDE/DGS.
"Isto, de
nenhuma forma, reduz a criminalidade destas mortes mas, simplesmente, alarga a
responsabilidade para lá dos soldados individuais e seus comandantes",
escrevem.
À operação estão
associados o então comandante militar de Moçambique, Kaúlza de Arriaga, e o seu
conceito de luta anti-guerrilha, envolvendo fortes meios aéreos e tropas
especiais, e o agente da PIDE/DGS Chico Kachavi, um moçambicano temido pelos
seus conterrâneos.
"Ele é que
comandava nesse dia, e não queria saber se este era africano. O coração dele
era europeu", recorda Vinte Pacanet Gandar, 63 anos, sobrevivente do
massacre, e que diz que o agente da PIDE/DGS foi mais tarde morto por elementos
da Frelimo.
LAS // HB
Principais datas
relacionadas com massacre
12 de Dezembro de
2012, 08:44
Maputo, 12 dez
(Lusa) -- Há 40 anos, tropas especiais portuguesas entraram em três aldeias no
centro de Moçambique e mataram centenas de pessoas no que foi conhecido como o
massacre de Wiriyamu.
A violência
indignou o mundo, isolou Portugal e contribuiu para o agravar das divergências
nas Forças Armadas portuguesas, que conduziriam ao 25 de Abril de 1974, e
também para o reforço da Frelimo que, menos de dois anos depois, proclamou a
independência de Moçambique.
Cronologia das
principais datas:
1962
25 set - Frelimo
inicia luta armada contra colonialismo português, no norte de Moçambique.
1968
08 mar -- Frelimo
abre frente de Tete, no centro.
1970
01 jul/06 ago --
"Operação Nó Górdio", dirigida por Kaúlza de Arriaga, no norte de
Moçambique, contra a Frelimo
1972
18 nov -- Grande
ofensiva da Frelimo em
Cabo Delgado , Niassa e Tete
14 dez -- Um avião
civil que sobrevoa Wiriyamu é alvejado. No mesmo dia, a PIDE/DGS envia uma
equipa ao terreno para obter informações sobre o caso.
15 dez - Seis
militares portugueses são mortos numa emboscada, enquanto batiam a zona.
16 dez - Assassínio
de cerca de 400 pessoas nas povoações de Chawola, Juwau e Wiriyamu, a cerca de
25 quilómetros da cidade de Tete
1973
06 jan --
Representante da Cruz Vermelha e médico do hospital de Tete visitam o local do
massacre.
Jun - Denúncia dos
missionários espanhóis, a quem tinham sido passadas as primeiras informações,
enviada à Amnistia Internacional em Londres
07 jul -- Notícia
do massacre na capa do 'The Times', de Londres
15 jul -
Manifestação em Londres contra a política africana do Governo português, pedindo
a anulação da visita do presidente do Conselho português, Marcelo Caetano.
16 jul -- Marcelo
Caetano inicia visita a Londres, por ocasião dos 600 anos da aliança
anglo-portuguesa, no meio de fortes protestos.
01 ago - Kaúlza de
Arriaga abandona o cargo de Comandante-Chefe das Forças Armadas de Moçambique.
21 ago --
Comunicado do Ministério da Defesa de Portugal que admite que "alguns
elementos das Forças Armadas, em destacamento, ignorando ordens, cometeram atos
repreensíveis na região de Tete".
1974
07 set -- Portugal
e Frelimo concordam na independência de Moçambique, marcada para 25 de junho de
1975.
22 nov -- Relatório
da comissão de inquérito da ONU aos noticiados massacres em Moçambique: "A
comissão dá-se por completamente satisfeita com as provas de que, a 16 de
dezembro de 1972, tropas portuguesas dirigidas por agentes da DGS cercaram as
aldeias de Chawola, João e Wiriyamu, entraram nas aldeias, mataram qualquer
pessoa à vista e, na operação, destruíram as aldeias (...). Estima-se que o
número de vítimas seja superior a 400 nas três aldeias".
LAS // HB
O massacre de
Wiriyamu segundo o sobrevivente Vinte Pacanet Gandar - reportagem
12 de Dezembro de
2012, 08:44
Luís Andrade de Sá,
da Agência Lusa
Wiriyamu,
Moçambique, 12 dez (Lusa) - Não é por terem passado 40 anos que parece que as
coisas mudaram em Wiriyamu: não há eletricidade nem água e a cidade de Tete, a
30 quilómetros, ligada por uma picada de terra batida, continua
insuportavelmente distante.
"E fome
existe, também", acrescenta Vinte Pacanet Gandar, 63 anos, camponês de
Wiriyamu. E, para que não restem dúvidas, repete: "E fome".
A quase permanente
seca na região, no centro de Moçambique, afeta a produção de mapira e amendoim,
que todos cultivam para consumo próprio, e o pouco dinheiro, as raras moedas
que usam para comprarem óleo ou sementes, obtêm-se com a venda de carvão na
cidade.
Luís Wiriyamu, 27
anos, neto do homem que deu o nome à aldeia, vive de apanhar lenha que, depois,
transforma em carvão e vende na berma na estrada -- "Não há mais nada para
fazer aqui", queixa-se.
A escola primária,
um painel solar numa pequena venda e os camiões de uma mineira australiana, a
caminho de mais um projeto nas imediações, destacam-se na paisagem de casas de
paredes de barro e telhados de colmo, em veredas de terra batida, por entre
embondeiros e mato cerrado, por onde meninas carregam à cabeça feixes de lenha
que vão alimentar o fogo com que mulheres cozinham o almoço.
Vinte Pacanet
Gandar, que se expressa num português desenvolto, foi um dos sobreviventes do
massacre de Wiriyamu perpetrado naquela aldeia por tropas portuguesas, no dia
16 de dezembro de 1972, que vitimou centenas de pessoas e, segundo
historiadores, mudou o rumo da guerra colonial.
A sua condição de
sobrevivente granjeou-lhe fama, mas também a construção de uma narrativa, quase
de um fôlego, do massacre cometido por tropas especiais portuguesas.
"Surpresamente,
apareceram cinco helicópteros e dois jatos que começaram a bombardear lá fora,
e, então, aterraram na aldeia para os soldados saírem", conta Vinte, que
tinha, então, 23 anos.
A "Operação
Marosca" tivera como motivos próximos a morte, dois dias antes, de seis
militares em Tete, e disparos, na zona, contra um avião civil, sinais para as
chefias militares de que a Frelimo atuava no centro da colónia, com o apoio da
população.
"Cercaram a
nossa aldeia. Começaram a queimar o quê? As casas. Levaram as pessoas para
acumular lá fora. E começaram a perguntar: 'Vocês aí, não conhecem os turras? E
nós falávamos: 'Não, não conhecemos'", prossegue o camponês.
As sucessivas
lideranças militares portuguesas em Moçambique tinham encarado de forma
diferente o "problema" da Frelimo e a guerra de libertação iniciada
em 1962, e, no início, apenas circunscrita ao norte do país.
Comandante militar
desde 1969, Kaúlza de Arriaga inova relativamente aos seus antecessores, ao
usar intensivamente meios aéreos e tropas especiais, o que fragiliza a Frelimo
no norte, obrigando-a a deslocar-se para o centro, onde intensifica essa frente
de guerra e se ataca, até, colonos portugueses.
"Mas eles
disseram: 'Não, não, aqui há turras e vocês estão a tirar comida para dar aos
turras para os turras vir matar a nós, lá na estrada. Por isso, vocês, hoje,
não vão viver nada, vão ser mortos aqui'", continua Vinte, dando a voz aos
militares portugueses.
A zona de Wiriyamu
estava a ser batida desde o dia 14 por aviões militares e agentes da PIDE/DGS,
que procuravam uma base da Frelimo com cerca de 300 guerrilheiros.
Depois, tropas
especiais entram em Wiriyamu, Juwau e Chawola, todas aldeias na mesma zona, e,
a 16 de dezembro, recolhem aos quartéis, deixando um rasto de destruição, hoje
evocada num monumento que guarda caveiras e ossadas de alguns dos "mais de
450 mortos".
Vinte safou-se,
correndo para o mato e evitando os tiros que disparavam contra ele, mas a sua
família foi quase toda dizimada: "Quem morreu? O meu pai, chamado Guspiga,
meu avô, Jemusse, Mabalata, Manyate ... são muitos ... Tuma, Capitone... são
muitos".
Alguns feridos
abrigam-se no hospital de Tete e denunciam o massacre a missionários espanhóis.
No início de 1973, a Cruz Vermelha e um médico português visitam o local, em
junho do mesmo ano, o escândalo chega à imprensa internacional, e Portugal,
que, até aí, tinha negado os acontecimentos, acabará por admitir
"excessos" das suas tropas.
Dois anos depois de
a notícia ser capa do 'Times', de Londres, Moçambique torna-se independente e,
40 após o massacre, só por distração alguém pode achar que continua tudo igual
em Wiriyamu.
"Antigamente,
não tínhamos escola. As pessoas que têm idade como a minha não falam português,
aqui, mas, hoje, as nossas crianças estão a estudar e, quando acabarem, vão
fazer bom trabalho", prevê Vinte Pacanet Gandar, o camponês de Wiriyamu
que sobreviveu ao massacre.
LAS // HB
Restantes vídeos:
*Reportagem de Felícia
Cabrita – Paulo Camacho
1 comentário:
"How is it that there is such a profound amnesia in Portugal on the topic of the Wiriyamu genocide? To date, the Portuguese do not feel the weight that is the Moorish part of the history of Portugal?
The chapter on crimes committed by Portugal is not completely closed with the monument in Mozambique in honour of the victims of the Wiriyamu genocide.
Portugal does not recognize the structural, systemic violence it practised in the colonies.
In addition to accepting responsibility officially, the Portuguese government should erect a monument in Portugal in permanent memory of this historical period, a salutary reminder for its collective citizenry of its actions in the former African colonies."
Mustafah Dhada
*Portugal MUST always Remember the atrocities it committed in the
Why would anybody wish to visit a region of a country where the worst genocide in modern times occurred and was not only covered up by the portuguese government but the United Nations as well?
Colonial Wars in Africa and lying to ourselves and our children generation after generation is not the solution! We have to STOP making up our own history and start telling the truth about the blood Portugal has on it's hands as it wiped out whole cultures in Africa, India, and Brasil.
Thank you for allowing me the privilege to post on your website as a Portuguese man who is truly sorry for all the hate and crimes my country of Portugal has perpetrated since it's founding as a nation that stole all the lands we own today by slaughtering the Moors by 711 A.D.
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