João Marcelino – Diário
de Notícias, opinião
1 Os números
conhecidos sobre o desempenho da economia portuguesa não param de trazer más
notícias. O Governo de Pedro Passos Coelho, neste momento, um ano e meio
depois, está como o de José Sócrates no final da corrida: já só pode contar com
os crentes, os que acreditam que no final deste caminho de sofrimento social
estará a redenção de uma economia por fim a crescer e a gerar os empregos que
hoje se extinguem a uma cadência alucinante.
Há muitas coisas em
comum nos dois governos.
A primeira é que os
dois têm, tiveram, bons ministros, pessoas empenhadas em mudar as suas áreas,
em reformar, como é agora o caso de Paula Teixeira da Cruz, na Justiça, por
exemplo. Mas a característica principal é que ambos os primeiros-ministros
estabeleceram com os eleitores um contrato social que depois rasgaram. Pode
dizer-se que Sócrates o fez com premeditação eleitoral, admitir-se em defesa de
Passos Coelho que "apenas" foi assaltado pela falta de preparação, ou
para o cargo ou para as condições que iria defrontar. Pode dizer-se muita
coisa, mas o resultado é só um: fizeram promessas que não cumpriram. O cidadão
dirá que mentiram - e é verdade.
2 Quando se mente
ou se ganha as eleições com contratos que se revelam falsos, o Governo pode
continuar em funções, o que formalmente é legítimo, mas perde a capacidade para
levar a cabo grandes mudanças sociais.
O que está em causa
no folhetim da "refundação do Estado", já se percebeu, nada mais é do
que uma necessidade premente de cortar quatro mil milhões de euros a curto
prazo. Podia ser uma reforma ideológica, no que o Governo até seria coerente,
assim a Constituição o permitisse. Mas, infelizmente, é apenas mais um corte,
com mais ou menos critério, a que só uma oposição ingénua se poderia associar.
3 Mexer no Estado
social com profundidade, adequando-o às novas possibilidades do País, teria
necessariamente de merecer um grande compromisso nacional que um governo
tranquilo, mesmo de direita, poderia liderar se o convocasse com tempo e sem
estar pressionado, como está, no imediato. O PCP e o Bloco diriam que não, mas
o PS teria de se disponibilizar para essa discussão, em que entraria já de
livre vontade ou um dia terá necessariamente de a liderar - e aí já sem álibis.
O dinheiro não dá. Ponto.
O problema está em que Pedro Passos
Coelho não deu qualquer espaço à oposição. Antes pelo contrário, forneceu-lhe
toda a argumentação para se colar na posição que foi dele um dia perante
Sócrates: "O governo que faça."
Parece que é neste
círculo desgraçado que estamos condenados a sobreviver nos próximos anos
enquanto se cava mais e mais o descrédito do regime. Quando a cegueira se junta
ao logro eleitoral, só resta mesmo acreditar em algum milagre.
O Orçamento do
Estado, toda a gente o sabe, não dará certo em 2013. O quadro macroeconómico é
uma ilusão. A recessão vai situar-se, obviamente, acima do 1% do PIB. Virão
mais cortes no rendimento do trabalho, mais desemprego, o caldo social vai
agravar-se e os objetivos de redução do défice não serão alcançados. Até quando
Passos Coelho resistirá na imitação do mais estafado dos defeitos políticos do
se antecessor, a teimosia?
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