Bruno Faria Lopes –
Jornal i
Para o Banco de
Portugal a recessão na zona euro travará as exportações. Banco parece não
acreditar na “espiral recessiva”, mas não arrisca
A economia
portuguesa poderá contrair 1,9% este ano, cerca do dobro da previsão em que o
governo e a troika basearam o Orçamento do Estado para 2013, indicou ontem o
Banco de Portugal, no boletim económico de Inverno. A contracção agora
prevista, que custará cerca de 88 mil postos de trabalho ao longo do ano, é
três décimas maior do que o divulgado há três meses pelo banco central – a
revisão é justificada pelas novas previsões sobre o impacto da recessão
europeia, para onde Portugal escoa cerca de três quartos das suas exportações
(cujo ritmo de crescimento é revisto para 2%, menos de metade dos 5%
anteriormente previstos).
O aprofundamento da
recessão, divulgado logo no arranque do ano, coloca pressão adicional sobre o
governo e a troika, que poderão rever as suas perspectivas já na sexta
avaliação regular do programa, em Fevereiro. O banco central salienta que os
riscos continuam a estar enviesados no sentido negativo, com 55% de
probabilidade do resultado final do PIB no final do ano ser mais negativo do
que 1,9%. O impacto da revisão em baixa incide numa rubrica com pouco impacto
directo na consolidação orçamental – comparativamente, por exemplo, ao consumo
privado –, mas ataca o único ponto que ampara a economia portuguesa em queda,
minando mais o emprego e, indirectamente, a execução orçamental.
As más notícias não
contam com o impacto de eventuais medidas adicionais de austeridade para
corrigir os desvios que apareçam este ano (o plano B de 800 milhões de cortes
na despesa previsto pelo governo e pela troika), facto que constitui um risco
adicional para o cenário económico, a juntar ao imposto pela conjuntura
externa.
Apesar das maiores
dificuldades o Banco de Portugal parece não comprar o discurso de “espiral
recessiva” ventilado pelo Presidente da República, Cavaco Silva. A instituição
liderada por Carlos Costa considera que o impacto negativo do ajustamento é
“inevitável” e que se está dentro do “antecipado” pelas autoridades
portuguesas, ou seja, mesmo com revisões negativas sucessivas o plano não se
desviou radicalmente.
O banco central
aponta ainda para uma previsão de crescimento de 1,3% em 2014, salientando que
o mais importante é a trajectória de recuperação da economia – a actividade
deverá dar sinais de voltar à vida no último trimestre do ano, um pouco mais
tarde do que o previsto pelo governo de Passos Coelho.
A previsão para
2014 tem, contudo, um enorme risco associado, salientado pelo próprio Banco de
Portugal no boletim: não conta com o efeito das medidas de austeridade que o
governo ainda não detalhou, mas que já deu como certas. Portugal terá que
cortar cerca de 3,2 mil milhões de euros em despesa no próximo ano para cumprir
o compromisso assumido com a troika. As regras do Eurosistema levam o Banco de
Portugal a contar apenas com as medidas de política orçamental que conhece – a
previsão de retoma em 2014 assume, por isso, que a política orçamental se
mantém igual, um pressuposto que será revisto.
“Com as políticas
de austeridade que se anunciam de forma geral, que terão um efeito muito
significativo, prevemos uma estagnação total da economia”, aponta Paula
Carvalho, do Banco BPI. A economista – que reviu o valor de 2013 para -2,2% e
não ficou surpreendida com a revisão do Banco de Portugal – salienta a
incerteza acumulada por um processo interno de ajustamento violento sem
precedentes e pela correcção de vários pontos de crise a nível global.
Para o Banco de
Portugal o ritmo em 2014 dependerá da conjugação destes dois efeitos – a
austeridade adicional é uma certeza (e o efeito de cortes de despesa na
economia foi revisto em alta recentemente pelo FMI), sendo que um comportamento
melhor da conjuntura externa, que poderia compensar o impacto negativo na
frente doméstica, permanece no domínio da incerteza. A instituição atribui uma
probabilidade de 60% à concretização de um cenário pior para o PIB e,
consequentemente, para o emprego.
Ao todo, entre 2009
e 2013 a economia portuguesa encolherá mais de 7%, com os gastos das famílias a
recuarem 17% – recordes negativos que fazem o país recuar ao início da década
passada. O reverso da medalha está no ajustamento recorde das contas externas:
tal como previsto a meio do ano passado, em 2012 a economia portuguesa registou
o primeiro excedente comercial em cerca de seis décadas (devido ao recuo das
importações e ao esforço nas exportações, que já valem 42% do PIB), um
resultado que deverá manter este ano e no próximo, segundo o Banco de Portugal.
O défice externo, que há três anos estava perto dos dois dígitos, deverá
praticamente desaparecer no final do programa da troika – subsistem dúvidas
entre vários economistas sobre a sustentabilidade deste resultado.
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