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SYNDICATE PRAGA – Presseurop – imagem Kap
À beira das
eleições para o Parlamento Europeu de 2014, a União Europeia devia aprender
bastante com a recente campanha presidencial nos Estados Unidos, no que
respeita ao envolvimento com os seus cidadãos, ao acréscimo de legitimidade e a
ter mais voz no panorama internacional.
A União Europeia
tem um longo historial como farol de paz, prosperidade e êxito, em campos que
vão da cultura ou da ciência ao desporto. No entanto, a Europa atraiu mais a
atenção mundial nos últimos dois anos do que nas últimas seis décadas, devido à
crise da dívida – agravada por uma economia recessiva e divergências internas
–, que enche os destaques noticiosos por todo o mundo. Afinal, a polémica tem
bons efeitos nas vendas. Mas o debate público que essa polémica vem alimentando
não é manifestamente construtivo.
Quase seis décadas
depois de o Tratado de Roma ter
fundado a Comunidade Económica Europeia, os debates que ocorrem por toda a UE
continuam a ser realizados
em grande parte por intervenientes nacionais em fóruns nacionais – e
mantêm-se centrados nos interesses nacionais. Para haver um progresso real,
interesses europeus claramente definidos terão de substituir os interesses
nacionais em matéria de desenvolvimento da União.
A definição desses
interesses exige um debate sério, honesto e pan-europeu – ou seja,
ultrapassando a soma dos debates nacionais. A discussão deve ser pública,
envolvendo os cidadãos europeus, e não apenas o pequeno círculo de políticos do
Conselho Europeu.
A ausência de uma
esfera pública europeia representa um obstáculo para esse debate. O espaço
comum europeu existente – composto por órgãos de comunicação, como o Financial
Times e The
Economist, conferências de âmbito europeu, redes de Organizações Não
Governamentais e programas de intercâmbio como o Erasmus –
envolve apenas elites ricas e cosmopolitas. Apesar de a comunicação social
poder proporcionar abertura à criação de uma esfera pública europeia mais
abrangente, isso ainda vai levar algum tempo, pelo menos no que respeita os
cidadãos de língua inglesa.
Uma oportunidade
para iniciar o debate
Entretanto, os
europeus devem encarar a corrida às eleições para o Parlamento Europeu de 2014
como uma oportunidade para iniciar um verdadeiro debate público sobre o seu
futuro. Deviam começar por copiar as intervenções públicas bem-sucedidas de
outras regiões do globo, como os Estados Unidos.
Na verdade, a
recente eleição presidencial norte-americana foi confusa, populista e
corrompida por interesses corporativos. Mas, apesar disso, exemplificou o que é
um debate dinâmico entre as
visões do futuro da América em confronto: um país mais igualitário, que
assume um papel construtivo global, ou uma América externamente agressiva, ao
serviço dos seus cidadãos mais ricos. Milhares de milhões de pessoas em todo o
mundo seguiram os cativantes – e muitas vezes teatrais – debates dos
candidatos; não precisaram de direito a voto para se sentirem envolvidas na
discussão.
Nos próximos 20
meses, os recursos mais eficazes da campanha eleitoral dos Estados Unidos
deviam ser cruzados com a tradição eleitoral da Europa. O primeiro passo para
um debate inclusivo e convincente sobre o futuro da Europa será garantir que as
eleições de 2014 decidam qual o partido político ou coligação que irá preencher
os cargos de governação, nomeadamente os do executivo – como acontece em
qualquer democracia parlamentar.
Presentemente, só o
Parlamento Europeu é diretamente eleito. É o Conselho Europeu, que reúne
políticos nacionais, que propõe o executivo da UE – presidente da Comissão
Europeia e seus comissários – que o Parlamento depois ratifica. Como esses
cargos são preenchidos sem ter em conta resultados eleitorais, os cidadãos não
dão valor às eleições para o Parlamento Europeu, encarando o conjunto da
instituição como pouco mais do que um programa de emprego para políticos e seus
apaniguados.
À procura de
plataformas comuns
Para melhorar esta
estrutura sem introduzir alterações ao Tratado, os grupos político-partidários
europeus, começando pelo maior e mais influente, devem cumprir a sua promessa
de nomear candidatos próprios para a presidência da Comissão Europeia. Os
políticos mais destacados devem, então, realizar campanhas políticas efetivas,
concebidas, geridas e financiadas pelos respetivos grupos políticos, através da
partilha de recursos partidários europeus e nacionais.
Uma campanha
eleitoral pan-europeia deste tipo forçaria partidos políticos afins a
desenvolver e angariar apoios para plataformas comuns. Por exemplo, os social
democratas podiam promover a ideia de um salário mínimo europeu; os Verdes
podiam defender uma política energética independente da energia nuclear, a
nível da Europa; e os conservadores podiam ser os paladinos da baixa dos
impostos por toda a Europa.
Além disso, deve
ser criado um fórum de debate pan-europeu. Isso deve implicar, antes de mais, a
transmissão dos debates formais entre os principais candidatos de toda a Europa
– usando o modelo do Festival
Eurovisão da Canção ou da Liga dos Campeões em futebol.
Em suma, se a UE se
apresentar como um sistema político funcional de pleno direito, com estruturas
e processos democráticos sólidos, ganhará a atenção e apreço dos seus cidadãos
e do resto do mundo, promovendo um aumento da participação popular nos seus
países e maior poder de influência no exterior. A canalização dos debates para
uma discussão produtiva – em vez de simples parangonas mediáticas – é crucial
para reforçar os processos democráticos e resolver problemas urgentes.
A crise do euro
ameaça a própria existência da União Europeia. Mas também proporciona uma
oportunidade para se ampliar o debate crucial sobre o futuro da Europa – um
debate que só será produtivo no contexto de uma verdadeira democracia
parlamentar europeia.
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