Diário de Notícias,
editorial
Ao fim de alguns
meses de acalmia nos protestos, os professores voltaram ontem de novo à rua. A
manifestação, mesmo tendo, segundo números da organização, reunido 40 mil
pessoas, está longe das demonstrações do tempo de José Sócrates.
Além das emboscadas
sistemáticas dos sindicalistas do sector aos governantes, mais de cem mil
profissionais ligados ao ensino contestaram na rua a ministra Maria de Lurdes
Rodrigues, levando à sua remodelação. Mário Nogueira, o líder da Fenprof,
justificou os tempos de bonança recentes com "o medo" de toda uma
classe e não qualquer concordância com as linhas políticas atuais.
Apesar das graves
medidas de austeridade, os portugueses têm de facto mostrado alguma resignação.
As manifestações sindicais foram pacíficas e os incidentes registados terão
sido provocados por radicais infiltrados. Mas o equilíbrio social em crise está
sempre no fio da navalha. Por isso o atual Governo sempre mostrou preocupação
com possíveis focos de revolta social, reforçando seguranças e garantindo
orçamentos às polícias.
Os professores
podem ser de novo o aríete que agitará a governação e rebocará novos protestos
em várias áreas. O relatório do FMI que aponta para o corte de 200 mil
funcionários públicos considera os professores um grupo "relativamente
privilegiado" e sugere cortes substanciais, quer em número quer em
salários, além de propor o aumento do horário para 40 horas. Há aqui questões
factuais em que importa refletir para melhorar o ensino nacional. Mas há também
questões puramente contabilísticas, que nunca podem ser prioritárias numa
reforma como a que está em curso.
Perdido o
"medo" de que fala Mário Nogueira, a rua deve voltar a agitar-se
quando, no final do mês que vem, o Governo revelar onde vai cortar os quatro
mil milhões prometidos à troika. Uma rutura social está longe de estar
afastada. Vítor Gaspar, na euforia do regresso aos mercados, não o pode
esquecer.
Egito: Sinais
contraditórios
Dois anos depois
do início da revolta que derrubou Mubarak e um ano após o massacre de 74 jovens
apoiantes do Al-Ahly em Port Said, o Egito continua a enviar sinais
contraditórios para o mundo. Por um lado, julga com severidade 21 dos acusados
pela tragédia; por outro, deixa de lado as chefias militares e os funcionários
do Ministério do Interior que muitos consideram responsáveis (ou no mínimo,
cúmplices) de um ato de vingança organizado contra uma claque conhecida pelo
apoio ativo à luta contra a ditadura e o poder militar de transição que se lhe
seguiu. Por um lado consegue, em pouco tempo, organizar eleições presidenciais
e legislativas e aprovar uma nova Constituição; por outro, todo esse processo
só serviu para deixar o poder nas mãos dos islamitas, que tendo feito um
esforço para mostrar uma moderação inédita, em questões fundamentais não fogem
à sua verdadeira essência.
Perante os
confrontos que não cessam e as dezenas de mortos que, todas as semanas, deixam
nas ruas, a oposição laica lançou um desafio: ou o Presidente propõe uma
"solução global" para a crise, incluindo um "Governo de salvação
nacional", ou boicotará as legislativas na primavera.
Dois anos depois, o
Egito ainda não encontrou o seu rumo e os egípcios que lutam pela democracia
plena ainda não podem descansar.
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