quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

OPERAÇÃO SERVAL – II




UMA VEZ MAIS PARA ÁFRICA, RAPIDAMENTE E EM FORÇA

Martinho Júnior, Luanda

6 – A França possui bases militares em vários países africanos e, no espaço do Sahel, da África do Oeste e do Golfo da Guiné são conhecidas as que se situam no Tchade, no Níger, no Senegal, na Costa do Marfim e no Gabão, muito em especial ali onde a “FrançAfrique” e o “pré carré” mais se manifestam.

Esse é um arranjo obtido a partir das independências, um arranjo que tem definido os procedimentos neo coloniais que mantêm presas as elites dos respectivos países aos interesses geo-políticos, económicos e financeiros de vinculação (recorde-se os “réseaux Foccard” e, há 40 anos, a criação do Franco CFA).

É a partir do território nacional francês e dessa grelha de bases que a França mobilizou efectivos e meios para a Operação Serval e o que está a prever para a sua sequência!

7 – A Operação Serval foi concebida para, na sua fase mais ofensiva, durar cerca de um mês com quatro objectivos de intervenção bem definidos:

- Neutralizar a expansão dos grupos que deram corpo ao Azawad para sul, em direcção a Bamako, dentro do Mali;

- Passar à contra-ofensiva tomando sucessivamente Gao, Tombuctu, Kidal e Tessalit (na fronteira com a Argélia) e desse modo pondo fim à efémera existência do Azawad;

- Criar as condições para a chegada e instalação dos contingentes do Mali e dos outros países africanos que deverão fazer a ocupação do território Azawad de forma a garantir a soberania do Mali, mesmo que essa soberania esteja sujeita a conjunturas instáveis de maior ou menor intensidade (é preciso recordar que os efeitos do golpe de estado não foram ultrapassados).

- Manter quando muito posições-chave, como por exemplo o controlo de pistas e aeroportos da região, a fim de garantir os movimentos das unidades típicas de “soft power” para lá da Operação Serval propriamente dita, entre elas as unidades de forças especiais.

O “blietzcrieg” foi de tal maneira rápido que não deu azo a que os órgãos de informação pública conseguissem penetrar no teatro de operações de forma a pôr em causa as “versões oficiais”.

Quanto mais para norte foi a progressão mais isso foi dificultado (muito mais por causa das condições do terreno do que por resistência armada dos grupos islâmicos radicais).

É evidente que com os bombardeamentos da aviação francesa é impossível não haverem “danos colaterais” na população, mas essa “propaganda negativa” não ocorrerá enquanto pelo menos decorrer a Operação Serval, apesar de alguns focos controversos… depois logo se verá…

A intervenção visa pois dar oportunidade aos “parceiros” africanos a reagirem, a ocuparem e a tratarem de garantir soberania em cadeia no Sahel, a oeste de África e mais a sul, em direcção pelo menos à Nigéria, sabendo de antemão que as forças armadas dos envolvidos necessitarão de permanente apoio, instrução, organização, comunicações e logística da França e do quadro da hegemonia sob tutela do AFRICOM!

A parte mais odiosa da campanha, as incidências negativas, ficarão pois para as forças africana, a começar pelas do Mali!

Serão essas forças também as mais acossadas pelas réplicas dos fundamentalistas e radicais islâmicos…

8 – A guerra contra o regime de Kadafi na Líbia teve o condão de propiciar instabilidade em cadeia, por via dos “inimigos úteis” e, por sua vez, a “plataforma” do Mali deixa previamente supor que a expansão dos grupos radicais islâmicos está garantida, o que é o ideal para a geo estratégia que se acoberta no AFRICOM de que a “FrançAfrique” é componente!

A França pode avaliar melhor que os outros, as incidências humanas da situação que afecta uma região onde é a dominante neo colonial “no terreno”.

A Operação Serval ao mobilizar os efectivos franceses do Senegal ao Tchade (além dos reforços destacados a partir de França), mobilizou as forças armadas de países como o Tchade, o Níger, o Burkina Faso, o Senegal, o Togo, o Benim, a Costa do Marfim e a Nigéria, no quadro da Missão Internacional de Apoio ao Mali sob conduta Africana (MISMA)…

Se a retomada de Kidal e Tombuctu foi feita juntamente com efectivos do Mali, Tessalit foi com o acompanhamento do destacamento do Tchade.

9 – A ofensiva francesa que conjugou os avanços terrestres com a manobra de ataque aéreo, tudo isso mantendo uma impressionante operação de logística em terra, no ar e no mar, foi feita com uma superioridade tal de forças que o MNLA e os grupos radicais islâmicos combatentes, logo após os primeiros combates, “desapareceram da circulação”:

- A 11 de Janeiro teve início a Operação Serval, em resposta imediata ao ataque a Konna tomada recentemente pelos islamitas (estrada em direcção a Bamako);

- Apesar do abandono das cidades do norte na sequência dos bombardeamentos da aviação francesa, os islamitas tomam a cidade de Diaballi (14 de Janeiro de 2013);

- A França retoma Diaballi a 15 de Janeiro de 2013;

- A 16 de Janeiro uma exploração de gás no leste da Argélia é tomada por grupos islamitas radicais, tendo sido os seus trabalhadores feitos reféns; a acção constituiu-se represália ao ataque francês no Mali;

- A 17 de Janeiro forças malianas reentraram em Konna, retomando a cidade;

- A 19 forças especiais da Argélia retomam a unidade de exploração de gás no leste do país;

- A 21 de Janeiro forças francesas e malianas entram em Diabali e Douentza;

- Gao é tomada pelas forças conjuntas maliana e francesa a 26 de Janeiro;

- Tombuctu é tomada a 28 de Janeiro, sem combates;

- O Presidente François Hollande visita Tombuctu e Bamako a 2 de Fevereiro;

- Forças francesas ocupam o aeroporto de Kidao, enquanto tropas tchadianas ocupam a mesma cidade a 5 de Fevereiro;

- À volta de Gao registaram-se pequenas escaramuças com radicais islâmicos no dia seguinte;

- A 8 de Fevereiro forças conjuntas francesas e tchadianas ocupam Tessalit, no norte, junto à fronteira do Mali com a Argélia; nesta mesma data registou-se em Gao o primeiro ataque suicida;

- A 10 de Fevereiro, combatentes do MUJAO atacam o centro de Gao, na sequência de outros dois ataques suicidas, entrando em confronto com forças do Mali…

Quer dizer que ao cederem o terreno e ao não oferecerem resistência directa à ofensiva francesa, os grupos islâmicos prepararam-se para um longo combate, que serão principalmente as forças africanas a enfrentar, pois são elas que, no quadro da MISMA e sob os auspícios da ONU, irão articular a ocupação.

Os franceses reservam para si o papel da intervenção “onde for necessário” em todo o Sahel, tirando partido dos suportes do quadro das medidas de “Inteligence, Surveillance and Reconnaissance” que mantêm com os norte-americanos, assim como de suas bases de há décads instladas e de sua enorme potencialidade logística.

Tudo isso está integrado na perspectiva geo política e geo estratégica ampla do AFRICOM, mas a ocupação, a parte mais penosa, está reservada aos africanos na base do sistema e em nome das soberanias dos respectivos estados!

É necessário para a ingerência neo colonial toda a doutrina de contra-subversão e luta contra o terrorismo são as potências ocidentais que detêm a filosofia assim como toda a panóplia de meios que vão fornecer aos estados… depois de haverem accionado a seu tempo, “inteligentemente”, os grupos “terroristas”…

Mapa: Ilustração (não exaustiva) do afluxo de unidades militares francesas ao Mali no quadro da Operação Serval (não constam, provavelmente por razões de “contra inteligência”, as forças provenientes ou a operar a partir do Níger).

Consultas:
- La presse française assume le caractère colonial de l’opération Serval – http://www.voltairenet.org/article177315.html
- Un gouvernement au service des entreprises françaises en Afrique – http://survie.org/billets-d-afrique/2012/218-novembre-2012/article/un-gouvernement-au-service-des
- Condamnation de la guerre au Mali et dénonciation du complot néocolonial de l’Occident – http://www.voltairenet.org/article177366.html
- Il n’y a pas plus aveugle que celui qui ne veut pas voir… - http://www.lequotidien-oran.com/?news=5178335
- La France cache les dégâts collatéraux de ses raids aériens sur le Mali – http://www.voltairenet.org/article177442.html
- Non. La guerre ce n’est pas la France – http://www.voltairenet.org/article177446.html
- Rusia y China lidian con el futuro de Mali – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=162929
- Opération Serval les forces françaises et tchadiennes s’emparent de Tessalit – http://www.defense.gouv.fr/operations/mali/actualite/operation-serval-les-forces-francaises-et-tchadiennes-s-emparent-de-tessalit
- Opération Serval Engagement d’un escadron blindé AMX 10RC de Niamey à Gao – http://www.defense.gouv.fr/operations/mali/actualite/operation-serval-point-de-situation-du-jeudi-7-fevrier-2013
- Opération Serval zoom sur le détachement Harfang (os drones franceses) – http://www.defense.gouv.fr/operations/mali/actualite/operation-serval-zoom-sur-le-detachement-harfang
- Security Council Authorizes Deployment of African-led International Support Mission in Mali for Initial Year-Long Period – http://www.un.org/News/Press/docs/2012/sc10870.doc.htm

Sem comentários:

Mais lidas da semana