Paulo Moura – Público,Repórter à Solta, em Blogues
José Tavares não
treinou o suficiente. Não é possível praticar o suficiente para a
prova que vai iniciar. É verdade que já viajou de caiaque, sozinho, de Lisboa
ao Algarve, em sete dias. Foi um bom treino, mas sem qualquer semelhança com
o que o espera agora. Deu a volta à ilha da Madeira em caiaque, remou 114
quilómetros no Tejo, mas não é a mesma coisa. Atravessou os Andes a pé, de
caiaque e de bicicleta. Cruzou a Floresta Negra e o Alto Atlas, escalou o
Kilimanjaro e os picos mais altos dos Pirinéus, Andes, Cáucaso e Alaska.
Subiu a vulcões, deu a volta ao mundo num navio. Nos Himalaias, chegou a
estar fechado numa tenda, sozinho, durante vários dias, paralisado pelo
frio. Também isso foi um treino útil. “Há certas semelhanças entre a montanha
e o que vou fazer agora”, explica ele. “A comida é a mesma”.
E também lá, nas
altitudes geladas, não é possível prever as situações de emergência, nem
treinar para elas. “Ninguém treina a queda de uma montanha”. No mar, ninguém
treina a experiência de uma tempestade. “Só se me metesse numa máquina de
lavar roupa”.
José Tavares tem
praticado regularmente o remo, no Clube Naval de Lisboa, que apoia o seu
projecto. Mas o treino mais importante é mental. “Imagino-me durante a
viagem. Tento viver as situações mentalmente. Até em sonhos”.
É por esse método
que José Tavares tem antecipado alguns dos problemas, e as formas de os
resolver, ou suportar. Condicionou-se ao ponto de sonhar com a viagem, para
lhe poder sentir o pulso, prever os contratempos interiores, que são os
mais perigosos. Os efeitos da solidão: a depressão ou a euforia, perder forças
e a vontade de continuar, ou cometer loucuras, provocadas pelo deslumbramento
ou excesso de confiança.
Na preparação da
viagem, José Tavares reuniu uma equipa de apoio que inclui técnicos de remo,
um nutricionista, etc. Tentou incluir também um psicólogo ou um psiquiatra.
Mas não conseguiu nenhum. Os especialistas da mente confessaram-se
impreparados para a situação. Não há ciência suficiente para isto,
explicaram alguns. Outros simplesmente não responderam aos emails nem atenderam
o telefone.
Para dar espaço e
tempo ao imponderável, tudo o que pode ser preparado foi-o ao pormenor. O
barco de remo oceânico, azul e branco, arredondado, tubular e extravagante
como uma nave de Julio Verne, pesa cerca de 500 quilogramas. José comprou-o
por 23 mil euros a um americano que fez com ele a travessia das Caraíbas.
Foi construído em 2009, chama-se Paraguaçu e tem duas cabines, cobertas,
uma, à proa, para dormir e descansar, e outra para guardar os mantimentos e
a água. Um dos compartimentos é estanque, permitindo o refúgio de tripulante,
mantimentos e equipamento no caso de o mar invadir toda a embarcação. Até
mesmo se ela virar.
A viagem, que terá
cerca de 5 mil quilómetros, deverá durar 112 dias. Incluirá uma paragem em
Cabo Verde e talvez outra no arquipélago de Fernando Noronha. Uma primeira
escala ocorrerá em Marrocos, de onde se fará a verdadeira partida, junto
ao Cabo Bojador, como Gil Eanes. A rota foi traçada, e alterada várias vezes,
por amigos matemáticos, com base na experiência de antigos navegadores.
Principalmente o outro aventureiro que fez um percurso idêntico, Alex
Bellini. Em 2005, o italiano viajou de Génova a Fortaleza em 226 dias, num
barco a remos. Cruzou o Mediterrâneo e depois o Atlântico, numa viagem de
10 mil quilómetros que fez dele uma estrela no mundo dos aventureiros.
José foi falar com
ele. Discutiram correntes e ventos, obstáculos e tempestades. A ideia
inicial era copiar o mais possível a trajectória de gago Coutinho e
Sacadura Cabral, que há 90 anos atravessaram o Atlântico de avião. Mas
Bellini sugeriu algumas alterações. As correntes puxam da linha do Equador
para Norte, na direcção do Golfo do México, disse ele. Será melhor, portanto,
seguir mais junto ao Equador.
O estudo das correntes
é fundamental, porque serão elas, em grande medida, que levarão o barco pela
rota desejada. Mas também o podem desviar, ou trazer para trás. Por vezes
será preciso recuar, para retomar o rumo aproveitando outra corrente, mais
favorável. Os ventos também podem arrastar a embarcação no sentido errado.
Nesse caso, José usará a “âncora” para ficar imóvel, até que a borrasca
acalme. Não uma âncora convencional, porque o mar é, naquelas zonas, demasiado
profundo, mas um sistema baseado numa espécie de pára-quedas. Principalmente
na zona do Equador, há ventos e correntes de sentido contrário, que obrigarão
o Paraguaçu a navegar para trás.
Está previsto que
as correntes e os ventos contribuam com um terço da força motriz necessária.
O resto terá de fazer-se com os remos. José tenciona remar dez horas por dia,
em média, o que representará um esforço superior ao que alguma vez terá feito
na vida. Em termos meramente físicos, tudo isso está calculado: implicará
o consumo de mais calorias do que as 4 mil que conseguirá ingerir por dia.
Por isso está previsto um emagrecimento de 10 a 15 quilos, apesar da
enorme quantidade de comida liofilisada que viajará no Paraguaçu, juntamente
com barras energéticas, frutos secos, chocolates, leite condensado,
tostas, coca-cola. Ao todo, mais de 200 quilos de mantimentos. E 150 litros
de água potável, como recurso de emergência, para o caso de avaria do dessalinizador
de água do mar por osmose.
O Paraguaçu tem
dois pares de remos e está equipado com dois painéis solares e duas baterias,
que fornecerão energia eléctrica para o GPS, instrumentos de navegação
e de comunicações, incluindo o computador e telefone de satélite com que
José enviará as suas crónicas para o Público.
Há também um
leitor de MP3, um fogão eléctrico e uma chapa para grelhar, caso o viajante
tenha tempo e sorte para pescar à linha algum peixe no alto mar. Não está a contar
com isso. Se suceder, será um momento de festa. Tal como quando avistar golfinhos,
se cruzar com algum veleiro de aventureiros, ou quando atravessar a linha do
Equador. Aí, José vai abrir uma cerveja para comemorar. Leva algumas, para
essas ocasiões especiais, em que fará uma festa no barco.
Os mantimentos
estão calculados para garantirem a sobrevivência durante 140 dias, sensivelmente
mais um mês do que o tempo previsto para a viagem. Uma margem de segurança
demasiado pequena para abarcar todo o tipo de emergências que podem ocorrer.
Antes de mais, as
tempestades. A época não deverá ser propícia às grandes tempestades tropicais,
mas há outras, de tipo diferente, que podem revelar-se igualmente perigosas
— curtas intempéries de meia hora, que não atingem terra e não chegam a ser
noticiadas nas televisões, mas são mais do que suficientes para engolirem
um barco a remos. As ondas podem fazer virar o barco, afundá-lo, ou simplesmente
enche-lo de água.
Além disso, há o
perigo de choque com um navio de grande porte. Apesar dos sistemas electrónicos
de navegação, a dimensão reduzida do Paraguaçu pode torná-lo invisível aos
radares.
As baleias também
não costumam dar boa sorte. Não que sejam agressivas, mas porque podem afundar
o barco com um golpe de barbatana, ou ao emergirem. “Não convém passar por
cima delas”, explica José.
Os tubarões, principalmente
o tubarão-tigre, podem causar danos no barco, ao roçarem o leme, o patilhão ou
o casco. Na sua proximidade, é também aconselhável não tomar banhos de
mar, embora isso não preocupe José: “Se houver peixes em redor do barco, significa
que não há tubarões”.
Um perigo muito
maior são os contentores à deriva. Os navios de carga perdem muitos contentores
nas suas viagens. Os enormes caixotes de aço ficam espalhados pelo oceano,
flutuando, com a maior parte da superfície submersa, como icebergs. É
muito difícil distingui-los, principalmente à noite, e o choque com um
destes monstros pode significar a destruição do barco, ou um rombo no casco
que o faria afundar.
Há no Paraguaçu uma
boa caixa de ferramentas, para efectuar qualquer tipo de reparações, e
José instalou dois cintos de segurança, para não ser cuspido com a violência
das ondas.
Leva a bordo equipamento
de rádio que lhe permitirá pedir ajuda em caso de emergência. O sistema EPIRB (Emergency
Position-indicating Radio Beacons) funciona com satélites e activa operações
de salvamento e resgate, que podem no entanto demorar horas ou dias a
chegar, e ser demasiado tarde. O melhor portanto é não contar com isso, e
estar alerta. Sempre alerta. Dormir é um risco. José Espera conseguir fazê-lo
umas 5 ou 6 horas por dia, não seguidas. Algumas durante a noite e outras à
tarde, em forma de sesta. Mas será sempre um sono leve, não vá ser interrompido
por algum contentor-iceberg, uma baleia ou uma tempestade.
Ao fim de alguns
meses, esta rotina poderá gerar um imenso cansaço, físico e psicológico.
Poderá perder-se a capacidade de remar, ou pior, a vontade de o fazer. O esgotamento
pode levar a uma letargia, um estado em que se perde a motivação para fazer
tudo. Haverá então de pôr em prática certas técnicas motivacionais. Será
preciso recapitular as razões que o levaram a partir. Na cabine de descanso
estão escritas algumas frases que se espera surtam o devido efeito, no
momento certo. “A dor é temporária, desistir dura para sempre” é uma dessas
frases.
José sabe que a
desistência seria um trauma para toda a vida, e não tenciona esquecer-se
disso. Porque num empreendimento destes não há segundas tentativas. “Se
falhar, nunca mais volto a tentar fazer isto. Ou se consegue ou não. Não
haverá mais oportunidades. Com outras aventuras foi diferente. O Monte
Branco, por exemplo, fiz três vezes. Mas isto não. É agora ou nunca. Por isso
desistir seria uma derrota, para mim próprio. Uma derrota com que teria de
viver a vida toda”.
Além de remar, de
dormir e de comer (muitas vezes ao dia), José tem uma lista de tarefas para
cumprir em cada dia: verificar os instrumentos, gravar notas para as crónicas
e para o livro que está a escrever, e que será um ensaio sobre a solidão. Além
disso, leva música para ouvir — rock dos anos 80, clássica e fado. E livros
- um volume sobre os vulcões da Europa e um exemplar da Ilíada, de
Homero.
José Giraldes
Tavares, de 45 anos, licenciou-se em Organização e Gestão de Empresas, noISCTE,
em 1992. Nessa altura, gostava de investir na bolsa, e pensava que poderia
fazer disso um modo de vida. Concluiu depois uma pós-graduação em Marketing
Internacional em Pforzheim, na Alemanha, e trabalhou como gestor de produto
e consultor de desenvolvimento organizacional em empresas multinacionais.
Fartou-se. Desiludido com a competição profissional, entre empresas e colegas
de trabalho, a falta de escrúpulos e valores humanos, as teorias do liberalismo
económico, começou a fazer viagens pelas montanhas. Primeiro as portuguesas,
de carro, depois noutros países e continentes. Sempre teve vontade de viajar.
De coleccionar viagens e lugares. Ganhou o hábito de, no final de cada ano,
fazer uma lista dos países e locais visitados. E desenhar os percursos
nos mapas que usava. Sempre gostou de mapas, mesmo antes de saber exactamente porquê.
Aos poucos, foi-se
embrenhando na aventura. Foi deixando o trabalho de economista e gestor,
para se dedicar cada vez mais à organização de eventos desportivos, de passeios
e expedições. Fundou o Clube Expedição, dirigiu a empresa Active Outdoors.
Foi monitor de canoagem e guia de montanha. Tornou-se professor de esqui,
actividade que mantém, em Espanha, durante todo o Inverno. Acabou por abandonar
o último emprego com economista, na Bosh. “Faltava-me a energia para continuar”,
diz ele. E foi escalar montanhas.
Cada vez mais
altas, cada vez mais difíceis. “Os ricos querem sempre ganhar cada vez mais
dinheiro. Com as montanhas é a mesma coisa. Queremos sempre mais”. E
depois as próprias montanhas já não eram suficientes. Não as escalou todas.
É certo que falta o Everest, mas não tentou, nem planeia fazê-lo, simplesmente
“porque é muito caro”.
Imaginou então
outras façanhas. “A necessidade de aventura está dentro de nós. E pode
surgir à superfície em qualquer altura, em qualquer idade, em qualquer
fase da vida”. José deixou de encarar as aventuras como coisas estranhas. Passou
a ser a sua forma natural de viver. “O contrário, não viver em aventura, é
que é estranho”.
Deixou de conseguir
conter-se. Quando imaginava uma viagem, uma expedição, sabia que teria de
tentá-la, mais tarde ou mais cedo. “A melhor maneira de tirar uma coisa da
cabeça é fazê-la”.
E foi assim que
decidiu atravessar o Atlântico a remos. “Se não fizesse isto ficaria irrequieto
o resto da vida”, explica ele. “Faço isto para me acalmar — o que duvido que
aconteça”.
Nos últimos anos,
José tornou-se um estudioso das grandes aventuras e aventureiros. Escreveu
vários livros, sobre expedições, como o Aventura ao Máximo (Europa-América,
2008) sobre os grandes exploradores portugueses, e Os Novos Exploradores e
a Aventura dos Sentidos. Começou depois a redigir um grande ensaio sobre a
solidão, que tenciona concluir após a sua viagem transatlântica.
A travessia
Portugal-Brasil a remos tem para ele, além da significação pessoal, um sentido
político. Quer transmitir uma mensagem ecológica, através do seu próprio
exemplo. Fazer a apologia da energia solar e dos remos, a eco-eficiência.
Quer alertar para os perigos das alterações climáticas, a destruição dos
glaciares e das florestas, apelar para a racionalização dos recursos
energéticos, sem recurso a fontes de energia fósseis.
Nos últimos anos,
José Tavares tem desenvolvido uma concepção própria das viagens de aventura
e suas funções: podem ser vistas como “desporto de intervenção”, servindo
para lutar por diversas causas, onde as formas convencionais de acção se
têm revelado ineficazes. É uma nova perspectiva, que pode voltar a dar sentido
às grandes viagens. E também ajudar a financiá-las, tornando-as possíveis.
Até meados do
século XX, as grandes expedições e viagens destinavam-se acima de tudo a
descobrir e dar a conhecer lugares até então desconhecidos, ou a onde nunca
ninguém tinha ido. Muitas das viagens tinham mesmo como objectivo ajudar a
desenhar os mapas, onde vastas áreas do planeta permaneciam em branco.
Mas a meio do
século XX já não havia zonas por explorar, e as aventuras mudaram o
seu propósito: eram agora explorações, sim, mas no interior dos indivíduos.
Passaram a ser testes de resistência individual, ou oportunidades para a
reflexão e a exibição de qualidades pessoais, de heroísmo, capacidade para
enfrentar e compreender o desconhecido, etc.
As viagens
solitárias começam nessa altura. Perdem o carácter pioneiro, tornam-se “aventuras”
no sentido subjectivo do termo. Para as realizar, era geralmente necessário
ter fortuna pessoal, ou uma filosofia de vida eremítica.
Recentemente,
surgiu um novo tipo de viagem, associada a causas para as quais se pretende
chamar a atenção. A aventura em si serve como pretexto para que os media abordem
as questões de ordem política ou social que o aventureiro decidiu colocar sob
os holofotes. O objectivo é alertar a consciência colectiva, através do
esforço e abnegação de um indivíduo, que servirá de porta-voz perante os
jornalistas.
Um exemplo deste
tipo de acções é o protagonizado pelo sul-africano Mike Horn, que tenta
levar às novas gerações a mensagem de “salvar o planeta”. Em 2000, fez uma
viagem à volta do Equador sem usar qualquer meio de transporte motorizado, e
depois criou o projecto Pangaea, em que leva, num veleiro, jovens de todos os
continentes numa volta ao mundo. Depois de observarem a beleza do planeta,
os jovens regressarão aos seus países como embaixadores de uma filosofia ambientalista,
de preservação da Natureza.
A viagem de José
Tavares insere-se neste novo movimento. Simbolicamente, no final, em Junho,
José visitará a portuguesa Margarida Botelho, que está no Brasil a desenvolver
um projecto com tribos da Amazónia. Esse encontro representará o terminus
da viagem e o seu êxito, com a veiculação da mensagem que lhe está
associada.
Tudo isto José tentou
explicar a várias entidades e empresas, a quem pediu apoios e patrocínios.
Ninguém se sensibilizou. Responderam-lhe que, com a crise, já ninguém está
muito preocupado com essas causas.
José reconhece que
isso é verdade, o que lhe dá mais um motivo para não desistir. “Os portugueses
eram pobres. Depois passaram a comodistas”. A sua cruzada é também contra
isso. “A viagem, a aventura, é uma metáfora da vida. Vamos ter muita dor,
muito sacrifício, muito desconforto, para depois saborear dois ou três dias
de felicidade. A vida também é assim”.
Para José Tavares,
a viagem que inicia hoje é a “aventura da sua vida”. Vai usar a solidão para
reflectir, para se por à prova, para provar a si próprio e a todos que não
desiste. E para escrever sobre isso, contando que a sua experiência e exemplo
venham a ser úteis para os outros. Após a viagem, tenciona publicar o
livro, dar conferências, fazer comunicações em escolas e ministrar cursos
de motivação, em empresas.
A autoridade para
tudo isto vir-lhe-á do êxito da própria viagem, se ele se verificar. Terá
então provado que os seus valores eram correctos e autênticos. “Para conseguir
levar até ao fim uma aventura destas é necessário uma grande maturidade e um
grande conhecimento de nós próprios”. Não é um empreendimento para novatos.
Os aventureiros que se lançaram em jornadas semelhantes são todos homens
maduros, acima dos 40 anos, e geralmente com uma vida social e familiar
estável, conta José. Ele próprio é hoje divorciado, mas diz que, na sua maioria,
os seus “colegas” têm mulher e filhos, que lhes dão todo o apoio. “Isto são
coisas para gente madura. É certo que, com a idade, a força e resistência físicas
diminuem, mas ganha-se outro tipo de capacidades”.
É necessário temperança,
humildade, medo, contenção e algum cepticismo. Não deixar que o desespero
nos vença, mas também não nos deixarmos dominar pela alegria. O excesso de
confiança, ou até de felicidade, pode ser fatal.
Um dos maiores desejos
de José é encontrar golfinhos. Já leu relatos de episódios incríveis. Golfinhos
que acompanham os barcos, saltam e brincam, como se compreendessem os pensamentos
mais íntimos dos navegadores solitários. José anseia tanto por um momento
desses, sonhou tantas vezes com ele, que tem medo do que possa acontecer.
“Sei que não vou resistir a ir nadar com os golfinhos, e posso esquecer-me
do tempo e de tudo o resto, e perder-me do barco”.
É uma preocupação
real, tal como as tempestades ou os contentores flutuantes. Os golfinhos
são também um perigo. Com seu poder de sedução, podem levar o navegador a
perder-se no mar. Convém também estar atento a sereias e mostrengos. Nada é
impossível, em quatro meses de solidão absoluta. José não o ignora. Tudo o
que sonhou já é imenso. O que vai viver será ainda maior.
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