sexta-feira, 15 de março de 2013

Portugal: PS ACUSA CAVACO DE ESTAR A PROTEGER O GOVERNO DE PASSOS COELHO

 


Rita Tavares – Jornal i
 
Mais um prefácio entalado nas gargantas socialistas que acusam Cavaco Silva de estar a alinhar com o actual governo, atacando Sócrates
 
A cadência tem sido de quase um socialista indignado por dia com mais um prefácio escrito pelo punho do Presidente da República, o segundo a não poupar as responsabilidades dos governos de José Sócrates na crise actual. Mas o incómodo vai mais além, com o PS a apontar mesmo uma linha de actuação dupla a Cavaco Silva que acusa de estar a proteger o actual executivo ao contrário do que fez com o anterior.
 
E a conversa vem das várias correntes do PS, quer a mais alinhada com José Sócrates e que tem pugnado pela protecção do seu legado, como pela actual direcção. Logo no dia em que conheceu o conteúdo do prefácio do livro “Roteiros VII”, o líder parlamentar Carlos Zorrinho escreveu no seu blogue sobre o “dono da bola”, apontando a Cavaco Silva um papel mais activo perante as manifestações que se vêem na rua, nomeadamente a de 2 de Março. “Quem não se recorda do pontapé fulminante com que Cavaco Silva marcou golo na baliza do governo minoritário de José Sócrates, traçando num simples discurso de posse o destino do governo em funções?”.
 
Zorrinho refere-se à frase do “há limites para os sacrifícios que se podem pedir aos portugueses” lançada por Cavaco Silva nesse mesmo dia e quando o governo apresentava o PEC IV, mais um pacote de austeridade adicional que acabou por ser levado à apreciação parlamentar saindo chumbado pela oposição e deitando o governo por terra. Essas palavras de Cavaco Silva ficaram atravessadas no PS que desde então não poupa o Presidente.
 
E o prefácio conhecido no sábado passado, pela passagem de dois anos do segundo mandato de Cavaco Silva em Belém e desse mesmo discurso que corroeu o governo de Sócrates, volta à carga sobre os antecedentes da crise deitando culpa ao executivo que esteve em funções entre 2005 e 2011. Aliás, Cavaco não falha nada na apreciação deste período de tempo específico e garante que “a principal razão da crise portuguesa reside na acumulação insustentável de desequilíbrio das contas externas - entre 2005 e 2010, o défice anual foi, em geral, superior a 9% do PIB”. E fala também do endividamento líquido da economia para o exterior que “subiu de 57,4% do PIB, no fim de 2005, para 107,2% em 2010”.
 
A resposta mais contundente é de Sérgio Sousa Pinto que, no facebook, diz mesmo que “foi má ideia interromper o torpor presidencial. Calado o Presidente é muito mais suportável”. Mas o deputado diz mais: “A Sócrates não ocorreria escrever prefácios para lhe dizer o que pensava dele e das suas criaturas, que sentou no actual governo por ressentimento e irresponsabilidade.”
 
Um arraso que é seguido por José Junqueiro que contrapõe à análise da crise feita pelo Presidente outros dados: “A recessão do primeiro trimestre de 2011 (0,9%) degradou-se até ao final desse ano (1,9%). No final de 2012 degradou-se ainda mais e atingiu -3,2%. As políticas unilaterais de austeridade sobre austeridade falharam.” O vice-presidente da bancada socialistas diz mesmo que “o Presidente da República não fala porque acha que o prefácio de um livro o liberta de todos os silêncios e de todas as ausências. O grande timoneiro saiu do barco antes de todos os outros”.
 
Mas há mais. Vital Moreira atacou em dois posts distintos no seu blogue. E sobre o período que Cavaco Silva escolheu analisar para falar dos antecedentes da crise económica e financeira, Vital diz que “não fica bem a um Presidente da República que defende uma magistratura presidencial equilibrada e responsável dar uma versão politicamente enviesada da história recente”.
 
O eurodeputado eleito pelo PS diz que Cavaco se esquece do “bem sucedido processo de consolidação orçamental dos anos anteriores” a 2009 e 2010 e que os valores do défice apontados no prefácio presidencial “foram o resultado directo da crise financeira externa e da crise económica que se lhe seguiu”, um argumento recorrente dentro do PS. “Bem como da política de estímulo à economia e de apoios sociais adoptados pelo governo Sócrates para tentar minorar os efeitos da crise, política que ninguém condenou e quase toda a gente aplaudiu”, continua o socialista. “Cavaco alinha inteiramente com a narrativa de Passos Coelho, de responsabilização do anterior governo”, acrescenta Vital Moreira para concluir que “o ódio a Sócrates não pode justificar tudo; e o ódio político não é bom conselheiro presidencial”.
 
Não é a primeira vez que um prefácio de Cavaco Silva ataca Sócrates e deixa incomodados os socialistas. Há um ano, pela mesma ocasião, o chefe de Estado publicou um outro texto, também num livro sobre a iniciativa presidencial “Roteiros” onde acusava Sócrates, de uma forma clara e pouco comum na actuação de Cavaco, de “deslealdade institucional”. Em causa estava a apresentação do PEC IV em Bruxelas, antes de o ter dado a conhecer cá dentro, nomeadamente ao Presidente da República. A relação que já vinha tensa caiu aí por terra e as mazelas ficam até hoje, de um lado e outro.
 

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