Baptista-Bastos –
Diário de Notícias, opinião
Para que serviu o
último Conselho de Estado? O tema [Portugal no pós-troika], além de absurdo
pela inoportunidade, quando o País está a cair aos pedaços, mereceu de muitos
conselheiros, entre os quais o prof. Jorge Miranda, e Carlos César,
ex-presidente do Governo Regional dos Açores, críticas acerbas. O tom geral dos
comentários é o de que o homem está débil de meninges. Outros dizem que a
desorientação política em que se encontra, depois da miséria do discurso de 25
de Abril, levou-o a ensaboar a própria representação, na vã tentativa de
recuperar a visagem. E, ainda, uns terceiros ou quartos que os sombrios
desígnios da ideologia dominante, as contradições de um tempo intrincado que
não consegue decifrar, impeliram-no e à sua cabecinha a múltiplas atitudes
injustificáveis em quem desempenha tão altas funções.
Ninguém sabe o que
se passou nas sete horas da magna reunião. Um comunicado de três parágrafos
resumiu, desajeitadamente, o que eles entenderam ser justo o povoléu saber. O
"não", violento pela secura, ao anúncio do que se passou entre os
dezassete parceiros, constitui outra prova do desprezo que as
"instituições" por nós dão testemunho. E a verdade é que temos o
direito de conhecer o que a todos, sem excepção, diz respeito. Mas o sigilo, o
silêncio e a escusa a que nos habituou este simulacro de democracia está a
adensar--se, de modo que só uma pequena clique é sabedora dos enredos.
É claro que ninguém
acredita que as sete horas decorreram em pacífico paleio. A conversa, em alta
voz, entre Passos e Bagão Félix, ocorrida na escadaria, após a iluminada
concentração de sábios, é de molde a perceber-se que as águas estiveram
agitadas.
É impossível, pelo
menos numa situação equilibrada, não colocar em discussão o terrorismo, sob o
qual estamos submetidos. A Europa da solidariedade não passa de um território
no qual se digladiam, com ferocidade inclemente, claros jogos hegemónicos e
imposições de servidão. A escolha dos lugares a que entendemos dever pertencer
é uma das questões fundamentais da nossa época. E a principal obrigação a que
temos a imposição moral de atender é a de reconhecer este totalitarismo
mascarado. Na Europa, as divisões, como sempre historicamente aconteceu,
representaram o conflito entre dominantes e dominados. A Alemanha, ontem como hoje,
tem desempenhado um papel sinistro neste xadrez sem regras. A obediência à lei
do mais forte corresponde a uma ideia messiânica, que embala a boa consciência
dos mentirosos e dos canalhas. Quando ouvimos o "Acordai!", de
Lopes-Graça e José Gomes Ferreira, talvez percebamos o que nos liberta e o que
nos acorrenta. Tudo, na vida, são preferências que comportam uma posição ética.
O tema escolhido pelo dr. Cavaco para discussão no Conselho de Estado define um
critério e projecta um carácter.
(Por decisão pessoal,
o autor do texto não escreve segundo o novo acordo ortográfico)
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