domingo, 9 de junho de 2013

Angola – Malária: AS CRIANÇAS SÃO AS PRINCIPAIS VÍTIMAS DA DOENÇA

 

Lourenço Manuel – Jornal de Angola, reportagem
 
A malária continua a ser a principal causa de morte na província do Kuando Kubango. O Executivo faz das tripas o coração para combater a doença, mas a verdade é que o número de óbitos aumenta cada ano que passa, sendo as crianças as principais vítimas.
 
Para fazer face à situação, o Governo Provincial vai construir nos próximos quatro anos mais um Hospital Geral com 450 camas, um centro materno infantil com 300 camas e ao mesmo tempo intensificar as campanhas de combate à malária.

O Hospital Pediátrico de Menongue, inaugurado em Setembro de 2012, já está a rebentar pelas costuras, devido à falta de camas para acomodar os doentes. Realizou desde a inauguração 19.470 consultas externas a crianças e adolescentes, das quais 3.520 foram internadas e 381 morreram, em consequência do paludismo e de diarreias agudas.

A directora do Hospital Pediátrico, Elsa Kanengo Kalenga, disse à reportagem do Jornal de Angola que o edifício foi concebido apenas para internar 30 doentes, seis em cada enfermaria. Mas a pressão é muito grande e quatro gabinetes foram transformados em enfermarias para receber crianças em estado grave. Quando a afluência é grande, disse, os corredores têm sido a tábua de salvação.

Neste momento estão internadas 63 crianças com problemas graves de malária, diarreias agudas, mal nutrição, gripes, pneumonias, desidratação, bronco-pneumonias e anemias. Estas doenças, explicou, têm vindo a provocar estragos no seio das crianças, muitas das quais morrem em menos de 48 horas, porque chegam demasiado tarde ao Hospital Pediátrico.

Elsa Kanengo Kalenga fez um vigoroso apelo aos pais para que, logo ao primeiro sinal de indisposição ou de febre na criança, a levem com urgência ao posto de saúde mais próximo, para que seja vista por um especialista.

No Kuando-Kubango há o hábito de levar as crianças doentes aos curandeiros e só depois aos centros de saúde e hospitais. Em muitos casos, já nada há a fazer e as crianças morrem mais devido à negligência dos pais do que por causa da doença.

Elsa Kalenga disse que à semelhança dos anos anteriores, as baixas temperaturas que se fazem sentir a na região matam os mosquitos e por isso há menos casos de paludismo. No período das chuvas, o Hospital Pediátrico realiza diariamente entre 130 a 150 consultas e interna 20 doentes.

A unidade sanitária que dirige tem serviços de cirurgia, estomatologia, Raios X. O serviço de hemoterapia não tem sangue e quando há necessidade de fazer transfusões “recorremos aos familiares dos pacientes”, frisou. A escassez de energia eléctrica é acentuada. O único gerador de 60 KVA instalado no hospital não suporta trabalhar 24 horas e houve períodos em que os profissionais de saúde tiveram que trabalhar à luz de velas ou lanternas devido a avarias no gerador. A Empresa Nacional de electricidade está a fazer esforços para resolver o problema. O Hospital conta com cinco médicos e 60 enfermeiros que garantem a assistência permanente às crianças. Uma farmácia interna e outra externa fornecem os medicamentos aos pacientes, mas ainda há casos em que os familiares têm de fazer recurso ao mercado paralelo porque falta um ou outro medicamento.

Por dentro do hospital

Na sala de observação daquela unidade hospitalar o movimento é intenso. Os médicos e enfermeiros atendem dez crianças com sintomas graves de malária. As mães estão presentes enquanto o soro, misturado com quinino e vitamina B, escorre para as veias das crianças.

Mangama Oling, director clínico, é o cicerone da nossa reportagem e levou-nos a conhecer as áreas de cuidados intensivos, onde encontramos Artinas Domingas, de apenas dez meses, e Paulina Noé, de quatro anos, que brincavam descontraídas. “Estas meninas chegaram num estado crítico, mas agora e graças a Deus conseguimos dar a volta por cima e estão prontas para ter alta”, disse o médico.

Augusta Tchinimbo, de dois anos, apresenta um aspecto cadavérico e está na sala reservada aos casos de malnutrição. Está numa enfermaria com outras quatro crianças. Ali recebem tratamento especial e uma alimentação rica em proteínas à base de leite, bolachas e um suplemento alimentar rico em vitaminas, método que já salvou muitas vidas.

A visita guiada terminou numa enfermaria onde estão internadas cinco crianças com problemas graves do aparelho respiratório, devido às baixas temperaturas que se fazem sentir na região.

Apesar da gravidade das doenças nenhum paciente corre risco de vida e se tivessem chegado ao hospital logo que a doença se manifestou, já estavam curadas.

Higiene e alimentação

A higiene no Hospital Pediátrico é motivo de satisfação dos pais que acompanham os filhos internados. Os pacientes têm direito a três refeições por dia.

Esperança Fernando, moradora no bairro Tunga Ngó, está ao lado da filha, Raquel Vihemba, internada com paludismo. Contactada pela nossa reportagem, elogiou a qualidade dos serviços prestados naquele hospital: higiene, alimentação e atendimento médico.

A directora do Hospital Pediátrico deseja que estes serviços cheguem também a outras unidades sanitárias porque os profissionais, incluindo as equipas médicas de serviço, não abandonam os seus locais de trabalho já que a alimentação servida é de muito boa qualidade.

Luta contra a malária

O director provincial da saúde, Fernando Cassanga, questionado sobre o elevado número de mortes por malária, disse que existem infra-estruturas hospitalares e medicamentos suficientes para responder às necessidades: “o problema é que a maior parte da população ignora as acções de informação e educação para a saúde, promovidas pelo programa provincial de combate à doença.

Na província existe um mecanismo de informação, educação e comunicação que tem como função educar as comunidades sobre as boas práticas a terem com o saneamento básico e como usar o mosquiteiro tratado com insecticida, mas “as pessoas ignoram os nossos apelos e ao redor das casas, além do capim, fazem plantações de milho e amontoam lixo. Estes são locais apropriados para os mosquitos se multiplicarem”, disse Fernando Cassanga.

Este ano, realçou, o Ministério da Saúde vai desenvolver no Kuando-Kubango um projecto que vai permitir que mais de metade da população de cada aldeia, comuna ou município tenha acesso aos mosqueteiros tratados com insecticida, no quadro do programa da luta contra a malária.

Estruturas adequadas

Fernando Cassanga informou que a malária provocou muitas mortes entre os adultos no município do Rivungo. No espaço de dois meses matou 40 pessoas em menos de 48 horas. Apresentavam febres muito altas, dores de cabeça e rigidez dos membros. As populações pensavam que era uma doença estranha, mas uma equipa médica enviado ao município confirmou que era paludismo em fase avançada.

Durante o ano passado e no primeiro semestre deste ano, o Hospital Geral realizou 43.684 consultas, 30.738 dos quais relacionadas com a malária, que provocou a morte de 331adultos.

Foto: Lourenço Manuel
 

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