Pedro Marques Lopes
– Diário de Notícias, opinião
1. Há vozes
importantes e sérias na maioria que vociferam agora contra a troika e o
memorando. Não vale a pena falar dos que defendem o memorando como o atacariam
se fossem essas as ordens dadas pelo chefe. Nem os que sem um pingo de vergonha
o negociaram, escreveram o programa de governo e agora fingem não ter nada a
ver com o assunto. Nem os que diriam o que quer que fosse por motivos meramente
venais. Nem os que ontem se lembraram de frentes comuns contra a troika e que
morreriam pela social-democracia em véspera de eleições autárquicas. E nem
pensar em lembrar as palavras de Gaspar sobre o memorando e a sua recente
afirmação sobre a sua deficiente negociação. Nenhum desses merece qualquer tipo
de análise, uns por manifesta irrelevância, outros para não prejudicar o nosso
sistema nervoso.
Interessa pensar em
gente que contará para o futuro do PSD e do CDS, que tem apoiado o Governo e
que tem vindo a deixar cada vez mais claro o seu desagrado com o actual estado
de coisas. Miguel Frasquilho e João Almeida são dois bons exemplos.
O que estes e
outros dirigentes do PSD e do CDS parecem esquecer é que Governo, troika,
memorando e suas revisões são indissociáveis. Criticar a troika ou pedir uma
mudança de atitude dos credores, como fez Miguel Frasquilho, é criticar
violentamente o Governo e exigir uma mudança, que nunca acontecerá, na atitude
do Governo.
Quantas vezes será
preciso lembrar as palavras de Passos Coelho dizendo que o programa do Governo
e do PSD era o memorando da troika? Quantas vezes será preciso recordar que era
preciso ir além da troika? Mas não é preciso ir muito atrás no tempo. No
momento em que a própria troika já percebeu que o plano não está a resultar e
que, sem um pingo de respeito pelas vidas que destruiu, pelas empresas que
faliu e pelo desespero que semeou, exibe publicamente o triste espectáculo do
passa-culpas entre os seus membros, Gaspar diz no Parlamento que "não é
verdade que o programa esteja a falhar" e que alguns dos problemas na
actual execução orçamental se devem às más condições atmosféricas do primeiro
trimestre do ano.
Que parte das
pessoas responsáveis do PSD e do CDS ainda não perceberam quando lhes dizem que
este Governo não mudará de rumo porque de facto acreditam nesta loucura? Será
que nem as medidas como o corte dos 4 000 milhões de euros disfarçada de
reforma do Estado sem critério ou plano e à margem do memorando não as fazem
perceber o embuste? Como é que aceitam participar na conversa sobre ser preciso
um orçamento rectificativo por causa do Tribunal Constitucional, sabendo que
isso não passa duma vergonhosa mentira? Não sabem que a seguir a este
rectificativo se seguirá outro porque, pura e simplesmente, a receita não está
a resultar? Não saberão que este Governo acredita mais no programa da troika do
que a própria troika? Ignoram que a grande maioria das medidas de austeridade
postas em prática são da iniciativa do Governo e vão muito para além do
acordado?
O problema é que
sabem de tudo isto, como sabem do empobrecimento generalizado, do desemprego
que fará emigrar os melhores duma geração e mandará para a miséria os que não
poderem sair do país. Conhecem melhor que ninguém o que este Governo está a
fazer à nossa comunidade e ao nosso futuro comum. Já perceberam a moral
enviesada que pretende castigar o suposto comportamento mandrião do passado e
que pretende criar o homem novo.
As críticas
violentas à troika ouvidas esta semana no Parlamento por deputados da maioria
apenas aparentemente foram feitas ao BCE, à Comissão e ao FMI, foram, sim,
direitinhas ao Governo. Foi o maior acto de contestação interna desde o
episódio da TSU.
É tempo de as
pessoas do PSD e do CDS que sabem para onde o Governo nos está a levar
assumirem as suas responsabilidades e mostrarem que há gente patriota e com
sentido de Estado nos dois partidos da coligação. Chega de medo. Os partidos e
sobretudo Portugal precisam como nunca de gente corajosa.
2. Não é
propriamente novidade para ninguém que os candidatos às câmaras municipais pelo
PSD irão tentar falar o menos possível da governação. Mais, ninguém ficará
surpreendido se desatarem a criticar violentamente o Governo. Agora ver
candidatos às principais câmaras do país, e até um ex-presidente do partido, a
não colocar o símbolo do partido nos cartazes de campanha é, no mínimo, faltar
ao respeito à história do PSD e aos seus militantes. Apesar destes fatídicos
últimos anos o PSD tem uma história de que se pode orgulhar tanto no governo do
país como na gestão autárquica.
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