Ricardo David Lopes
- Sol
A entrevista
televisiva do Presidente angolano permitiu “claramente desanuviar” alguma
tensão entre os dois países, gerada por “sectores minoritários”, disse ao SOL o
secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação português,
Francisco Almeida Leite.
“A entrevista
acertou no alvo”, considerou Almeida Leite, que falava ao SOL à margem da
comemorações do Dia de Portugal em Luanda. “Muita gente precisava de ouvir da
boca do senhor Presidente que o nível das nossas relações não é afectado por
sectores minoritários quer da sociedade angolana, quer portuguesa”,
acrescentou, aludindo a notícias surgidas nos últimos meses.
Outro tipo de
tensões foram despertadas pelo facto de a SIC ter sido escolhida para José
Eduardo dos Santos para pôr termo a 10 anos de silêncio televisivo (a última
entrevista foi à brasileira Globo). A Presidência sofreu fortes críticas de
vários comentadores angolanos pelo facto de a entrevista – transmitida em
Angola pela TV Zimbo – não ter sido concedida a um órgão nacional. E, por outro
lado, não esconderam a estranheza de o canal português ser de um grupo de
comunicação com um histórico de relações tensas com Luanda.
Ao SOL, fontes da
Presidência angolana invocaram que a entrevista foi solicitada por um canal de
televisão de Israel para ser também transmitida pela SIC e Globo – uma versão
que contraria a da direcção de informação da TV portuguesa, publicada no sábado
passado no Expresso.
Parceria
estratégica
O secretário de
Estado, que termina hoje uma visita oficial de cinco dias a Angola, debateu com
governantes locais a realização da primeira cimeira bilateral, no segundo
semestre, que deverá “colocar as relações mútuas noutro patamar, de parceria
estratégica”.
Sublinhando que “a
sociedade civil e o Governo português são muito amigos de Angola”, garantiu que
os dois Estados apoiam “investimentos cruzados e o cruzamento de participações
entre empresas”. “Também é isso que se pretende fomentar com a realização da
cimeira bilateral”, que se prevê ocorrer em Luanda no segundo semestre deste ano.
Almeida Leite
explicou que, actualmente, as relações entre os dois países estão baseadas em
programas plurianuais – Programa Indicativo de Cooperação –, mas que “chegou o
momento de avançarem um patamar”. O objectivo é a criação de uma “parceria
estratégica, que passa por traçar metas em vários domínios, avaliadas numa base
anual ou mesmo semestral”.
Cavaco no lugar de
Passos
“Não queremos uma
relação de passado, mas de futuro, e ambos desejamos uma cimeira com conteúdo e
resultados”, afirmou, elegendo a necessidade de protecção dos investimentos
recíprocos, a educação e capacitação de quadros, a saúde, a agricultura e o
desenvolvimento sustentável como “prioridades” na agenda do encontro, que está
a ser preparado, para já, ao nível técnico.
Também Manuel
Augusto, secretário de Estado angolano das Relações Exteriores, considerou que
a cimeira é o “ponto alto” da relação entre os dois países, este ano.
Em declarações aos
jornalistas após um encontro com Almeida Leite, no início da semana, o
governante disse esperar que, no decorrer da cimeira, os Presidentes José
Eduardo dos Santos e Cavaco Silva possam “marcar uma nova etapa nas relações
entre os dois países”.
Contudo, a presença
dos dois chefes de Estado na cimeira bilateral não é ainda uma certeza, ainda
que essa seja a situação “ideal”, soube o SOL. Em causa está o facto de este
modelo de cimeira ser ‘pioneiro’ e levantar questões protocolares que os dois
países estão a tentar resolver. Em regra, as cimeiras bilaterais são ao nível
de primeiros-ministros, ou seja, chefes de Governo, mas em Angola este é
simultaneamente o Presidente. Deve, portanto, ter como interlocutor
privilegiado Cavaco Silva, e não Passos Coelho. A solução, contudo, “deverá ser
encontrada”, porque a cimeira é do interesse de ambos os países ao mais alto
nível.
Nada de novo para a
oposição
A reacção dos
partidos da oposição à entrevista de José Eduardo dos Santos não se fez
esperar. “Para ser honesto, a entrevista não traz nada de novo. Não traz uma
reflexão de vulto sobre os problemas actuais que Angola vive”, considerou
Alcides Sakala, o porta-voz da UNITA.
Para Sakala, José
Eduardo dos Santos “não se assumiu como presidente de todos os angolanos,
porque falou mais na perspectiva do MPLA”.
Já para o líder da
CASA-CE, Abel Chivukuvuku, “o Presidente já não tem resposta para os desafios a
que Angola faz face e, por isso, deve abandonar o poder”. “Chegou o tempo de
sair, porque já não está à altura dos desafios do futuro”, disse, acrescentando
que, “a mudança será inevitável em 2017 ou antes disso”.
*com Carlos Ramos
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