segunda-feira, 17 de junho de 2013

Portugal: A GREVE AOS EXAMES



Ana Sá Lopes – Jornal i, opinião

A classe dos professores também foi escolhida para as manobras sacrificiais

Mesmo entre alguns professores e dentro do tradicional eleitorado da esquerda, a convocação da greve para o dia dos exames causou, se não oposição imediata, mixed feelings. Talvez por isto António José Seguro se tenha recusado sempre a responder directamente quando foi interrogado sobre o facto da greve ter sido marcada para o dia dos exames, e talvez também por isto o governo tenha pensado que conseguiria vencer o braço-de- -ferro, levando os professores a desistirem ou, em alternativa, a serem enxovalhados perante o tumulto da opinião pública. Assim, o governo "ganhava" - e o governo precisa de ganhar alguma coisa, porque está a perder tudo.

O ministro Nuno Crato sobrevalorizou a dimensão do "ódio popular" que iria encurralar os professores grevistas. É claro que até socialistas podem - como o fez Francisco Assis, uma alegada esperança do PS - considerar "ignóbil a convocação de uma greve de professores para o primeiro dia de exames nacionais", comparando-a aos "médicos que decidissem fazer greves às urgências hospitalares. Incompreensível, indigno, inaceitável". Mas, ao contrário das expectativas do governo, a maioria da população não ficou em estado de choque com os professores. Revê-se neles, partilha com a classe docente uma acelerada perda de estatuto e a iminência do desemprego. Tal como outros estratos sócio-profissionais - nomeadamente os restantes funcionários públicos e os pensionistas - foi também escolhida pelo governo para as manobras sacrificiais para credor ver e aplaudir. No caso dos professores, tudo é agravado pela campanha contra a escola pública há anos levada a cabo por iminentes intelectuais em que o ministro Crato se revê. Aliás, dentro do PSD e do CDS existe uma séria e assumida corrente que defende o progressivo fim da escola pública em favor da contratação com os privados. Mas hoje - mais do que há quatro ou cinco anos - os portugueses tomaram consciência de que possuem serviços públicos de excelência na saúde e na educação. E que todo este adquirido (adquirido aos poucos e devagarinho desde 25 de Abril de 1974) corre o risco de implosão em nome do cumprimento das exigências da troika e da agenda do governo português que em muitos aspectos se confunde. De resto, o legislador, quando decidiu o direito à greve, não a restringiu aos feriados e dias santos e definiu serviços mínimos. O anúncio do governo de que vai mudar a lei da greve (para a evitar?) não pode ser levado a sério. É mesmo só um sinal de desespero.

Sem comentários:

Mais lidas da semana