Martinho Júnior,
Luanda
1 – A família
Thatcher, oficialmente e na vida privada, esteve (e está) ligada a questões que
se prendem à energia (petróleo) e às finanças, neste caso seja àquelas que nas “offshores”
fogem ao fisco, seja aquelas de carácter especulativo, o que contraria de certo
modo o nome de “dama de ferro” por que foi conhecida Margaret Thatcher…
A história moderna
das Malvinas enquanto colónia britânica tem que ver, entre outras coisas e conforme
tive oportunidade de antes abordar, com a oportunidade de explorar o petróleo
na sua enorme plataforma marítima e nas 200 milhas para leste, além da
disponibilidade existente ao redor dos territórios insulares da Geórgia do Sul,
de Tristão da Cunha e das Sandwich…
A guerra pela posse
das Malvinas (travada entre 2 de Abril e 14 de Junho de 1982) é também uma
guerra pela posse do petróleo, para lá das contradições históricas: quem
vencesse teria a oportunidade de ter nas suas nãos as rédeas e as condutas da
futura exploração numa região Atlântica praticamente virgem e com uma reserva
estimada em cerca de 8 biliões de barris...
O império contudo
reagiu de forma inequívoca: o seu domínio no Atlântico Sul e em direcção à
Antárctida era para ser preservado numa geo estratégia a muito longo prazo.
Significativamente
a Grã Bretanha – Reino Unido respondia à invasão da ditadura da Argentina, por
via do Governo de Margaret Thatcher, com a “Operation Corporate”!
2 – Enquanto
Margaret Thatcher completou um “respeitável” percurso político oficial (“respeitável”
para com a aristocracia financeira global), a sua família e em especial o seu
turbulento filho “Sir” Mark Thatcher, fruto de sua educação e do
conservadorismo ideológico de seus pais, foi vivendo uma vida de aventureiro “play
boy”, com episódios que foram tocando a raia dos escândalos públicos.
É evidente que ele
estava à vontade para tal e sempre que foi necessário o socorro não lhe faltou,
pois o seu exacerbado e irreflectido egoísmo, compreensível apanágio das elites
capitalistas, é típico de quem procura a todo o transe alcançar lucros, mesmo
seguindo trilhas menos ortodoxas e como tal “desculpável”…
A determinada
altura da sua vida “Sir” Mark Thatcher instalou-se na cidade do Cabo, entre
1996 e 2004, onde se inspirou decerto no elitismo característico do império
britânico conforme “a visão africana” de Cecil John Rhodes.
Do Cabo partia-se e
parte-se para o Cairo ou Jerusalém e também para a Antárctida, onde a África do
Sul possui uma estação de presença e de investigação há mais de 50 anos…
A África do Sul
aliás, cruza interesses com os restos do império britânico no Atlântico Sul e a
cidade do Cabo desempenha nesse sentido o papel de sempre pronta base de
retaguarda e porto de abrigo para as operações de logística, para as
actividades de pesca, para a reparação naval (Simonstown) e para vigilância das
rotas entre o Índico e o Atlântico.
A cidade do Cabo,
na encruzilhada marítima entre o ocidente e o oriente, entre as rotas do norte
e as do sul, possui aliás um ambiente e um carácter próprio capaz de, com a sua
história e nostalgia, influenciar marinheiros, guerreiros, oficiais de
inteligência, aventureiros, mercenários e piratas refractários do império entre
os quais se colocou “Sir” Mark Thatcher…
3 – Numa altura em
que os Governos da Guiné Equatorial eram indexados a uma oligarquia perdulária
e sanguinária, que cometia constantes atropelos aos direitos humanos, conforme
propaganda ocidental com os Estados Unidos à cabeça, “Sir” Mark Thatcher tentou
a sua sorte em Março de 2004, integrando um grupo que levou os seus interesses
e condutas à realização dum golpe de estado naquele pequeno país do Golfo da
Guiné.
Aqueles que
tentaram realizar o golpe foram infiltrados pelas inteligências conjugadas de
estados como a África do Sul, o Zimbabwe, Angola e a própria Guiné Equatorial,
ficando a descoberto a sua acção e intenções pelo que se registaram prisões de
muitos intervenientes na África do Sul, no Zimbabwe e na Guiné Equatorial,
entre eles “Sir” Mark Thatcher!
O herdeiro Thatcher
encontrava assim forma de responder às vocações marítimas e sobretudo
Atlânticas do império, com os olhos postos num pequeno país que regurgita de
petróleo, como um moderno corsário à procura de tomar uma riquíssima presa, no
seguimento “em privado” da “experiência oficial” das Malvinas.
Em relação à
tentativa de tomar o petróleo da Guiné Equatorial o “plano Thatcher” funcionou
com a mesma indexação ideológica radical e prática duma qualquer corrente
radical islâmica, só que com relativamente mais curta longevidade!
Salvou-o do abismo
a sua fortuna e a influência de sua mãe, a “dama de ferro”, defensora acérrima
das elites poderosas do império anglo-saxónico e de sua globalização neo
liberal vencedora da Guerra Fria!…
4 – Perante esse
infortúnio cuja fama correu mundo com a cobertura mediática da muito britânica
BBC, “Sir” Mark Thatcher abandonou Constância, na cidade do Cabo e foi-se
instalar noutro antigo ninho de piratas, passando a saltar de ilha em ilha em
função dos seus interesses nas “offshores” financeiras das Caraíbas.
As épocas que se
sucederam na vida do herdeiro Thatcher, intercalavam as “offshores” das
Caraíbas, (Barbados, ilhas Cayman, Antilhas Holandesas) e os lugares dilectos
dos “play boys” no sul da Europa: Marbela, Nice, Mónaco…
Quando a 8 de Maio
morreu sua mãe, ele estaria nos Barbados, de onde partiu para assistir às
exéquias…
5 – A tentativa do
corsário em tomar a presa pode ter saído gorada, passando para a história como
um episódio singular em que alguns ficaram longe de alcançar os seus objectivos
pessoais, mas o sinal é evidente: com ou sem “Sir” Mark Thatcher, os interesses
das grandes corporações multinacionais do petróleo inscrevem-se nos
dispositivos que em função das potências ocidentais dominam o Atlântico e moldam
as elites “parceiras” em África na arquitectura neo colonial contemporânea...
A Guiné Equatorial
mantém a sua elite, que em 1979 se instalou no poder através dum golpe de
estado sangrento e agora se converteu à democracia representativa, enquanto sua
escassa população vive ainda em crónico subdesenvolvimento, face aos enormes
desequilíbrios locais, tal como acontece no figurino africano.
Para além do
petróleo a Guiné Equatorial passou a ter um valor geo estratégico no Golfo da
Guiné que antes não possuía a mesma relevância.
Sob a sombra do
império anglo-saxónico no Atlântico, poucas diferenças há, no que diz respeito
à geo estratégia, entre o caso das Malvinas e da Guiné Equatorial, entre a
situação colonial de uma e a neo colonial de outra, ou as corporações
anglo-saxónicas do petróleo e do gás, instrumentos da aristocracia financeira
mundial, não tivessem tão fortes argumentos “moderadores”!
Mesmo que os
pequenos corsários tenham cada vez mais dificuldades em tomar as presas, aos
grandes corsários corporativos nada nem ninguém os impede, por que são eles os
promotores mais decisivos da formatação a contento das elites africanas afins
aos interesses e influência do império e… como (favoravelmente à aristocracia
financeira global) mudou o carácter do poder da Guiné Equatorial durante os
últimos anos!...
Se para o norte
Margaret Thatcher foi a “dama de ferro”, não há dúvida que ela e sua família,
para o sul, foi mais que isso: uma inveterada “dama do petróleo”, mesmo que as
coisas não tivessem corrido tão bem quanto desejariam os Thatcher!
Nota: A Guiné Equatorial
ocupa o 136º posto no quadro dos Índices de Desenvolvimento Humano
(Desenvolvimento Humano Médio); em termos comparativos Cabo Verde ocupa a 133ª
posição, São Tomé e Príncipe a 144ª e Angola a 148ª.
Mapa: O território
continental e insular da Guiné Equatorial é crucial para o controlo geo
estratégico do Golfo da Guiné, um factor que joga com os apetites das potências
para além da “atracção” à exploração de suas ricas jazidas de gás e petróleo “offshore”
– (“Equatorial Guinea coup plot” – http://news.bbc.co.uk/2/hi/africa/3597450.stm).
A consultar:
.Ilhas do Atlântico
Sul – http://pt.wikipedia.org/wiki/Ilhas_do_Atl%C3%A2ntico_Sul
.Noble Energy –
West Africa – http://www.nobleenergyinc.com/Operations/West-Africa-140.html
.Guinea Equatorial
comprou apoio nos EUA com dinheiro público – http://paginaglobal.blogspot.com/2012/04/guine-equatorial-comprou-apoio-nos-eua.html
.Militarization of
energy policy: US Africa Command and Gulf of Guinea – http://rickrozoff.wordpress.com/2011/01/08/militarization-of-energy-policy-u-s-africa-command-and-gulf-of-guinea/
.Oposição pressiona
Governo Português para rejeitar adesão da Guiné Equatorial – http://paginaglobal.blogspot.com/2012/01/cplp-oposicao-pressiona-governo.html
.Espaço marítimo do
Golfo da Guiné clama pela definição de estratégias globais – http://www.portalangop.co.ao/motix/pt_pt/noticias/politica/2013/3/18/Espaco-maritimo-Golfo-Guine-clama-pela-definicao-estrategias-globais,2afa9961-27ff-476a-9504-0b9451187eab.html
.E. Guinea coup
plot – http://news.bbc.co.uk/2/hi/africa/4170589.stm
.Coup plotters
jailed in E. Guinea – http://news.bbc.co.uk/2/hi/africa/4044305.stm
.Zimbabwe jails UK
coup plotter – http://news.bbc.co.uk/2/hi/africa/3643250.stm
.Sir Mark Thatcher
– http://news.bbc.co.uk/2/hi/uk_news/politics/4169533.stm
.Mark Thatcher – http://en.wikipedia.org/wiki/Mark_Thatcher
.Thatcher fined
over coup plot – http://news.bbc.co.uk/2/hi/africa/4169557.stm
1 comentário:
Depois do «fim da História»
Filipe Diniz
10.Jun.13 :: Colaboradores
“O «fim da história» seria o fim da luta de classes. Mas nestes 11 anos a luta de classes não apenas se agudizou, como se trava com dureza em todas as esferas da vida das sociedades: no trabalho, na economia, na educação e no ensino, na cultura, na reconfiguração dos estados, nas agressões imperialistas contra os povos.”
O realizador Henry-Georges Clouzout perguntou certa vez a Jean-Luc Godard se não achava que os filmes deveriam ter um princípio, um meio e um fim. A resposta foi: «sim, mas não necessariamente por essa ordem». Quando se pensa no «Fim da História e o último homem», publicado por Fukuyama há onze anos, essa resposta ganha um novo significado.
Porque todos os argumentos então invocados para afirmar esse «fim» foram desmentidos. E foi o próprio capitalismo quem se encarregou de os desmentir. A «democracia liberal moderna», o «estado homogéneo e universal», última fase da história humana por «satisfazer completamente» o homem graças ao «efeito nivelador» do desenvolvimento económico e à «igualdade de oportunidades» que este proporciona, se já constituíam uma fraude intelectual quando o livro foi publicado constituem hoje uma repugnante anedota. A crise geral do capitalismo fez ruir essa utopia de «desenvolvimento». A riqueza e a pobreza acentuaram a sua polarização em cada país e entre diferentes países. A pobreza e o desemprego atingem dimensões de tragédia social; a distância entre o GNI (rendimento bruto nacional) per capita de países de desenvolvimento muito elevado e países de desenvolvimento baixo aumentou 1,35 vezes entre 1990 e 2012 (PNUD).
O «fim da história» seria o fim da luta de classes. Mas nestes 11 anos a luta de classes não apenas se agudizou, como se trava com dureza em todas as esferas da vida das sociedades: no trabalho, na economia, na educação e no ensino, na cultura, na reconfiguração dos estados, nas agressões imperialistas contra os povos. Ofensiva da grande burguesia tentando fazer tábua rasa de direitos dos trabalhadores e dos povos conquistados ao longo de mais de dois séculos. Resistência heróica de trabalhadores e povos que não cedem nas suas conquistas, e em algumas circunstâncias conseguem mesmo fazê-las avançar.
Nem no tempo da escravatura e da mais completa opressão a história se deteve. Há-de atingir, provavelmente, «um Estado homogéneo e universal»: o da sociedade sem classes. Depois do «fim da História», como nos filmes de Godard, há ainda muita História por fazer.
http://www.odiario.info/?p=2901
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