domingo, 7 de julho de 2013

ESPIONAGEM NORTE-AMERICANA: O MELODRAMA DOS EUROPEUS



THE NEW YORK TIMES, NOVA IORQUE – Presseurop – imagem Dave Brown

O ultraje ostentado pelos dirigentes da União Europeia sobre a espionagem dos Estados Unidos é exagerado, escreve-se no “New York Times”, tal como a ameaça de suspender as negociações comerciais UE-EUA. Essa vigilância é legal nos EUA, e Washington tem mantido os parceiros europeus informados sobre os seus frutos.


Há um toque de encenação na indignação que a França, a Alemanha e outros governos europeus têm manifestado desde que a edição onlineda revista alemã Der Spiegel informou, na semana passada, que aAgência de Segurança Nacional norte-americana – NSA tinha investigado representações diplomáticas e penetrado nos seus sistemas informáticos.

Espiar aliados parece mal e é raramente discutido em público, exceto quando, como agora, documentos de uma agência de espionagem chegam à Comunicação Social. Mas os governos de ambos os lados do Atlântico (e de quase todo o mundo) espiam aliados e inimigos há muito tempo.

Estamos muito longe da época em que o secretário de Estado Henry Stimson, ao explicar a sua decisão de, em 1929, encerrar o gabinete de cifras do Departamento de Estado, dizia: “Cavalheiros não leem a correspondência uns dos outros.” A NSA foi secretamente criada em 1952, com mandato para intercetar quaisquer comunicações de fontes estrangeiras, usando todo o tipo de dispositivos de escuta imagináveis.

Criação de restrições políticas

O novo elemento é a tecnologia informática, que torna o armazenamento tão barato e a análise de dados tão rápida que a agência não tem hoje restrições técnicas quanto à quantidade de dados que pode reunir e usar. Isso torna muito mais importante a criação de restrições políticas. Mas é difícil debater a política de informação quando os pormenores são mantidos em segredo para o público.

A maioria dos governos europeus há muito que estava, presumivelmente, consciente das capacidades da NSA. No entanto, os cidadãos europeus não o sabiam, até Der Spiegel publicar, esta semana, os dados de umas quantas chamadas telefónicas privadas, e-mails e mensagens de texto que a NSA controla agora na Europa por mês. A revista fala de 500 milhões só na Alemanha, num único mês. Um tão grande número levanta suspeitas de que grande parte da investigação secreta da NSA não tem qualquer ligação com a segurança nacional dos Estados Unidos ou eliminação de perigos terroristas.

Escutas a cidadãos europeus pela NSA é perfeitamente legal segundo a lei dos Estados Unidos. A agência só está proibida de bisbilhotar os norte-americanos sem autorização judicial. Os serviços de informação alemães têm as mesmas restrições para espiar os alemães. É ingénuo supor que os serviços aliados não partilham dados que possam estar fora dos limites de uns e não de outros.

NSA tem de passar a ser mais cuidadosa

Daí que a indignação dos políticos europeus pareça exagerada, tal como as suas ameaças de suspender as negociações sobre um acordo de comércio transatlântico – as estratégias de negociação parecem ter sido o objetivo da espionagem da NSA. Não seria surpreendente saber que os europeus também têm andado a tentar recolher informações sobre a estratégia de negociação dos Estados Unidos. Contudo, a negociação continua a ser do interesse de todos os participantes.

Um resultado positivo das divulgações recentes poderá ser o reforço das exigências europeias por regras mais rígidas na recolha de dados sobre pessoas físicas, por parte quer de empresas quer de governos. A NSA pode não encarar essas regras como limitativas para as suas atividades secretas; mas vai ter de passar a ser mais cuidadosa e seletiva nas suas práticas. Antagonizar os cidadãos de alguns dos nossos aliados mais próximos não é uma estratégia muito promissora em termos de reforço da segurança internacional.

VISTO DA EUROPA

Por que temos que ouvir conversas maçadoras?

“A NSA recolhe informações apenas por recolher e isso é mau”, garante um analista estratégico do Hague Centre for Strategic Studies. Num artigo de opinião publicado por De Morgen, Teun van Dongen pergunta o que é que os Estados Unidos podem fazer com todas as informações recolhidas em Bruxelas, na sua maior parte “extremamente maçadoras”:

Em relação à espionagem do Conselho Europeu, a maior parte das informações dizem respeito a políticas que não têm qualquer interesse para os Estados Unidos. Isso dá-nos até uma imagem algo curiosa: um funcionário dos serviços secretos de um dos países mais poderosos do mundo, com um capacete na cabeça, os olhos fechados, a ouvir em segredo uma conversa telefónica sobre o desemprego dos jovens ou as quotas de pesca.

“Usar a NSA contra os diplomatas europeus é um meio muito dispendioso de seguir um caminho conhecido”, escreve Teun Van Dongen, que acrescenta: “De acordo com os documentos revelados, as atividades de espionagem tencionavam dar a conhecer os desentendimentos entre os países membros sobre os “assuntos mundiais”, mas “até mesmo um leitor assíduo de jornais poderia fornecer informações à NSA” porque se trata de informações públicas.

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