domingo, 21 de julho de 2013

Portugal: CAVACO SILVA VAI TER DE CONVOCAR ELEIÇÕES ANTECIPADAS




João Lemos Esteves – Expresso, opinião

Portugal vive actualmente um período negro. Não só do ponto de vista económico-financeiro, mas sobretudo do ponto de vista político. Aquilo que sucedeu nas duas últimas semanas foi uma autêntica paródia política (para ser simpático!). O resultado das negociações propostas pelo Presidente da República terminou como se esperava: com uma enorme e rotundo desacordo, com o PS a saltar fora. Vamos ser sérios e realistas: o fracasso das negociações era o único resultado possível. Porquê? Vejamos.

Em primeiro lugar, o processo negocial começou logo com um pecado original: Passos Coelho anunciou que aceitava o repto do Presidente da República, mas que era inflexível quanto às metas fundamentais do seu programa. E quais eram essas metas? Redução dos funcionários públicos, manutenção do nível fiscal e privatizações. E quais são as discordâncias de fundo do PS em relação á governação passista/portista? Ora, estão relacionadas precisamente com esses três pontos. Portanto, se Passos Coelho é inflexível quanto a esses três pontos e António José Seguro o quer verdadeiramente esses três pontos, à partida, o acordo é impossível! Como é que pode haver um acordo de vontades entre duas partes, se essas partes são, no processo de formação do acordo, inflexíveis quanto a pontos cruciais do objecto negocial? É impossível! É, pois, quase anedótico ouvir PS e PSD falarem de "boa-fé negocial": esta é mais uma expressão da retórica deste poder caduco. Nem sequer têm noção do ridículo em que caiem quando, na mesma frase, expressam duas ideias altamente contraditórias: entrámos no processo de boa fé, mas inflexíveis. Pois... Devem achar que os portugueses são estúpidos.

Em segundo lugar, António José Seguro não se pode fazer de vítima ofendida. Porque António José Seguro, ao contrário do que pretendem os novos seguristas convertidos que pululam por aí na blogosfera e na imprensa escrita, não foi nenhum Patriota ou homem com Sentido de Estado neste processo. Bem pelo contrário: António José Seguro foi um medroso. Então, cabe na cabeça de alguém que o partido que está a negociar um acordo de salvação nacional com o Governo, vota, no Parlamento, uma moção de censura a esse mesmo Governo? Quer dizer: os parlamentares socialistas votam uma moção de censura que teoricamente serve para derrubar o Governo, enquanto que os responsáveis máximos do partido estavam à mesa das negociações com o Governo que queriam derrubar! Isto não é infantil. Isto não é amadorismo político. Em português, só há duas palavras para descrever o comportamento do PS: ridículo e risível (por acaso, a palavra que me passou pela cabeça é estúpido, mas não a vou dizer pela consideração, muito pouca, que ainda tenho por António José Seguro). Portanto, Portugal - que é o mais importante, a nossa Pátria - parou, com prejuízos sérios para a nossa economia, para que os políticos-politiqueiros andassem a brincar durante uma semana aos polícias e aos cowboys. E agora vem o ponto ainda mais censurável: brincadeira que mereceu o alto patrocínio de Sua Excelência, o Presidente da República.

O mais surpreendente nesta história é que Cavaco Silva sabia que PSD e PS tinham posições políticas irreconciliáveis, sendo, por conseguinte, quase impossível um acordo - quanto mais um acordo de governação. E achou que bastava forçar os dois partidos para conversarem, tomar uns chazinhos nas respectivas sedes partidárias, para que passassem a falar melhor. Puro engano. Por conseguinte, o grande perdedor deste processo é Cavaco Silva. Note-se: cavaco Silva, desta vez, nem sequer poderá "lavar as mãos" deste falhanço e atirar as responsabilidades para outrem - é que Cavaco Silva esteve presente nas negociações, por intermédio de David Justino, consultor de Cavaco Silva para os assuntos sociais. Portanto, Justino, um funcionário da Casa Civil do Presidente, esteve com os partidos nas negociações - e não conseguiu nenhum resultado útil. Ou seja, já nem os partidos políticos respeitam Cavaco Silva.

Dito isto, Cavaco Silva terá de tomar uma decisão clara, que será comunicada hoje às 20h30. Repito: Cavaco Silva perdeu toda a sua autoridade com esta paródia nacional de que ele é co-autor. Foi profundamente desrespeitado pelos partidos políticos. Aceitar a remodelação governamental proposta por Passos Coelho, seria um desastre para Cavaco Silva - pois torna-o o único responsável pela semana de brincadeira que Portugal viveu. Logo, existindo coerência e racionalidade nas decisões políticas de Cavaco Silva, a única saída airosa que tem para manter alguma autoridade é dissolver a Assembleia da República - e convocar eleições antecipadas já. É cero que é reescrever uma frase do seu discurso de dia 10 - mas aceitar a remodelação proposta por Passos Coelho e Paulo Portas é anular completamente o seu discurso e auto-criticar a sua intervenção na gestão da crise política.

Por último, repare-se que Cavaco Silva afirmou, nas Selvagens, que é imune a pressões. Ora, Marques Mendes, em nome do Governo, ontem já começou a pressionar o Presidente para viabilizar a solução governativa Coelho/Portas. Porventura, este será mais um dado a ter em conta por Cavaco Silva...Ou então não, já que racionalidade e coerência parecem não existir lá para os lados do Palácio de Belém com o actual inquilino...

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