Carvalho da Silva –
Jornal de Notícias, opinião
Acabe-se com o
enxovalho! Não podem prosseguir as humilhações que vêm sendo feitas ao povo, à
República Portuguesa, ao regime democrático que tanto sacrifício exigiu para
ser conquistado. Quem não se dá ao respeito não é respeitado! Quem não assume a
verdade dos factos com que lida sujeita-se a que outros o humilhem e o
submetam, exatamente pelo conteúdo das mentiras.
O governo da Sr.ª
Merkel afirmou há dois dias, sobre a situação política portuguesa, "o
caminho é difícil mas é o único que garante o sucesso". Isto é um insulto
ao povo português, só possível porque o nosso governo faz da mentira um
instrumento de governação para subjugar a sociedade portuguesa.
De que sucesso fala
esta gente?
Do empobrecimento
generalizado, da destruição de empresas e do Estado Social, do brutal
agravamento do desemprego, cujo número total de desempregados é hoje superior
em mais de 330 mil às "previsões" da troika, da recessão económica
que é umas quantas vezes maior do que aquilo que nos haviam dito que ia
acontecer, da emigração forçada de milhares e milhares de jovens qualificados?
Deitemos mão das
aprendizagens feitas no nosso longo e rico percurso histórico como povo e como
nação, das nossas capacidades, recursos e valores. Discutamos com serenidade e
seriedade os desafios e os sacrifícios a assumir, mas com a certeza de que é um
futuro digno que encetamos.
O apodrecimento do
governo PSD/CDS contamina perigosamente toda a sociedade, põe em causa os
valores da política, da democracia, da soberania do país.
É preciso
realização de eleições no mais curto espaço de tempo possível. Só a intervenção
esclarecida e consciente do povo pode sustentar uma solução. Mas estas eleições
têm de ser caracterizadas pela verdade na análise dos problemas, no rigor das
propostas, na clareza dos argumentos e, acima de tudo, nos compromissos de
governação.
Desiludam-se os que
pensam que é possível estar de bem com Deus e com o Diabo, pois as mudanças
profundas, as ruturas que hão de surgir, vão obrigar a clarificações. O
prosseguimento de compromissos políticos e sociais, característicos do velho
centrão de interesses instalados, comprometerá o futuro de Portugal.
Nós não estamos
meramente perante a "crise da dívida pública", mas sim num processo
muito complexo que abrange o conjunto da UE e, em particular, da Zona Euro. Em
Portugal esse processo tem várias dimensões, designadamente: (i) a
desarticulação profunda do setor produtivo - o seu enfraquecimento geral e a
desindustrialização - com perda direta de centenas de milhar de empregos e
fortíssimas limitações futuras para a criação de emprego; (ii) a crescente
dependência do sistema financeiro, com endividamento galopante das pessoas e
das empresas; (iii) a canalização de recursos financeiros para setores
especulativos e rentistas, que também tem facilitado a saída do país de
milhares de milhões de euros; (iv) uma brutal transferência do rendimento do
trabalho para o capital.
O Estado não pode
ser o duro cobrador de impostos para alimentar o mercado da dívida, os mercados
sanguessugas da saúde ou do ensino e negociatas de grandes interesses privados.
É preciso um sistema fiscal justo, uma aplicação do nosso dinheiro no
investimento e na garantia de direitos sociais fundamentais.
Se não queremos uma
sucessão de resgates, então temos mesmo de conseguir renegociar a sério a
dívida. Ou reduzimos a dívida e os seus encargos, ou ela nos destrói.
Temos de responder
a situações de carência e de pobreza, mas é imprescindível colocar a criação de
emprego como primeira prioridade na discussão das atividades úteis que podemos
desenvolver, da discussão da industrialização, da inovação, da competitividade,
das qualificações e formação.
Uma alternativa
efetiva tem de discutir e definir caminhos a percorrer, no plano nacional e
europeu, face a uma situação de bloqueios financeiros com que podem tentar
chantagear-nos.
A rutura com as
políticas dominantes no país e na UE é difícil, mas é uma necessidade e a única
via para retomarmos o caminho do desenvolvimento.
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