Folha 8 – edição 1155
– 17 agosto 2013
O presidente do
Zimbabwe, Robert M u g a b e, aconselhou os opositores que estão a contestar a
vitória de Robert Mugabe, nas eleições de 31 de Julho, a “enforcarem-se”. Se
calhar alguns dos seus homólogos têm outras estratégias mas, ao fim e ao cabo,
a finalidade é a mesma.
“Os que estão
chocados com a derrota, podem enforcar-se, se quiserem. Nunca desistiremos da nossa
vitória”, declarou o chefe de Estado zimbabueano, de 89 anos de idade, no poder
há mais de 33, e agora reconduzido no mandato, por cinco anos. De nada e para
nada conta o facto de tanto a oposição como os observadores locais, terem
verificado várias fraudes no escrutínio. É, aliás, caso para dizer que, como
noutros países, as fraudes são a alma de algumas “democracias” africanas.
O adversário
derrotado, o primeiro-ministro cessante, Morgan Tsvangirai, do Movimento para a
Mudança Democrática (MDC, oposição), apresentou um recurso aos tribunais para tentar
invalidar o escrutínio, por considerar que as listas eleitorais tinham sido
manipuladas de forma a favorecer a vitória de Robert Mugabe e do
partido União Nacional Africana do Zimbabué - Frente Patriótica
(ZANU-PF). A oposição, tal como os observadores, deveriam estar felizes com a
crescente modéstia do presidente já que, numa clara prova da vitalidade
democrática do pais, Mugabe só foi reeleito na primeira volta, com 61% dos
votos, contra 34% de Tsvangirai.
“Apresentamos a
democracia numa bandeja. É pegar ou largar, mas o povo esteve num acto
democrático”, acrescentou Mugabe. Aliás, já em Junho de 2008, afirmara que
o “Povo do Zimbabwe deu uma lição de democracia”. As afirmações de Robert Mugabe
(ou Frankenstein, segundo Desmond Tutu) têm levado o arcebispo sul-africano e
prémio Nobel da Paz, tal como já fizera Nelson Mandela, a fazer críticas
ferozes ao presidente do Zimbabwe. Certo é que estas críticas de altos
dignitários mundiais e vizinhos, Angola é uma excepção dado os laços de amizade
entre os presidentes, não alteraram a estratégia de Robert Mugabe que, aliás,
as comentou dizendo que “nem Mandela nem Tutu
sabem o que dizem quando falam do Zimbabwe”. E não sabem porque são falsas as
alarmantes notícias sobre a intimidação levada a cabo pelas forças do Governo
para que o povo fosse votar em quem devia. Tão falsas que, diz Robert Mugabe,
“a democracia funcionou e a esmagadora maioria do povo votou em mim”. Todo o
mundo, com a excepção oficial de Angola, sabe o que se passa mas, mais uma vez,
nada faz.
Em tempos, num
devaneio para africano ver, a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice,
defendeu a demissão pela força de Robert Mugabe. Mas tudo ficou por aí. Desmond
Tutu, para quem, “entre outros crimes”, o presidente do Zimbabué “destruiu um
país lindo que até foi um celeiro da região”, advoga até o afastamento de
Robert Mugabe pela via militar.
Também o bispo
anglicano de Pretória, Joe Seoka, considerava já em 2008 que o Presidente do
Zimbabué, “deve ser visto como um Hitler do século XXI, uma pessoa sem
consciência, nem remorsos e um assassino”. É claro que, do ponto de vista do
regime angolano, não é correcto chamar Hitler a Robert Mugabe. Essa designação,
segundo a tese oficial, tem mais cabimento quando dirigida a esse inimigo
público mundial que dava pelo nome de Jonas Savimbi. Qual Robert Mugabe, qual
Idi Amin, qual Jean-Bédel Bokassa, qual quê!?
O bispo Seoka
acusou Robert Mugabe de ter provocado, durante a sua eterna governação no
Zimbabwe, “estragos e mortes sem conta” e exortou África e a comunidade
internacional a afastarem Mugabe do poder pela força a bem do país e do povo. “Estragos
e mortes sem conta”? Se este for o barómetro, Joe Seoka tem de acrescentar
muitos, mas muitos, outros nomes à listagem dos potenciais Hitleres. O
responsável religioso sul-africano não poupou críticas aos dirigentes políticos
da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC),
acusando-os de protegerem há longos anos o “camarada de ditadura” do Zimbabwe. Será
caso para dizer que tanto são Hitleres os que protegem Hitler, como o Hitler
propriamente dito?
“A liderança da
SADC e as suas estruturas têm protegido o seu camarada de ditadura enquanto os
líderes internacionais apelam, em número crescente, ao seu afastamento. Membros
da SADC como o Botswana têm, no entanto, levantado a voz em protesto contra as
violações dos direitos humanos no Zimbabwe, expressando preocupações que
continuam a ser ignoradas pelos outros”, afirmou o bispo anglicano da capital
sul-africana. Para o prelado, que em Luanda ninguém sabe quem é (como não sabe
quem é Desmond Tutu ou Nelson Mandela) “chegou a hora de todos os líderes
religiosos seguirem o exemplo de Desmond Tutu e do arcebispo de York, John Sentamu,
no seu apelo a Deus para que Mugabe seja afastado da Presidência do Zimbabwe”.
“Ele tem de ser
afastado à força para que acabe o sofrimento dos filhos de Deus no seu país”,
referiu Seoka, salientando que “pedir o afastamento não adianta”. E não
adiantou. Aliás, recorde-se que em Novembro de 2008, o Governo do Zimbabwe,
aquele próspero e democrático país do sul de África que é na actualidade o
maior exportador mundial de... refugiados, vetou a entrada no país do
ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan. Aliás, Robert Mugabe impediu a visita
de Kofi Annan, do antigo Presidente norte-americano, Jimmy Carter, e da
activista dos Direitos Humanos, Graça Machel, que pretendiam avaliar a situação
humanitária no país em nome do “Grupo dos Anciãos”, ao qual pertencem.
Sejamos francos. O
que eles queriam era (e é por essa e por outras que a amizade entre Eduardo dos
Santos e Robert Mugabe é indestrutível) atazanar a paciência do presidente. E
ele, como bom democrata que é, não está com paciência para aturar gente
preocupada com uma coisa que não existe no Zimbabwe: direitos humanos. E se não
existe... Harare acusou o “Grupo dos Anciãos” (criado em 2007 por Graça Machel
e pelo seu marido, Nelson Mandela) de apoiar
o Movimento para a Mudança Democrática (MDC), o principal partido da oposição. Seja
como for, Robert Mugabe parece ter razão quando afirma que só Deus o poderá demitir.
Não é o único a pensar assim.
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